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BOAS NOVAS DO REINO DE DEUS

Artigos e estudos Bíblicos

BOAS NOVAS DO REINO DE DEUS

Artigos e estudos Bíblicos

O DIABO - O GRANDE ENGANADOR (PARTE 1)

S. Mestre, 15.08.10

 

PREFÁCIO

 

Este estudo surgiu como uma série de artigos publicados pela Secção de Estudo Bíblico da Liga Cristadelfiana de Isolação, sob o título “algumas passagens difíceis”. Mais tarde, o assunto foi tratado mais detalhadamente em uma série de artigos sobre "O Diabo", publicado em “O Cristadelfiano (The Christadelphian)”, durante 1969 e 1970. Agora, em grande medida devido ao conselho útil de um crítico anónimo, os artigos foram alargados e uma tentativa foi feita, por um re-arranjo do material, apresentar uma sequência mais lógica.


Devo reconhecer minha dívida para com duas pessoas, além do crítico anónimo acima mencionado: o falecido Irmão James White, pelos seus dois artigos sobre "O Diabo e seus anjos”, publicado no Cristadelfiano (Julho e Agosto de 1950), e
o falecido irmão W. Watkins pela discussão frutífera. Estes dois irmãos realmente me ajudaram muito, e agradeço a Deus pela sua contribuição para a minha compreensão da Bíblia neste assunto fascinante.

 

Outubro, 1971

 

PETER WATKINS

 

 

 

 

 

PRÓLOGO

 

As escrituras estão repletas de contrastes e paradoxos: o uso de opostos é uma das maneiras que Deus usa para revelar e explicar o Seu propósito para com a humanidade. É nos mostrado a qualidade do bem em contraste com o atributo do mal; aprendemos sobre a justiça, em comparação com o pecado. Somos ensinados a procurar a perfeição e santidade e evitar o mal. Desejamos a redenção porque reconhecemos a nossa fraqueza, e estamos ansiosos pela paz e justiça do Reino, pois será muito diferente da luta e da injustiça do domínio do homem.


Ao longo dos séculos, o homem ponderou sobre a natureza e origem do mal e raciocinando, talvez através de uma espécie de simetria natural, ele tem muitas vezes concluído que se existe um Deus do bem, pode haver também um deus do mal. Esse é o pensamento do homem ignorante: na verdade, isto é onde, pela primeira vez, existe uma quebra de simetria. Deus não tem quem se lhe assemelhe: “Eu sou o Senhor, e não há outro ... Eu formo a luz, e crio as trevas: eu faço a paz e crio o mal: eu, o Senhor, faço todas estas coisas” (Isaías 45:5 - 7).


Então porque é que a Bíblia está cheia de referências a Satanás e a um diabo? É esta pergunta que o falecido Peter Watkins abordou. Mas ele não aborda apenas os aspectos negativos do mal, do pecado e da questão de saber se existe “um grande enganador": ele passa a lidar com os contrastes positivos - obediência, redenção e a perfeição que se vêm no Senhor Jesus Cristo. Nas páginas que se seguem, temos não apenas uma refutação do erro, mas uma abundância de exortação edificadora. Somos encorajados assim: “Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena”, e somos encorajados a pensar “nas coisas lá do alto” (Colossenses 3:1-5).


John Morris

 

 

1

 

EXAMINANDO O ESTUDO


O derradeiro diabo é o próprio homem – não o homem que foi criado à imagem de Deus, mas o homem que, pela desobediência, manchou a imagem e foi condenado à morte.


Esta proposição surpreendente precisa ser explicada e qualificada, e este é o objetivo do presente estudo. Vamos tentar desvendar algumas das complexidades deste assunto bastante amplo, e o nosso método de procedimento será o de acompanhar as linhas guia que fornecem as próprias Escrituras.
Essencialmente, isto é um estudo bíblico. A Bíblia deve ser o seu próprio intérprete.


O diabo, satanás, demónios, espíritos imundos, a serpente, o dragão: todos esses temas bíblicos estão tecidos num grande tema. Temos de tentar obter um entendimento das partes, e, portanto, estar em uma posição para ver o quadro como um todo.


E é importante que vejamos o quadro como um todo. Delicadamente gostaria de sugerir que foi por não conseguiram fazer isto que muitos estudantes diligentes da Bíblia têm sido afugentados deste assunto.


Deixe-me explicar.
Estes estudantes das Escrituras começaram bem. É reconfortante observar como muitos leitores da Bíblia têm sido levados pela sua própria leitura à conclusão de que o diabo da Bíblia é, de alguma forma, um símbolo da natureza humana. É reconfortante que o estudo independente da Bíblia traz pessoas diferentes a uma mesma resposta; embora
a resposta em si mesma seja profundamente perturbadora. Na verdade, é impossível de ser confrontado com um facto mais humilhante do que o diabo estar dentro de nós e não fora de nós. Mas, voltando ao ponto, tendo chegado a ver que o diabo é de alguma forma – sim, geralmente muito vagamente – um símbolo da natureza humana, a maioria dos estudantes não toca mais no assunto. Para eles, a importância da descoberta pode ser negativamente afirmada: os seus olhos abriram-se para facto de que o diabo
não é um monstro sobrenatural, afinal tudo. Alguns ainda seriam mais negativos, se possível, e dizer com alegria indecente: Então não há diabo, afinal!


Não! Não é tão fácil como isso. Esta atitude negativa é insatisfatória por duas razões. Em primeiro lugar, deve-se reconhecer que a equiparação do diabo com a natureza humana, ou com o que é indesejável na natureza humana, não é para destruir este poder do mal. O facto alarmante é que está agora mais perto de nós do que jamais poderiamos ter imaginado.


E em segundo lugar, o que devemos fazer com que a conjunto desconcertante de Escrituras sobre o diabo, satanás e espíritos malignos? Eles estão lá apenas para nos embraraçar? Considerando que muitos leitores da Bíblia sabem que conclusões não devem ser extraídas destas Escrituras, eles ficam perdidos porque não sabem que propósito positivo têm estas passagens.


Francamente, isto não é suficientemente bom.
As Escrituras não foram dadas para confundir e inibir aqueles que estão em busca de sabedoria. “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra.” (2 Tm. 3: 16 , 17).


Quando partes da mensagem de Deus nos assustam ou constrangem, a coisa apropriada a fazer é enfrentar o desafio que elas apresentam. Por outras palavras, é necessário estudar mais. Quanto ao assunto em apreço, gostaria de sugerir que,
ao invés de defensivamente explicar, ou justificar, cada passagem acerca do “diabo” com que somos confrontados, devemos tomar a tarefa de procurar temas que correm por todas estas Escrituras, e assim obter uma imagem coerente e abrangente de todo o assunto. Esta é, na verdade, o que tentamos fazer aqui. A tarefa não está de forma alguma concluída: há ainda profundidades a serem exploradas, e as pontas soltas por atar. Mas se este estudo nos ajudar a ver que as Escrituras nos apresentam um tema grande, fascinante, ao invés de uma matriz exasperante de passagens desconcertantes, já será um bom começo.


Este tipo de pesquisa é maravilhosamente gratificante. É impressionante o quanto o grande tesouro do conhecimento bíblico irá render se nos dirigimos, com seriedade e espírito de oração, com a finalidade de procurar os seus mistérios. Afinal, as Escrituras foram fornecidos para a nossa instrução.


O Objectivo final


Embora o processo de conhecimento deste tema complexo é fascinante, este não é um fim em si mesmo. Há algumas lições que devem ser aprendidas vez após vez. Nós todos precisamos lembrar, repetidamente, que a busca do conhecimento sem sabedoria é vã. O estudo profundo da Bíblia deve nos fazer sentir humildes. Estamos caminhando em terra santa, e a maravilha da Palavra de Deus deve encher-nos com um sentimento de admiração. E quando um dos grandes temas dessa Palavra nos revela a dura realidade da nossa própria miséria, sentimo-nos obrigados a nos prostrar diante do trono da graça. Somos levados a ver quão desesperadamente precisamos do Senhor Jesus, o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.


Palavras


Por necessidade, teremos de voltar a nossa atenção, ocasionalmente, para os significados das palavras. Isso é necessário porque palavras como “diabo” e “Satanás” são muitas vezes incompreendidas e mal utilizadas, mesmo por pessoas que deveriam saber melhor. Para alguns leitores, o estudo das palavras é um tédio, e até mesmo uma coisa irritante. Eles têm a minha simpatia. Estudos de palavras podem ser exagerados, mas há ocasiões em que eles são inevitáveis. Tais comentários sobre os significados da palavra como terei de fazer devem ser vistos limpar o quadro em uma sala de aula, antes de começarmos com o que realmente importa.

 

 

 

 

2

 

DIABOS E DIABOS

 

Existe um diabo. Que isto seja afirmado categoricamente à partida. O Novo Testamento contém tantas referências ao diabo e às obras do diabo que não podemos razoavelmente contestar esta afirmação.


Sabemos, é claro, que não há nenhum diabo
pessoal sobrenatural, e às vezes é necessário corrigir aqueles que ingenuamente alegam que as Escrituras ensinam que esse monstro existe. Mas estaremos em desacordo com a Bíblia se dissermos que não há existe nenhum diabo. Será que imaginamos que nenhum efeito positivo foi destinado pela inclusão no Novo Testamento de tantas passagens sobre o diabo? Certamente elas são projetadas para nos ensinar algo; e devemos estar falhando verdades importantes se o nosso único interesse nestas passagens é explicá-las.


Será necessário, no decorrer de nossa discussão deste tema, demonstrar a falsidade da crença tradicional de que o diabo é um ser super-humano: mas não vamos parar por aí. O nosso objetivo principal é reunir o material disponível nas Escrituras e avançar para algumas conclusões positivas.

 


Uma Palavra do Novo Testamento


É uma surpresa para algumas pessoas ao saber que a primeira ocorrência da palavra diabo na Bíblia é em Mateus
4:1: “A seguir, foi Jesus levado pelo Espírito ao deserto, para ser tentado pelo diabo.”


Diabo é uma palavra do Novo Testamento, e o assunto é, na maioria das vezes, um assunto do Novo Testamento. Como todos os temas do Novo Testamento, no entanto, tem as suas raízes no Antigo Testamento, e a nossa investigação deve tomar o ensinamento do Antigo e Novo Testamentos em consideração.

 

A palavra Grega traduzida diabo é diabolos. Esta palavra é usada quase sempre no singular mas existem três exceções: 1 Timóteo 3:11; 2 Timóteo 3:3; Tito 2:3. Quase sempre aparece como o diabo, a única excepção aparece em João 6:70 onde Judas é chamado de diabo. O diabo é o grande inimigo de Deus, e tentador do homem.

 


O acusador


A palavra
diabolos é composta de duas palavras Gregas: dia (através) e Ballo (arremessa). O diabo é quem arremessa, ou ataca, através. O ataque geralmente é verbal: ho diabolos, o diabo, é um acusador ou caluniador.


Foi feita referência a três passagens onde, inesperadamente, a palavra
diabolos é usada no plural. É interessante notar que a palavra é traduzida maldizentes na primeira destas passagens, e caluniadores e caluniadoras nas outras duas.


Da mesma sorte, quanto a mulheres, é necessário que sejam elas respeitáveis, não maldizentes, temperantes e fiéis em tudo.” (1 Tm. 3:11).


Sabe, porém, isto: nos últimos dias, sobrevirão tempos difíceis, pois os homens serão egoístas, avarentos, jactanciosos, arrogantes, blasfemadores, desobedientes aos pais, ingratos, irreverentes,

desafeiçoados, implacáveis, caluniadores, sem domínio de si, cruéis, inimigos do bem” (2 Tm. 3: 1-3).


Quanto às mulheres idosas, semelhantemente, que sejam sérias em seu proceder, não caluniadoras, não escravizadas a muito vinho; sejam mestras do bem,” (Tito 2: 3).


Uma inspecção das passagens em que a palavra original é
diabolos, revelou que, no uso normal do Novo Testamento, a palavra é aplicada ao grande inimigo de Deus e grande tentador do homem.


Agora temos de ter em conta o facto de que o nome dado a esse poder é
O Acusador. Deve haver uma boa razão para este nome. Ao passarmos a colher informações relativas a este poder hostil, temos de manter este nome em mente e ver se conseguimos descobrir porque o inimigo deve ser chamado ho diabolos – O Acusador.

 

 

 

3

 

CONFLITO COM CRISTO

 

A Tentação no Deserto

 

Quem ou o quê é o diabo que tentou o Senhor Jesus Cristo no deserto? Voltemos a uma questão que já foi discutidas muitas vezes no passado.

 

A ideia popular é que o diabo que tentou Cristo era uma pessoa – uma poderosa, corporização do mal. Uma leitura rápida dos registos de Mateus, Marcos e Lucas parece prover suporte para esta ideia. Existe um diálogo entre o diabo e o Senhor Jesus. O diabo sugere que seria vantajoso para Jesus fazer certas coisas que são contrárias à vontade de Deus. Jesus repudia essas sugestões, e o diabo vai embora.

 

Uma leitura cuidadosa, no entanto, revela um número de dificuldades. Primeiro, existem dificuldades em relação às circunstâncias da tentação. É dito expressamente em Mateus, Marcos e Lucas, que a tentação teve lugar no deserto. Assim afirma Marcos: “o Espírito o impeliu para o deserto, onde permaneceu quarenta dias, sendo tentado por Satanás; estava com as feras, mas os anjos o serviam” (1:12-13). No entanto em uma das tentações o Senhor Jesus é levado até ao pináculo do templo, em Jerusalém. Jerusalém não estava situada no deserto. Mais uma vez, é nos dito que o diabo levou Jesus até um alto monte, e mostrou-lhe todos os reinos do mundo num instante de tempo. Existe, ou existiu no deserto ou fora dele, uma montanha de onde todos os reino pudessem ser vistos de um vez? Quase que se pode ouvir a reprimenda de que estas coisas estão escritas, e temos que acreditar nelas. Verdade; mas talvez possam ser entendidas de uma outra forma.

 

Jesus seguiu?

 

Mas as dificuldade ainda não terminaram. Existem objeções mais sérias contra o ponto de vista de que todos os detalhes devem ser entendidos literalmente, e que o diabo é uma pessoa. Considere a tentação em relação ao pináculo do templo. A partir dos Evangelhos aprendemos que o Senhor detestava tudo o que se opunha à vontade do Seu Pai. Com vista nisto, será que podemos imaginá-lo seguindo com resignação a trás deste perigoso inimigo até Jerusalém, e até ao templo? Podemos visualizá-los ambos subindo ao pináculo? Será que visualizamos Jesus lá à beira de cair? Será que o Senhor permitiria um tentador maligno trazê-lo até esse ponto sem que antes tenha disto, Não? Fazer tais concessões a um tentador certamente não seria consistente com o que lemos sobre o caráter de Jesus.

 

Ainda, pense na tentação de se curvar diante do diabo, e receber todos os reinos do mundo. Imagine que alguém importante e poderosa fazia esta a oferta a nós. Como reagiríamos? Não importa quão grande seria o tentador, saberíamos que ele não estava numa posição de cumprir tal promessa. A tentação não seria real. Seria para nós mais uma anedota do que uma promessa real. Certamente Jesus, que tinha tanto respeito pela Palavra de Deus, e que saberia muito bem que “do Senhor é a terra e a sua plenitude”, não seria nem no grau mais pequeno tentado por qualquer impostor (pois seria um impostor) que lhe fizesse uma oferta extravagante e impossível como essa.

 

A Destruição do Diabo no Calvário

 

Qualquer interpretação das Escrituras que não faz sentido deve ser rejeitada. Temos que ver se a tentação no deserto pode ser entendida de uma maneira que faça sentido. Mas antes de fazer isso, primeiro queremos examinar outra passagem que nos pode ajudar. A passo que Jesus resistiu ao diabo no deserto (não importa como isso seja entendido), ele destruiu o diabo quando foi crucificado. Hebreus 2:14 declara: “Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo”

 

Esta passagem diz-nos que porque “os filhos” (ou seja, os que são salvos em Cristo, como se vê nos versículos anteriores) são criaturas de carne e sangue, Cristo também teve uma natureza semelhante à deles. Porque veio ele com a nossa natureza? Para poder morrer. E porque era necessário que ele morresse? Para que, pela morte, destruísse o diabo.

 

Suponha que a ideia popular é verdadeira, e que o diabo é um ser maligno poderoso. É razoável supor que Jesus Cristo teria que vir com a nossa débil natureza humana e morrer na cruz para destruir esse monstro? Como poderia a morte de Cristo ter o efeito da destruição desta suprema corporização do mal – se o diabo deve ser visto como tal? E se a morte de Cristo era para o propósito de destruir um monstro, não estaria morto o monstro agora?

 

Aqui pode-se ver que é necessário outra explicação. É necessária uma definição do diabo que faça sentido a par dos relatos da tentação que se encontram nos Evangelhos, e da passagem citada de Hebreus. Pode esse definição ser encontrada?

 

Desejos que Vão Contra a Vontade de Deus

 

Alega-se que a seguinte definição remove os problemas: o diabo é um símbolo dos desejos humanos que vão contra a vontade de Deus. Não existe falta de apoio bíblico para esta definição, falaremos disto mais tarde. O nosso propósito imediato, no entanto, deve ser ver como esta definição encaixa no relato da tentação no deserto, e no ensinamento de Hebreus 2:14.

 

Em todas as coisas...”

 

O diabo que tentou o Senhor Jesus era os seus próprios desejos humanos. Essa é a proposição que devemos examinar agora. Praticamente não é preciso mencionar que existe um grande conjunto de evidências, particularmente em Hebreus, de que o Senhor Jesus possuía uma natureza como a nossa. Novamente nos referimos a Hebreus 2:14 – à primeira parte do versículo: “Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou...” As palavras, “também”, e “ele” e “igualmente” foram escolhidas para sublinhar o facto de que o Senhor Jesus realmente possuía uma natureza como a nossa. No versículo 17 do mesmo capítulo repete este mesmo ponto: “Por isso mesmo, convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos irmãos”; e Hebreus 4:15 diz que “foi ele tentado em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado”. Não desonramos Cristo quando dizemos que ele foi tentado como nós somos. Damos-lhe ainda mais honra, porque reconhecemos que, embora ele tivesse sido tentado como nós o somos, ele nunca pecou. Nisto ele foi único.

 

Outra Olhada à Tentação

 

Agora tentemos resolver os detalhes da tentação no deserto. Imediatamente depois do seu batismo, o Senhor Jesus recebeu o Espírito Santo e ouviu uma voz do céu dizendo, “Este é o meu filho amado, em quem me comprazo”. Estes novos poderes, e este novo estatuto anunciado, abriu possibilidades tanto excitantes como perigosas. Embora a sua vida tenha sido, até este ponto, uma preparação, esta nova situação requeria um curso curto e intensivo de preparação. Este tomou a forma de tentações onde as possibilidades desta nova situação foram exploradas ao máximo. Duas vezes as tentações foram apresentadas pelas seguintes palavras, “Se és o Filho de Deus”; e duas vezes, pelo menos, a sugestão foi feita que estes poderes acabados de receber poderiam ser usados para motivos egoístas.

 

O Senhor Jesus Cristo tinha estado quarenta dias sem comida. Naturalmente, ele sentia muita fome e os seu pensamentos eram como iria encontrar comida. Quarenta dias antes ele tinha ouvido Deus chamando-lhe de Seu Filho; e tinha recebido novos poderes maravilhosos. Se ele era realmente o Filho de Deus, e se, como tal, ele possuía estes poderes, isto seria uma ocasião para agir. Tentativamente e reverentemente, tentamos pensar que com que tipos de pensamentos o nosso Senhor teve que lutar: “Tu és o Filho de Deus; tu vieste para fazer a vontade do teu Pai, tens que viver. Se é para viveres, tens que comer. E se tens que comer tens que produzir comida, porque não existe nenhuma neste deserto. Tu tens que usar os teus poderes milagrosos e transformar estas pedras em pão, e garantir assim que continuarás vivo para fazer a vontade de Deus”. Teria sido fatalmente fácil para alguém com a nossa carne e sangue raciocinar dessa maneira. E teria sido fatalmente fácil sucumbir a tais pensamentos. Mas se o Senhor Jesus tivesse sucumbido a isso, teria sido pecado, e a tragédia do Éden teria acontecido novamente com consequência irrevogáveis.

 

O Espírito Prevalece sobre a Carne

 

É difícil de imaginar o Senhor seguindo um tentador até ao pináculo do templo; mas é fácil imaginar os seus pensamentos tendo sido levados até esse lugar. “Se és o Filho de Deus”, ele poderá ter pensado para si mesmo, “porque não dar aos homens uma prova desse facto? Isso garantiria o sucesso da tua obra para Deus, e Deus seria glorificado. Atira-te daí abaixo!”

 

Foi difícil imaginar Jesus literalmente subindo a um monte do qual todos os reinos do mundo poderiam ser visto num momento de tempo. Mas é fácil imaginar, ele ascendendo, em sua imaginação, a um ponto de vantagem do qual poderia ver o grande reino que o seu Pai lhe prometera. Sim, foi-lhe prometido, e agora estava ao seu alcance, pois ele tinha grande poder. Se ele tomasse a posse do mundo agora, o propósito final de Deus se cumpriria, e a dor e vergonha da crucificação seriam evitadas. A ideia era atrativa. Tudo o que tinha que fazer era curvar-se perante si mesmo – e o reino seria seu!

 

A tenção deste tipo era real. Era uma batalha entre a carne e o espirito, e o espírito prevaleceu. O valor desta vivência era imenso, porque isto apresentou a Jesus a tentações que se poderiam apresentar de um modo mais sutil durante o seu ministério.

 

A Tentação se Repete

 

Em Lucas 4 – o capítulo que descreve a tentação – está registado que a multidão enfurecida em Nazaré tentou jogar Jesus de um precipício. Quão fácil teria sido submeter-se a isso, e deixar que eles o jogassem de lá para baixo. Então eles ficariam pasmados ao vê-lo ser gentilmente carregado pelos anjos. A tentação era sutil, porque isto não era algo que ele tivesse planeado antes. As circunstâncias levaram-no a esta situação, e certamente Deus estava dirigindo as circunstâncias dele. Mas o seu pensamento já tinha sido exercitado sobre este tipo de situação no deserto. Ele sabia que qualquer demonstração desse tipo não fazia parte do plano de Deus para ele, e “Jesus, porém, passando por entre eles, retirou-se.”

 

Tome outro exemplo, o Senhor provavelmente vivenciou uma tentação similar à tentação das “pedras transformadas em pão” quando pregava em Samaria, Em João 4 é nos dito claramente que Jesus estava cansado (“Cansado da viagem, assentara-se Jesus junto à fonte”). Existem indicações também que ele estava com sede e fome: os discípulos tinham ido à aldeia comprar comida; e Jesus pediu água à mulher Samaritana. O impulso de satisfazer estes desejos naturais de descansar, comer e beber deveria ser forte. Em circunstâncias normais teria sido permissível; mas havia trabalho a fazer , ele recusou se distrair com estas necessidades da carne. Água, comida e descanso tornaram-se irrelevantes. Era a vontade do Pai que Jesus continuasse trabalhando, e isso era tudo o que importava.

 

Novamente Hebreus 2:14

 

Os desejos humanos que foram frustrados no deserto foram destruídos no Cálvario. Enquanto houvesse a natureza Adâmica, haveria a possibilidade de tentação. Não foi o suficiente frustrar os desejos humanos que se opunham à vontade de Deus. Tinham que ser destruídos. E como poderia isto ser feito senão pela destruição da fonte desses desejos – a natureza herdada de Adão? Assim o Senhor Jesus destruiu o pecado no lugar onde ele residia. Ele destruiu o pecado na carne.

 

Esta é a mensagem de Hebreus 2:14. Jesus veio com a nossa natureza para que pudesse morrer; para que, pela sua morte, o diabo, ou os desejos humanos contrários à vontade de Deus, pudessem ser destruídos na sua fonte. Jesus aniquilou “pelo sacrifício de si mesmo, o pecado” (Hebreus 9:26).

 

 

4

 

CAPRICHOS E FALÁCIAS

 

JÁ vimos que a ideia de que o diabo é um monstro super-humano não se enquadra com o registo da tentação do Senhor, ou com o ensino de Hebreus 2:14. A teoria tem outras fraquezas também, e talvez devamos examiná-las agora e limpar o caminho para uma investigação mais positiva.

 

Silêncio Eloquente

 

Já foi apontado que o tema do diabo é um tema do Novo Testamento. Isto é, em si mesmo, significativo. Aqueles que acreditam num diabo pessoal também creem que este diabo estava vivo e ativo no tempo do Antigo Testamento. Porque é então só mencionado no Novo Testamento? É afirmado que o diabo foi responsável pela tentação e queda do homem, e no entanto não existe qualquer indicação do papel fatídico atribuído a esse monstro no registo de Génesis. É suposto que o diabo iniciou a grande tragédia humana mas que tem estado profundamente envolvido desde então, exercendo grande força para assegurar-se que o mal e o sofrimento nunca deixem a raça humana. No entanto, o longo registo do Antigo Testamento sobre o pecado humano e graça divina nem sequer dá uma referência incidental desde espírito maligno.

 

Escrituras Deturpadas

 

Alguns objetariam, e insistiriam que o diabo é mencionado no Antigo Testamento – não por esse nome mas por outros, como Satanás, Lúcifer e “querubim ungido”.

 

Em relação a Satanás, é suficiente mencionar que o uso desta palavra no Antigo Testamento é um estudo interessante que iremos estudar com detalhe nos próximos 2 capítulos. As outras duas alusões são Isaías 14 e Ezequiel 28.

 

“Como caíste do céu, ó estrela da manhã(em traduções antigas, Lúcifer), filho da alva! Como foste lançado por terra, tu que debilitavas as nações! Tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu; acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono e no monte da congregação me assentarei, nas extremidades do Norte; subirei acima das mais altas nuvens e serei semelhante ao Altíssimo. Contudo, serás precipitado para o reino dos mortos, no mais profundo do abismo” (Isaías 14:12-15).

 

“Estavas no Éden, jardim de Deus; de todas as pedras preciosas te cobrias: o sárdio, o topázio, o diamante, o berilo, o ônix, o jaspe, a safira, o carbúnculo e a esmeralda; de ouro se te fizeram os engastes e os ornamentos; no dia em que foste criado, foram eles preparados. Tu eras querubim da guarda ungido, e te estabeleci; permanecias no monte santo de Deus, no brilho das pedras andavas. Perfeito eras nos teus caminhos, desde o dia em que foste criado até que se achou iniquidade em ti” (Ezequiel 28:13-15).

 

Ler estas passagens no seu contexto é ver que elas não têm nada que ver com um diabo pessoal. Os profetas, Isaías e Ezequiel, são os mais preparados para nos dizerem do que se tratam as suas profecias. As palavras de Isaías estão na seção de profecias contra as nações, e fazem parte da profecia contra a Babilónia. No versículo 4 do mesmo capítulo diz, “Proferirás este motejo contra o rei da Babilónia e dirás...” Similarmente, as palavras de Ezequiel estão numa seção do seu livro sobre julgamentos sobre as nações Gentias. Se vermos logo no versículo anterior em Ezequiel lemos “Filho do homem, levanta uma lamentação contra o rei de Tiro...” Esta afirmação explícita decide a questão: é sobre o rei de Tiro. As palavras concernentes ao Éden são obviamente figurativas como a passagem do capítulo 31 onde a Assíria é descrita como uma árvore no Éden da qual todas as outras árvores têm inveja.

 

Um Anjo Caído

 

O ponto de vista popular é que o diabo é um anjo caído. A queda supostamente aconteceu antes da criação de Adão. Esta teoria não é nem Bíblica nem lógica.

 

Uma passagem que é usada como prova é Apocalipse 12:7-10:

 

ouve peleja no céu. Miguel e os seus anjos pelejaram contra o dragão. Também pelejaram o dragão e seus anjos; todavia, não prevaleceram; nem mais se achou no céu o lugar deles. E foi expulso o grande dragão, a antiga serpente, que se chama diabo e Satanás, o sedutor de todo o mundo, sim, foi atirado para a terra, e, com ele, os seus anjos. Então, ouvi grande voz do céu, proclamando: Agora, veio a salvação, o poder, o reino do nosso Deus e a autoridade do seu Cristo, pois foi expulso o acusador de nossos irmãos, o mesmo que os acusa de dia e de noite, diante do nosso Deus.”

 

Um breve comentário é suficiente. O Livro de Apocalipse é um livro de símbolos, primariamente sobre o futuro. A mesma narrativa, no mesmo capítulo, fala de uma mulher, vestida do sol, com a lua debaixo dos seus pés. Pode alguém insistir em que isto é literal?

 

Incidentalmente, é digno de nota que o diabo em Apocalipse 12 é também chamado de “antiga serpente”, por isso existe alguma ligação entre o diabo e a serpente. Notamos também que o nome Satanás é usado para descrever o mesmo poder. Teremos que fazer uso desta informação mais tarde.

 

Que tipo de natureza é suposto possuir este anjo caído? É nos dito que ele tem a mesma natureza que associamos aos anjos – natureza espiritual. Isto imediatamente levanta um problema. Segundo o Senhor Jesus, anjos não morrem. Falando dos “filhos da ressurreição” ele diz, “... Pois não podem mais morrer, porque são iguais aos anjos” (Lucas 20:36). Se por conseguinte o diabo possui a natureza de um anjo, ele deve ser imortal. E no entanto as Escrituras como Hebreus 12:14 falam da destruição do diabo.

 

Os problemas não terminam aqui. Embora os anjos não morram, eles não são imortais por si mesmos, por assim dizer. Ele derivam a sua imortalidade de Deus. Paulo expressa esta verdade essencial quando diz que Deus é “o único que possui imortalidade” (1 Timóteo 6:16). É então concebível que Deus, a única fonte de imortalidade, permita que um arqui-inimigo eternamente derive vida d'Ele e torne-se (no mesmo sentido que os anjos) imortal? Robert Roberts disse e bem que “um rebelde imortal é uma impossibilidade... o diabo mencionado na Bíblia é um pecador 81 João 3:8): logo o diabo não pode ser imortal” (Cristandade Desviada, Capítulo 7).

 

As Testemunhas de Jeová, que são fortes na sua crença de que o diabo é um anjo caído, protestam que eles não acreditam que o diabo viverá para sempre. No entanto o Senhor Jesus disse que os anjos não morrem.

 

Diabos ad infinitum

 

O papel atribuído ao diabo na queda do homem é interessante. É argumentado que os nossos primeiros pais eram demasiado inocentes, e muito bons em todos os sentidos, para serem tentados por uma mera serpente. O diabo, dizem, era o génio do mal responsável pela transgressão do homem. Segundo alguns, o diabo apareceu a Eva disfarçado de serpente; segundo outros, o diabo usou a serpente como um instrumento para tentar Eva. Estas são apenas variações de um mesmo tema; em ambos os casos o diabo é representado como o verdadeiro tentador.

 

Levemos então este tema à sua conclusão lógica. A natureza de Adão e Eva era tão boa, é nos dito, que somente um poderoso tentador poderia fazer com que caíssem. Se então não era fácil fazer este par humano sem mancha ser levado a pecar, quanto mais difícil teria sido tentar um anjo! (Lembre-se de que o diabo é supostamente um anjo caído!) Se nada menos do que a intervenção de Satanás, o anjo caído, pode explicar a queda destes seres humanos, quanto mais poderoso deve ter sido o tentador que persuadiu este anjo de Deus a rebelar-se, causando a sua queda! Deve haver então diabo muito maior ainda por de trás do diabo anjo caído. No entanto este arqui-diabo que, segundo esta lógica bizarra, deve ter começado tudo isso, não é nunca mencionado. Mas espere! Foi realmente este arqui-diabo que começou tudo!? Certamente ele deve ter sido desencaminhado por um tentador maior ainda...

 

Negação Categórica

 

Existe uma passagem no Antigo Testamento que merece uma menção especial, porque é uma forte negação da heresia do diabo pessoal: Isaías 45:5-7. Significativamente, as palavras são dirigidas a Círo, o rei dos Persas, como nos diz o primeiro versículo do capítulo. Isto é significativo porque os Persas, acima de todos os outros, acreditavam num diabo pessoal. Eles acreditavam que existiam dois grandes deuses lutando pelo poder – um deus do bem e da luz, e um deus do mal e das trevas. Nesta passagem Deus indignado repudia a ideia de que tenha um rival:

 

Eu sou o SENHOR, e não há outro; além de mim não há Deus; eu te cingirei, ainda que não me conheces. Para que se saiba, até ao nascente do sol e até ao poente, que além de mim não há outro; eu sou o SENHOR, e não há outro. Eu formo a luz e crio as trevas; faço a paz e crio o mal; eu, o SENHOR, faço todas estas coisas.”

 

Alguns ficam indispostos pela afirmação de Deus de criar o mal. Eles não percebem que o mal não é o mesmo que pecado. O mal são dificuldades, geralmente que vêm sobre os pecadores. Assim, Deus pergunta, retoricamente, através do profeta Amós, “Tocar-se-á a trombeta na cidade, sem que o povo se estremeça? Sucederá algum mal à cidade, sem que o SENHOR o tenha feito?” (Amós 3:6).

 

Ao seguirmos este assunto, não percamos o ponto principal. Deus Ele próprio declara, através de Isaías, que Ele não tem rival. Não existe um diabo, pessoal, super-natural.

 

(The Devil: The Great Deceiver por Peter Watkins, tradução para português: S.Mestre)

O DIABO - O GRANDE ENGANADOR (PARTE 2)

S. Mestre, 15.08.10

5

 

SATANÁS

 

Agora temos que virar a nossa atenção para a palavra satanás, e ver como é usada nas Escrituras. Para aqueles que acreditam num diabo pessoal, ela é somente mais um nome para o diabo. Muitos dos que não acreditam num diabo pessoal têm uma maneira muito simples de determinar a palavra. Satanás, dizem, significa adversário; tudo o que temos que fazer é substituir a palavra satanás por adversário, cada vez que a encontramos nas Escrituras, e não haverá problema.

 

Muito fácil, mas não muito satisfatório. Satanás certamente significa adversário, mas temos que distinguir entre o uso da palavra no Antigo Testamento e no Novo Testamento. A resposta fácil mencionada acima pode ser usada, geralmente no Antigo Testamento, mas não no Novo. E mesmo no Antigo Testamento temos que ter cuidado para distinguir entre o uso da palavra como um substantivo comum (um adversário) e como um título ou nome (o adversário).

 

O Antigo Testamento

 

O Antigo Testamento foi escrito em Hebraico, e a palavra satan é uma palavra Hebraica comum. Geralmente pode ser traduzida pelo seu equivalente em Português, adversário; e no geral, os tradutores da Bíblia Ferreira de Almeida Revista e Corrigida(a versão usada neste livro). A Concordância Bíblica de Young lista as seguintes passagens onde a palavra satan é traduzida adversário na maioria dos casos e uma vez inimigo e noutra acusador nesta tradução.

 

Números 22:22: “...e o Anjo do SENHOR pôs-se-lhe(a Balaão) no caminho por adversário.”

 

1 Samuel 29:4: “Faze voltar este homem(David), para que torne ao lugar que lhe designaste e não desça conosco à batalha, para que não se faça nosso adversário no combate.

 

2 Samuel 19:22: “Que tenho eu convosco, filhos de Zeruia, para que, hoje, me sejais adversários?”

 

1 Reis 5:4: “... não há nem inimigo, nem adversidade alguma.”

 

1 Reis 11:14: “Levantou o SENHOR contra Salomão um adversário...” (similarmente versículos 23 e 25).

 

Salmo 109:6: “Suscita contra ele um ímpio, e à sua direita esteja um acusador.”

 

Estas passagens demonstram que o adversário pode ser bom, mau ou indiferente. O primeiro refere-se a um anjo de Deus, que foi um adversário para o mau Balaão; o segundo, David, que era visto pelos Filisteus como um adversário; o terceiro, os sobrinhos de David; o quarto é negativo e por isso foi escolhida uma palavra mais forte – inimigo; Em 11 Reis 11) são adversários levantados por Deus contra Salomão por causa da sua desobediência; no último caso, fala dos que acusavam falsamente alguém de um crime.

 

O verbo relacionado é satan (ser um adversário, resistir), também ocorre quatro vezes: Salmo 71:13; Salmo 109:20,29; Zacarias 3:1.

 

Algumas vezes os tradutores deixaram a palavra satan por traduzir e a transliteraram(adaptaram a palavra satan para português) Satanás, como por exemplo nos dois primeiros capítulos de Jó, e em Zacarias 3. Eles tiveram uma razão em transliterar somente a palavra nestas passagens: satan é precedido do artigo definido. Não é um adversário, mas o adversário. A palavra é um título distintivo dado a um adversário especial. Claro, os tradutores podiam ter mostrado a distinção ao escrever “o adversário”, em vez de “um adversário” e poderiam ter evitado a confusão se o tivessem feito. Mas como a palavra é usada como um título ou nome, não podemos dizer que estavam errados só por a transliterarem.

 

Existe uma outra passagem em que os tradutores realmente nos enganaram:

 

1 Crónicas 21:1: “Então, Satanás se levantou contra Israel e incitou a David a levantar o censo de Israel.

 

Sem justificação, eles trataram satan como um nome nesta passagem. No Hebraico, o artigo não aparece, e a tradução deveria ter sido “um adversário”.

 

Ao presumirem que tinham identificado o adversário, os tradutores criaram uma contradição. Ao acreditarem num diabo pessoal, supuseram que o adversário era este diabo e chamaram-no “Satanás”. Traduzido assim, a passagem não concorda com o registo paralelo em 2 Samuel 24: onde lemos: “Tornou a ira do SENHOR a acender-se contra os israelitas, e ele incitou a David contra eles, dizendo: Vai, levanta o censo de Israel e de Judá.” É necessário muita explicação se o que é atribuído a Deus numa passagem é atribuído ao seu arqui-inimigo noutra. Mas se o registo de crónicas fosse, “Então, um adversário se levantou contra Israel, e incitou a David levantar o censo de Israel”, não haveria qualquer problema. Todos entenderiam que o Senhor – teria levantado alguém(o adversário), quer anjo quer humano de modo que David levantasse o censo de Israel. Assim como o Javé levantou os adversários contra Salomão (1 Reis 11;14,23,25).

 

O Novo Testamento

 

A palavra satanás encontra-se trinta e seis vezes no Novo Testamento. A primeira coisa que nos deve impressionar é que a palavra ocorra no Novo Testamento. O Novo Testamento foi escrito em Grego, e satan é uma palavra Hebraica. Foi transliterada para o Grego do Novo Testamento como satanas. Existem diversas palavras Gregas que significam “adversário”. Estas foram evitadas pelos escritores do Novo Testamento, e em vez delas esta palavra Hebraica foi introduzida no texto Grego. Obviamente, assim sendo, ela tem um significado especial no Novo Testamento que teria sido perdido se uma palavra Grega comum tivesse sido usada no seu lugar. Satanás foi a palavra inspirada pelo Espírito, e os tradutores fizeram bem em não traduzi-la aqui. Satanás no Novo Testamento é sempre um adversário especial – um grande adversário – e a sugestão, ouvida muitas vezes, que devemos ler “o adversário” no lugar de satanás, deve ser resistida.

 

Sumário

 

Sumariemos o que encontramos mais de relevante sobre a palavra satanás até este ponto:

 

  1. É uma palavra Hebraica comum , significando adversário.

  2. É usada, no Antigo Testamento, para todo o tipo de adversários, e na maioria dos casos pode-se usar a palavra adversário quando encontramos a palavra satan.

  3. Em duas passagens do Antigo Testamento (Zacarias e Jó) o artigo é usado, e o adversário é especial.

  4. No Novo Testamento Grego, a presença desta palavra Hebraica não traduzida mostra que o adversário em questão é sempre um adversário especial.

 

Passagens Ponte

 

Sugerimos agora que o uso especial da palavra satanás em Jó e Zacarias foi designado para antecipar a maneira pela qual a palavra é sempre usada no Novo Testamento. São passagens “ponte”.

 

O nosso próximo propósito é examinar estas Escrituras mais detalhadamente e ver se provêem uma ligação ao uso da palavra satanás no Novo Testamento.

 

 

6

 

SANTANÁS EM JÓ E ZACARIAS

 

Satanás no Livro de Jó

 

Já notamos que a palavra Hebraica satan é usada de maneira especial em Jó em Zacarias. Não é um adversário, mas o adversário.

 

Quem é o adversário no Livro de Jó? É dito por aqueles que acreditam num diabo pessoal que, devido às misteriosas andanças de Satanás, seus maus desígnios e poderes super-humanos, ele deve ser este diabo pessoal. Embora possamos produzir um grupo de Escrituras para demonstrar que o diabo na Bíblia não é uma pessoa, é desejável dar uma explicação do estranho papel do Satanás em Jó. Ainda para mais, queremos seguir o pensamento de que o uso especial da palavra satan em Jó e Zacarias antecipa a maneira pela qual a palavra é sempre usada no Novo Testamento.

 

Nós conhecemos a história. Satanás vai diante de Deus e insiste que a excecional retidão de Jó não se origina em motivos válidos. Jó teme a Deus pelo que consegue obter de Ele. É um homem muito rico: se as suas riquezas forem removidas, ele abandonará Deus. Aparentemente Deus dá permissão a Satanás, e uma serie de calamidades roubam Jó de todas as suas possessões, incluindo os seus dez filhos. Jó ainda teme a Deus. Satanás é persistente, e argúi que se Jó sofrer no corpo, ele amaldiçoará Deus. Mais uma vez, aparentemente, Deus permite que Satanás aja, e Jó é grandemente atormentado.

 

Aparentemente! Mas Deus realmente entregou Jó ao poder de um poderoso inimigo? A mulher de Jó parece pensar que foi o próprio Deus que afligiu Jó, quando exclamou: “Amaldiçoa a Deus e morre” (2:9). Jó também via as suas tribulações como visitações de Deus, e respondeu: “temos recebido o bem de Deus e não receberíamos também o mal?” (2:10). Jó disse ainda aos seus críticos: “Compadecei-vos de mim, amigos meus, compadecei-vos de mim, porque a mão de Deus me atingiu” (19:21). Mas mais importantes, são as palavras de Deus a Satanás: “Observaste o meu servo Jó? Porque ninguém há na terra semelhante a ele... Ele conserva a sua integridade, embora me incitasses contra ele, para o consumir sem causa” (2:3). Estas palavras removem o problema imediato. Elas mostram-nos que ambos Satanás e Deus tiveram parte nas tribulações de Jó. Satanás propôs as aflições, e Deus colocou-as em prática. Outra afirmação decisiva que mostra que foi Deus que agiu sobre Jó, encontra-se no último capítulo. O narrador com autoridade afirma: “Então, vieram a ele todos os seus irmãos... e se condoeram dele, e o consolaram de todo o mal que o SENHOR lhe havia enviado” (42:11).

 

Quem era “o Adversário”?

 

Mas ainda persiste um problema. Nós vimos que Satanás só fez proposições e que Deus agiu. Satanás assim pareceria ser um ser maligno desejando ver Jó sofrer, mas não necessariamente poderoso. Quem poderia ter sido então? Como podemos entender as suas andanças, a sua presença entre os filhos de Deus?

 

Eis aqui uma sugestão. Pensemos que Satanás é o símbolo dos desejos humanos errados – não no mundo, mas entre “os filhos de Deus”. Como ventos, estes pensamentos se moveriam invisivelmente no entanto poderosamente entre os crentes.

 

Quando os filhos de Deus se reuniram para adorar, estes pensamentos maus eram trazidos com eles – pensamentos de inveja contra Jó.

 

Mas certamente o menos elevado entre “os filhos de Deus” não quereria ver Jó sofrer tais aflições? Ele não quereria – e no entanto, pode ser que quisesse. Se olhar com ódio é assassínio, e olhar com luxúria é adultério (como o Senhor explica em Mateus 5), então olhar com inveja é desejar mal. O pensamento maligno pode nunca vir à superfície, ou até nunca ser reconhecido pelo que o pensa: mas no entanto está lá todo o tempo. “Tudo vai bem para o Irmão Jó. A sua saúde é boa e o seu negócio floresce; não tem preocupações financeiras ou problemas em casa. Que tipo de irmão seria ele se estivesse no meu lugar?” O desejo escondido – é colocar o irmão Jó numa situação pior que a a nossa.

 

Com uma vividez surpreendente Deus põe a descoberto os pensamentos mais íntimos dos Seus servos maus. De acordo com os seus desejos secretos, Jó é roubado das suas coisas e da sua saúde. Elifaz, Bildade e Zofar ficam pasmados quando vêem o cumprimento dos seus maus desejos secretos. Sete dias ficam em silêncio. É somente quando Jó abre a boca e amaldiçoa o dia em que nasceu que eles se encorajam e falam.

 

E como começa Elifaz? O amaldiçoar de Jó acorda velhos pensamentos maus. Elifaz pega onde Satanás acabou. Satanás tinha dito, “Aflige-o e ele mostrará como realmente é. Elifaz agora diz, “Tu foste afligido, e mostraste ser o que és”; e então talvez em sua mente pensou para si mesmo, “Tal como eu pensava!”

 

É verdadeiramente significante que Elifaz e os seus companheiros aparecem na história quando Satanás desaparece, mas também usam o mesmo argumento que Satanás. É de notar também, que eles são repreendidos quando o episódio de aflições de Jó termina, embora Satanás tenha começado tudo. Estes homens, e talvez outros como eles, certamente representavam a classe Satanás. A história foi escrita desta forma para nos instruir, para que não mantenhamos pensamentos maus e satânicos sobre os nossos irmãos, e acerca de Deus que parece abençoar mais a eles do que a nós.

 

Satanás em Zacarias 3

 

Agora vejamos mais de perto o Satanás de Zacarias 3. A passagem é a que se segue:

 

Deus me mostrou o sumo sacerdote Josué, o qual estava diante do Anjo do SENHOR, e Satanás estava à mão direita dele, para se lhe opor. Mas o SENHOR disse a Satanás: O SENHOR te repreende, ó Satanás; sim, o SENHOR, que escolheu a Jerusalém, te repreende; não é este um tição tirado do fogo? Ora, Josué, trajado de vestes sujas, estava diante do Anjo. Tomou este a palavra e disse aos que estavam diante dele: Tirai-lhe as vestes sujas. A Josué disse: Eis que tenho feito que passe de ti a tua iniquidade e te vestirei de finos trajes” (versículos 1 – 4).

 

A visão de Zacarias faz parte de um drama divinamente arranjado. Existem ligações a Judas que nos irão ajudar a entendê-lo. Judas 9 diz o seguinte:

 

“Contudo, o arcanjo Miguel, quando contendia com o diabo e disputava a respeito do corpo de Moisés, não se atreveu a proferir juízo infamatório contra ele; pelo contrário, disse: O Senhor te repreenda!”

 

Agora comparemos as passagens:

 

Zacarias 3

 

Josué o sumo sacerdote

Satanás

O anjo do Senhor

“ O SENHOR te repreende”

Vestes sujas

Um tição tirado do fogo

 

Judas

 

O corpo de Moisés

O diabo

Miguel o arcanjo

“O Senhor te repreenda!”

“Roupa contaminada pela carne” (versículo 23)

“Arrebatando-os do fogo” (versículo 23)

 

Em alguns itens o paralelo é óbvio. Satanás pode ser equiparado com o diabo sem dificuldade; o anjo do Senhor é em Judas dado o nome de Miguel; as referências a roupas sujas, e tirar do fogo, são comuns às duas passagens. Não pode-nos escapar a conclusão de que Josué o sumo sacerdote (o centro da discussão em Zacarias) corresponde ao corpo de Moisés (o tema da disputa em Judas). A equação exige isso. Faz sentido?

 

John Carter explica “o corpo de Moisés” assim: “A expressão de Paulo em 1 Coríntios 10:2 supre a chave para o significado. Israel tinha sido batizado em Moisés na nuvem e no mar. Assim como aqueles batizados em Cristo formam o “corpo de Cristo”, assim os Israelitas formavam o “corpo de Moisés”. A nação de Israel é assim indicada” (Profetas depois do Exílio, página 54).

 

A nação Israelita. Certamente isto é válido. Um sacerdote é um homem representativo. É um símbolo vivo das pessoas às quais ministra. Relembramos que Zacarias era um profeta da restauração, e Josué era um sacerdote da restauração. E as sua vestes sujas? Não representariam elas a sujidade espiritual deste povo que tinha casado com mulheres estrangeiras e tinham assim transgredido o mandamento de Deus? Lemos sobre isso em Esdras e Neemias.

 

Já observámos que o poder chamado Satanás em Zacarias 3 é chamado de diabo em Judas. Esta não é a única ocasião em que os nomes são usados alternadamente. No registo de Mateus da tentação do Senhor no deserto, o tentador é chamado de diabo, enquanto que em Marcos o tentador é chamado de Satanás. Em Apocalipse 12:9 e 20:2, um poder é chamado de “o grande dragão.... a antiga serpente, chamada Diabo e Satanás”.

 

Mas voltemos ao Satanás em Zacarias 3, e vejamos se podemos prosseguir com a identificação. Como já foi mencionado, o plano de fundo histórico é suprido por Esdras. Muitos Judeus tinham retornado do cativeiro a Jerusalém, e tinham começado a reconstruir o templo de acordo com o decreto de Círo. Os Samaritanos ressentiram-se com esta atividade dos Judeus, e persuadiram o rei Persa a parar com a obra. “Cessou, pois, a obra da Casa de Deus, a qual estava em Jerusalém; e isso até ao segundo ano do reinado de Dario, rei da Pérsia” (Esdras 4:24). Este foi o tempo em que Ageu e Zacarias começaram a profetizar. Ambos os profetas têm o cuidado de nos dizer isso; e Esdras 5:1 também afirma sobre esse mesmo tempo: “Ora, os profetas Ageu e Zacarias, filho de Ido, profetizaram aos judeus.” É evidente que estes profetas encorajavam o povo a voltarem à obra da construção do templo, porque a narrativa continua: “Então, se dispuseram Zorobabel, filho de Sealtiel, e Jesua, filho de Jozadaque, e começaram a edificar a Casa de Deus, a qual está em Jerusalém.” Imediatamente, os inimigos dos Judeus, liderados por Tatenai, Setar-Bozenai e “seus companheiros”, contestaram os Judeus, e queixaram-se a Dario o rei Persa sobre esta atividade sediciosa, mas Deus estava com os Seus servos e a obra prosperou.

 

Assim como o Satanás de Jó representava aqueles que injustamente se opunham àquele homem de Deus, o Satanás de Zacarias parece representar aqueles que injustamente se opunham ao povo de Deus durante a restauração. Precisamente quando o arcanjo teria dito “Deus te repreende” aos homens que tentavam frustrar a obra do povo de Deus, continua a ser um problema.

 

É importante notar que haviam três atores principais na visão de Zacarias, e que todos eles representavam uma multidão. Josué representava o povo de Deus; Satanás, os inimigos Samaritanos; e Miguel, os anjos. “os que estavam diante” de Miguel (Zacarias 3:4) seriam, presumivelmente, outros anjos, preparados para ministrar ao povo de Deus.

 

Um Caluniador

 

Considere agora outra ligação entre o Satanás de Zacarias e o de Jó, por um lado, e o poder representado como o grande inimigo no Novo Testamento por outro. Em Jó e Zacarias, Satanás tem o papel de um acusador. O Satanás de Jó acusa Jó, e o Satanás de Zacarias acusa Josué. É significativo que nestes dois lugares Satanás seja um caluniador. Já vimos que o poder chamado Satanás em Zacarias é chamado de diabo em Judas; e agora relembramo-nos do facto de que a palavra Grega diabolos (traduzida diabo) significa caluniador ou acusador.

 

Uma passagem de Apocalipse 12:9,10 será de ajuda aqui:

 

E foi expulso o grande dragão, a antiga serpente, que se chama diabo e Satanás, o sedutor de todo o mundo, sim, foi atirado para a terra, e, com ele, os seus anjos. Então, ouvi grande voz do céu, proclamando: Agora, veio a salvação, o poder, o reino do nosso Deus e a autoridade do seu Cristo, pois foi expulso o acusador de nossos irmãos, o mesmo que os acusa de dia e de noite, diante do nosso Deus.”

 

Sumário

 

Tentemos agora sumariar o que descobrimos até agora sobre o uso de Satanás nas Escrituras:

 

  1. Em todos os lugares menos dois no Antigo Testamento, satan significa apenas adversário.

  2. Nesses dois lugares (Jó e Zacarias 3), o uso do artigo definido (o satanás) indica um adversário especial, e sugere uma ligação com o uso da palavra satanás no Novo Testamento.

  3. No Novo Testamento Grego, a presença da palavra não traduzida, Satanás, mostra que o adversário em questão é sempre um adversário especial.

  4. O satanás de Zacarias é chamado de diabo em Judas.

  5. As palavras satanás e diabo no Novo Testamento são nomes diferentes para o mesmo poder.

  6. Em Jó e Zacarias, Satanás é um caluniador; e

  7. No Novo Testamento a palavra relacionada diabolos (diabo) significa caluniador. Além disso, o diabo no Novo Testamento é representado como caluniando “nossos irmãos”.

 

Existem então ligações evidentes entre as duas passagens que mencionam um Satanás especial no Antigo Testamento e as Escrituras do Novo Testamento sobre o diabo e Satanás. Em Jó e Zacarias, Satanás representa o inimigo e acusador do povo de Deus. Seres humanos antagonistas e invejosos (e os seus pensamentos) são personificados. No Novo Testamento, a ideia se desenvolve. As pessoas que são acusadas, enganadas e tentadas são aquelas que carregam o nome de Cristo. Satanás pode trabalhar desde dentro – de dentro do coração do crente, e de dentro da comunidade dos crentes. Satanás é a personificação dos desejos errados do coração. Por fim, Satanás deve ser lançado fora. Os pensamentos carnais devem ser arrancados do coração do Cristão, e as pessoas com mentes carnais devem ser removidas da comunidade Cristã.

 

7

 

A ANTIGA SERPENTE”

 

O nosso propósito agora é tomar nota do facto de que existem ligações muito próximas entre a serpente do Éden e o diabo e Satanás do Novo Testamento. Este facto aponta a alguma conclusões importantes.

 

Duas vezes no Apocalipse o poder chamado diabo e Satanás é também chamado de “antiga serpente”:

 

“E foi expulso o grande dragão, a antiga serpente, que se chama diabo e Satanás, o sedutor de todo o mundo, sim, foi atirado para a terra, e, com ele, os seus anjos” (12:9).

 

“Ele segurou o dragão, a antiga serpente, que é o diabo, Satanás, e o prendeu por mil anos;

lançou-o no abismo, fechou-o e pôs selo sobre ele, para que não mais enganasse as nações até se completarem os mil anos. Depois disto, é necessário que ele seja solto pouco tempo” (20:2, 3).



Dizer que estas Escrituras mostram que existe uma ligação entre a serpente e o diabo e Satanás fica aquém dos factos. Mostram que, de alguma maneira, a serpente é o diabo e Satanás.



É digno de nota que em cada uma destas passagens o poder é representado por um grande enganador – um lembrete do papel da serpente no Éden.



Vejamos agora duas outras citações que ligam Satanás com a serpente. A primeira é Romanos 16:17-20:



Rogo-vos, irmãos, que noteis bem aqueles que provocam divisões e escândalos, em desacordo com a doutrina que aprendestes; afastai-vos deles, porque esses tais não servem a Cristo, nosso Senhor, e sim a seu próprio ventre; e, com suaves palavras e lisonjas, enganam o coração dos incautos. Pois a vossa obediência é conhecida por todos; por isso, me alegro a vosso respeito; e quero que sejais sábios para o bem e símplices para o mal. E o Deus da paz, em breve, esmagará debaixo dos vossos pés a Satanás”



É passagem é fantástica porque contém muitas ligações ao Éden. Tem um aviso contra falsos mestres: era a serpente era um também. “Com suaves palavras e lisonjas” a serpente enganou Eva que era simples por falta de experiência. A palavra “ventre” tem um significado especial na história da serpente no Éden. A recomendação de Paulo de obediência para os crentes em Roma é um aviso explícito contra essa desobediência como caraterizada no Éden. A referência a bem e mal faz-nos lembrar da árvore do conhecimento do bem e do mal. E a garantia de que Deus em breve esmagaria Satanás debaixo dos seus pés é uma alusão à ferida que seria desferida à cabeça da serpente.



No Éden era uma serpente. Em Romanos 16 é Satanás. A equação é inegável.



A outra citação é de 2 Coríntios 11:



“Porque zelo por vós com zelo de Deus; visto que vos tenho preparado para vos apresentar como virgem pura a um só esposo, que é Cristo. Mas receio que, assim como a serpente enganou a Eva com a sua astúcia, assim também seja corrompida a vossa mente e se aparte da simplicidade e pureza devidas a Cristo” (versículos 2, 3).



“Porque os tais são falsos apóstolos, obreiros fraudulentos, transformando-se em apóstolos de Cristo. E não é de admirar, porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz. Não é muito, pois, que os seus próprios ministros se transformem em ministros de justiça; e o fim deles será conforme as suas obras” (versículos 13-15).



Paulo leva-nos até ao Éden quando diz “assim como a serpente enganou a Eva com a sua astúcia, assim também seja corrompida a vossa mente e se aparte da simplicidade e pureza devidas a Cristo” . Os falsos mestres são assim equiparados ao primeiro falso mestre, a serpente. Este pensamento é levado até ao versículo 13. Falando dos falsos mestres do seu tempo, Paulo diz, “ Porque os tais são falsos apóstolos, obreiros fraudulentos, transformando-se em apóstolos de Cristo.” Isto não é de se admirar , diz ele, quando alguém considera o protótipo de todos os falsos mestres, a serpente, é vista como um mensageiro do próprio Deus. As suas palavras reais são “E não é de admirar, porque o próprio Satanás se transforma em anjo de luz.” A serpente apresentou-se a Eva como alguém que podia dar-lhe entendimento comunicando a mente de Deus. “Deus sabe...” disse ela. A mensagem da serpente, “É certo que não morrereis,” foi aceite por Eva, e tem sido a filosofia que tem dominado o pensamento humano desde então. Praticamente toda a gente religiosa, não importa a denominação, acredita que é imortal; e todas as pessoas, quase sem exceção agem como se nunca fossem morrer. Assim a primeira mensagem, uma mentira, da serpente é o primeiro credo dos homens, e o primeiro mensageiro mentiroso transformou-se, na mente dos homens, num mensageiro da luz celestial. Não é de admirar que mensageiros de menos importância sejam mantidos em grande estima, e constituem uma ameaça importante para os crentes.



Não percamos de vista o ponto principal na nossa busca de detalhes. Eis aqui uma referência óbvia à serpente: e a serpente é chamada de Satanás.



Estas ligações do Novo Testamento com o Éden são um estudo fascinante, mas examinar mais exemplos neste ponto desviaria-nos do nosso propósito principal. A questão que deve ser respondida agora é: Como explicamos o facto de que exista uma ligação entre a serpente do Éden e o diabo e Satanás do Novo Testamento?



Alguns diriam que a ligação é óbvia: Satanás veio até ao Éden na forma de uma serpente.



A Serpente vira Satanás



Já discutimos este assunto no capítulo 4 – Caprichos e Falácias, e vimos que esta teoria em vez de remover dificuldades cria ainda dificuldades maiores. Alega-se aqui que essa teoria, de facto, é o oposto da verdade. Satanás não virou serpente: a serpente virou Satanás.



Dito com mais substância: porque a serpente foi o primeiro tentador, tornou-se um símbolo daquilo que a partir daí tenta o homem – os desejos humanos errados: e dois outros nomes para os desejos humanos não em conformidade com Deus são o diabo e satanás.



A serpente no Éden é um símbolo de desejos humanos errados. A famosa passagem da “inimizade” de Génesis 3:14, 15 introduz este pensamento:



Então, o SENHOR Deus disse à serpente: Porquanto fizeste isso, maldita {serás} mais que toda besta e mais que todos os animais do campo; sobre o teu ventre andarás e pó comerás todos os dias da tua vida.E porei inimizade entre ti e a mulher e entre a tua semente e a sua semente; esta {Heb. ele} te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar.”(RC)



A primeira parte desta passagem é obviamente dirigida à serpente do Éden. A segunda parte, de um jeito típico dos éditos de Génesis, vai para além das circunstâncias imediatas.



Existem três expressões de inimizade, ou hostilidade mútua:



  1. Entre a serpente e a mulher (“ Porei inimizade entre ti e a mulher”).

  2. Entre a semente serpente e a semente da mulher (“entre a tua semente e a sua semente”).

  3. Entre a serpente e a semente da mulher (“ esta {Heb. ele} te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar”).



Existem duas características interessantes e esclarecedoras da terceira expressão de hostilidade. Primeiro, notamos que a semente da mulher está no singular: “esta {Heb. ele} te ferirá a cabeça.” Isto identifica a semente da mulher com o Senhor Jesus.



A segunda característica digna de nota é: enquanto que a primeira “inimizade” é entre a serpente e a mulher, e a segunda “inimizade” é entre a respetivas sementes, existe um cruzar de linhas, assim por dizer, na terceira “inimizade”. Aqui existe um combate mortal entre a serpente (não a semente da serpente, como poderíamos esperar), e a semente da mulher. As Escrituras são tão precisas que temos que procurar a razão para esta característica inesperada. Uma implicação parece ser (não importa como possa ser interpretada) que a serpente ainda existe quando a semente da mulher aparece. E já que a semente da mulher está no singular, e se aplica a Cristo, podemos substituir os nossos termos e dizer que a serpente tem existência quando Cristo aparece.

A serpente tem existência quando Cristo aparece. Obviamente isto não pode ser verdade sobre a serpente original no Éden. Essa serpente tornou-se num símbolo de algo diferente: dos desejos humanos que são hostis à vontade de Deus. O Novo Testamento tem dois nomes para estes desejos ímpios: o diabo e Satanás.

 

 

8

 

A SERPENTE E SATANÁS

 

Já foi demonstrado que a serpente no Edén é a base para aquelas passagens do Novo Testamento onde referência é feita ao diabo e Satanás. A serpente virou um símbolo disso, no homem, que se opõe à vontade de Deus: e os nomes do Novo Testamento para esta tendência para a rebelião são diabo e Satanás. Isto significa que quando lemos sobre o diabo e Satanás no Novo Testamento, devemos pensar na serpente, e procurar algo no contexto que lembre a ocasião quando os nossos primeiros pais caíram. Pensando agora em termos pessoais, se cada um de nós visse cada tentação como uma reconstituição da crise no Éden, certamente nos ajudaria a superá-la.

 

A relação entre a serpente e Satanás é um tema muito impressivo do Novo Testamento que vale a pena ser estudado mais a fundo. Vejamos agora mais passagens onde existe uma ligação clara entre o arqui-inimigo do Novo Testamento e a serpente no Éden.

 

A Tentação do Senhor

 

A história da tentação no deserto já foi discutida, e estamos familiarizados com os detalhes. Tem sido muitas vezes dito que esta tentação, como a tentação de Eva, é um tentação tripla. Realmente, ambas têm sido vistas como tentações capazes de excitar “a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida” (1 João 2:16). Em ambos os casos, Deus é reconhecido, e não existe incitamento a rebelião aberta contra Ele. Por outras palavras, o método de aproximação é extremamente sutil. O tentador, em ambos os casos, sugere um curso de ação que é suposto trazer benefícios pessoais – visto em termos de bem estar físico e subida de posição. O diálogo é também uma característica de ambas as tentações. A tentação no deserto então, é para ser vista como uma reconstrução do drama fatídico do Éden: só que com um resultado diferente.

 

Suponha, por um momento, que Adão tinha recusado comer do fruto proibido oferecido pela sua mulher. Nesse caso, a mulher teria sido uma pecadora, e o homem seria justo. E depois? Ele teria sido expulsa do jardim, e, presumivelmente, ele poderia continuar a viver lá. E então? Não sabemos; mas conhecemos um homem que manteve-se justo enquanto que a sua noiva estava manchada pelo pecado. Embora ele tenha sido severamente tentado, ele manteve a sua integridade, e por causa disso e foi capaz de ganhar de volta a sua noiva para Deus. Tudo isto é sugerido ao comparar a provação do Éden com a tentação no deserto (Efésios 5:25-27).

 

Arreda, Satanás!”

 

“Mas Jesus, voltando-se, disse a Pedro: Arreda, Satanás! Tu és para mim pedra de tropeço, porque não cogitas das coisas de Deus, e sim das dos homens” (Mateus 16:23).

 

Conhecemos o plano de fundo. O Senhor tinha afirmado que tinha que ir para Jerusalém para sofrer e morrer. Chocado com essa possibilidade, Pedro repreendeu o seu mestre, somente para receber de volta uma repreensão muito mais dura. Mas porquê uma repreensão tão severa? E porque foi Pedro chamado de Satanás, quando a sua intervenção surgiu somente pelo seu afeto pelo Senhor? Lembre-se que no Novo Testamento Satanás é sempre um nome com um significado sinistro. Chamando Pedro de Satanás era como chamar Judas de diabo – só que podemos ver logo que Judas merecia o nome.

 

Não importa quão boas eram as intenções, Pedro estava a tentar o seu Senhor a desobedecer Deus. Ele estava fazendo o que a serpente tinha feito a Eva. Quando Jesus mostrou a sua prontidão em morrer em Jerusalém, Pedro repreendera-o. Quase que se pode escutar a voz da serpente nas palavras de Pedro: “É certo que não morrereis”. A sugestão então é que Pedro é chamado de Satanás porque ele estava fazendo o papel da serpente. Se o Senhor tivesse dado ouvidos a Pedro, a tragédia do Éden se teria repetido outra vez – desta vez com consequências irrevogáveis para toda a humanidade.

 

O Senhor tomou a oportunidade para dar uma lição: “Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me.”

 

Pedro aprendeu a lição, Mais tarde, ele foi capaz de dizer:

 

Porque, que glória será essa, se, pecando, sois esbofeteados e sofreis, mas se, fazendo o bem, sois afligidos e o sofreis, isso é agradável a Deus.Porque para isto sois chamados; pois também Cristo padeceu por nós, deixando-nos o exemplo, para que sigais as suas pisadas...”(RC)

 

Pedro diz isto contra si mesmo. Ele tinha-se colocado no caminho de Jesus e tentou detê-lo para que não sofresse. Na realidade, o Senhor dissera-lhe, “Não te coloques no meu caminho: vai para trás de mim e segue-me no caminho do sofrimento.”

 

A Semente da Serpente

 

Por que é que vocês não entendem o que eu digo? É porque não querem ouvir a minha mensagem.

Vocês são filhos do Diabo e querem fazer o que o pai de vocês quer. Desde a criação do mundo ele foi assassino e nunca esteve do lado da verdade porque nele não existe verdade. Quando o Diabo mente, está apenas fazendo o que é o seu costume, pois é mentiroso e é o pai de todas as mentiras. Mas, porque eu digo a verdade, vocês não crêem em mim” (João 8:43-45).



A ligação com a serpente é óbvia aqui. O diabo é representado como um mentiroso e destruidor da vida, assim tal como a serpente. Porque estes Judeus rejeitavam a verdade, e procuravam matar o homem que falava a verdade, eles eram espiritualmente filhos da serpente. E assim, o Senhor Jesus dirige os nossos pensamentos para a famosa passagem da “inimizade”, e identifica estas pessoas com a semente da serpente. Aqui realmente temos um exemplo da inimizade entre a semente da serpente (semente plural) e o homem que só ele pode afirmar ser a semente da mulher.



O Caminho de Caim

“Aquele que pratica o pecado procede do diabo, porque o diabo vive pecando desde o princípio. Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do diabo. Todo aquele que é nascido de Deus não vive na prática de pecado; pois o que permanece nele é a divina semente; ora, esse não pode viver pecando, porque é nascido de Deus. Nisto são manifestos os filhos de Deus e os filhos do diabo: todo aquele que não pratica justiça não procede de Deus, nem aquele que não ama a seu irmão. Porque a mensagem que ouvistes desde o princípio é esta: que nos amemos uns aos outros” (1 João 3:8-11).



Embora a semente da mulher consista de uma pessoa, o Senhor Jesus Cristo, uma multidão é trazida para a família de Deus através desta única semente. Existe uma grande diferença entre os filhos de Deus e os filhos do diabo, ou semente da serpente, como podem ser chamados. João diz-nos que duas características distintivas dos filhos de Deus são: “eles não pecam; amam-se uns aos outros. Agora veja como João desenvolve o seu argumento. Tendo dito que os filhos de Deus se amam uns aos outros, ele mostra que o oposto é verdade sobre os filhos do diabo, ou semente da serpente. Ele dá um exemplo:



“Não(sejamos) segundo Caim, que era do Maligno e assassinou a seu irmão; e por que o assassinou? Porque as suas obras eram más, e as de seu irmão, justas.” (versículo 12).



Espiritualmente, Caim era o primogénito da serpente, e o protótipo de todos os ímpios. Quando Eva deu à luz a Caim, ela disse: “Adquiri um varão com o auxílio do SENHOR.” Quão errada ela estava! Este filho pecador de pais pecadores era espiritualmente filho da serpente, ou como João o expressa, ele “era do Maligno”. Como tal, ele não amava seu irmão: mas o odiava e matou-o. Caim foi o primeiro filho de pais pecadores; ele próprio era pecador; no seu pecado manifestou, de uma maneira notável, as tendências assassinas e enganosas da serpente; ele era, em sentido literal, o pai de uma raça de malignos.



As duas mais importantes famílias no mundo antes do dilúvio eram aquelas de Caim e Sete. Os filhos de Caim seguiram o seu pai no caminho da impiedade. Lameque, o sétimo depois de Adão na linha de Caim (não confundir com Lameque pai de Noé, na linha de Sete) é mostrado como um homem ímpio, assassino e bígamo, e que negociava na misericórdia de Deus. Através dele entendemos melhor onde chegaram os filho de Caim ao prosseguirem pelo “caminho de Caim”; e não foi muito depois que os da linha de Sete enveredaram pelo mesmo caminho, e trouxeram a ira de Deus sobre as suas cabeças. Falando dos rebeldes de uma era mais tardia, Judas relaciona-os com o seu antepassado espiritual: “Ai deles! Porque prosseguiram pelo caminho de Caim” (versículo 11).



Já nos desviamos de 1 João 3, mas não do nosso tema. Tendo dito que os filhos de Deus têm que amar os seus irmãos, e não odiá-los como Caim fez, João vai ao centro da questão, e diz:



“Todo aquele que odeia a seu irmão é assassino; ora, vós sabeis que todo assassino não tem a vida eterna permanente em si” (versículo 15).



Isto é irónico. Um assassino tenta tirar a outro a vida. O que ele realmente faz é privar-se ele mesmo da vida. Então vem o grande contraste. O primeiro da linhagem da serpente já foi referido: Caim, o assassino. Agora somos convidados a considerar o primogénito da família de Deus. Longe de provar outros da vida, ele próprio sofreu a morte por causa de seus irmãos.



Não importa quão fascinante seja tudo isto, tudo se perde se não levarmos a lição a peito: “devemos dar nossa vida pelos irmãos.”

 

(The Devil: The Great Deceiver por Peter Watkins, tradução para português: S.Mestre)

O DIABO - O GRANDE ENGANADOR (PARTE 3)

S. Mestre, 15.08.10

9

 

O DIABO E O ESPÍRITO SANTO

 

Outro Tema do Novo Testamento

 

Já notamos que o assunto do diabo é essencialmente um assunto do Novo Testamentpo. Calro, o poder conhecido como o diabo estava operando no tempo do Antigo Testamento, e existem uma ou duas passagens interessantes no Antigo Testamento que ajudam a nos preparar para o que vem mais tarde. Mas o tema do diabo, como um tema, está restrito ao Novo Testamento.

 

É mais do que interessante observar que o mesmo é verdade sobre o Espírito Santo. O poder conhecido como o Espírito Santo operava no tempo do Antigo Testamento, e novamente existem passagens significativas no Antigo Testamento que nos preparam para o que se seguirá: mas o Espírito Santo só é lidado como um tema senão no Novo Testamento.

 

Somos apresentados a ambos assuntos logo cedo no Evangelho de Mateus. Logo no princípio do ministério do Senhor, ambos o diabo e Espírito Santo são representados como influências potencialmente decisivas e poderosas. Imediatamente antes do Senhor Jesus ser revelado a Israel, João Batista anunciou que viria alguém depois dele que batizaria com o Espírito Santo. Isto é seguido rapidamente do relato do batismo em água do Senhor; e depois,

 

Batizado Jesus, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba, vindo sobre ele” (Mateus 3:16).

 

O evento logo a seguir é um encontro com o diabo no deserto. É difícil resistir à conclusão que estes dois poderes são nos apresentados desta forma dramática, no início do ministério do Senhor, para que possamos vê-los como opostos e rivais. No Senhor Jesus, o conflito entre o bem e o mal é trazido à superfície, e é representado de forma realista como um duelo entre o Espírito Santo e o diabo.

 

Um Duelo

 

A ideia de um duelo, no início do ministério de Jesus, é expressado mais claramente no Evangelho de Lucas. A sequência dos eventos é a seguinte:

 

  1. O Espírito Santo vem sobre Jesus.

  2. Cheio do Espírito Santo”, Jesus foi levado pelo Espírito ao deserto, onde –

  3. Foi tentado pelo diabo.

  4. O diabo aparta-se dele, até momento oportuno. (porque o Espírito sai vencedor); e –

  5. O Espírito leva Jesus para Nazaré, onde –

  6. Ele lê uma passagem apropriada em Isaías (“O Espírito do Senhor está sobre mim...”)

 

Em certas passagens, ficamos com a impressão de que duas forças opostas estão em conflito direto. Mateus 12:22-31 é um bom exemplo:

 

Então, lhe trouxeram um endemoninhado, cego e mudo; e ele o curou... Mas os fariseus, ouvindo isto, murmuravam: Este não expele demónios senão pelo poder de Belzebu, maioral dos demónios.

Jesus... disse: Todo reino dividido contra si mesmo ficará deserto, e toda cidade ou casa dividida contra si mesma não subsistirá. Se Satanás expele a Satanás, dividido está contra si mesmo; como, pois, subsistirá o seu reino?E, se eu expulso demónios por Belzebu, por quem os expulsam vossos filhos?... Se, porém, eu expulso demónios pelo Espírito de Deus, certamente é chegado o reino de Deus sobre vós... Quem não é por mim é contra mim; e quem comigo não ajunta espalha... todo pecado e blasfémia serão perdoados aos homens; mas a blasfémia contra o Espírito não será perdoada...”



Esta não é a ocasião para discutir o assunto dos demónios. Deve ser suficiente apontar aqui que estas influências malignas, como quer que sejam entendidas, estão associadas ao reino de Satanás.



Tentemos agora seguir o argumento. Os inimigos dizem que Jesus expulsa os demónios através do poder de Belzebu, ou Satanás, o príncipe demónio. Jesus mostra que, até pela lógica humana, esta proposição é absurda. Se ele fosse um agente de Satanás, ele estaria promovendo a atividade demoníaca, e não destruindo. É através do Espírito de Deus que Jesus faz estes milagres que são hostis ao reino de Satanás. Ele está lutando pelo reino rival: o reino de Deus. Daí as palavras, “ é chegado o reino de Deus sobre vós”. Ao atribuírem a obra do Espírito Santo a Satanás, os Fariseus estavam blasfemando contra o Espírito Santo e ganharam uma repreensão severa.



O significado das palavras, “Quem não é por mim é contra mim...” é algumas vezes ignorado. Evidentemente, o Senhor Jesus é o inimigo de Satanás. Aquele que se lhe opõem estão assim do lado de Satanás. Quão irónico então que os Fariseus se revelem estar no lado de Satanás, ao acusar o Senhor de ser um agente de Satanás!



Os Papeis em Conflito de Pedro



Seguindo mais ainda esta ideia do conflito direto entre o Espírito Santo e o diabo, relembramos duas ocasiões consecutivas na vida de Pedro. Quando Pedro fez a sua confissão, “Tu és o Cristo, o Filho do Deus vivo”, o Senhor disse-lhe que carne e sangue não lhe revelaram isso, mas o Pai no céu. Por outras palavras, o que ele disse foi inspirado pelo Espírito. Imediatamente depois, Pedro tentou fazer com que Jesus não fosse para Jerusalém para sofrer e morrer lá, e foi chamado de Satanás. Mais uma vez Satanás e o Espírito de Deus representam pontos de vista diretamente opostos.

 

Os Poderes Hostis em Atos

 

Mais expressões de hostilidade entre o Espírito Santo e Satanás encontram-se em Atos. No final d Atos 4 lemos que a multidão de crentes reunida ficou cheia do Espírito Santo; e imediatamente depois é nos dito que eles venderam as suas possessões e tinham todas as coisas em comum. Este impulso de juntar toda a riqueza parece ter sido o resultado direto de terem recebido o Espírito Santo. Se isto está correto, explica porque o engano de Ananias e Safira, em fingirem dar tudo o que obtiveram na venda de uma parcela de terreno, é descrito como uma mentira ao Espírito Santo.

 

Quer este raciocínio seja válido ou não, o pecado de Ananias foi, de alguma forma, um pecado contra o Espírito Santo, porque a narrativa assim o diz. Notemos agora o facto de que este pecado contra o Espírito Santo é atribuído à influência de Satanás:

 

“Então, disse Pedro: Ananias, por que encheu Satanás teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo, reservando parte do valor do campo?” (5:3).



Antes que se pense que esta passagem é uma das que provê munições para aqueles que acreditam num diabo pessoal, é digno de nota que as palavras, “por que encheu Satanás teu coração?” têm um paralelo no versículo seguinte: “Como, pois, assentaste no coração este desígnio?”

 

As palavras de Pedro a Cornélio também contém uma passagem na qual o Espírito Santo e o diabo são representados como rivais:

 

“...Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com poder, o qual andou por toda parte, fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do diabo, porque Deus era com ele” (Atos 10:38).

 

Aclamação pelos Endemoninhados

 

Muitas pessoas ficaram impressionadas pelo facto de que existem muitas instâncias no Novo Testamento de endemoninhados que proclamam em voz alta que Jesus era o Filho de Deus, e que os apóstolos eram os servos de Deus. Eis aqui alguns exemplos:

 

Quando, de longe, (o endemoninhado que vivia entre os túmulos) viu Jesus, correu e o adorou, exclamando com alta voz: Que tenho eu contigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo?” (Marcos 5:6,7).

 

“Achava-se na sinagoga um homem possesso de um espírito de demônio imundo, e bradou em alta voz: Ah! Que temos nós contigo, Jesus Nazareno? Vieste para perder-nos? Bem sei quem és: o Santo de Deus!” (Lucas 4:33,34).

 

“Aconteceu que, indo nós para o lugar de oração, nos saiu ao encontro uma jovem possessa de espírito adivinhador, a qual, adivinhando, dava grande lucro aos seus senhores. Seguindo a Paulo e a nós, clamava, dizendo: Estes homens são servos do Deus Altíssimo e vos anunciam o caminho da salvação” (Atos 16:16,17).

 

Existem outras passagens. Como as explicamos? Alguns sugeriram que os endemoninhados estavam apenas repetindo o que ouviram as pessoas dizer. Certamente, se esta fosse a explicação, as pessoas possuídas por demónios estariam inclinadas, mas muito inclinadas, a atacar Jesus e os apóstolos usando blasfémia e imposturas, porque eles teriam também ouvido muitos dizerem essas coisas. No entanto nunca nos é dito que eles disseram mais alguma coisa do que estas verdades sobre os mestres enviados por Deus.

 

A sugestão oferecida aqui é que estes confrontos com endemoninhados trazia à tona a hostilidade dos poderes rivais, o Espírito Santo e o diabo. As situações representavam um desafio. As pessoas dementes estavam(na linguagem da Bíblia) gravemente oprimidas pelo diabo. Mas o Espírito de Deus era muito mais poderoso: tão mais poderoso que compelia estas criaturas desgraçadas a fazerem essas aclamações. Expresso em termos literais, estes homens, manifestavam de uma maneira mais óbvia do que muitos outros, as horríveis consequências do pecado. Que prova então do poder de Deus sobre o pecado, que estes homens, de entre todos os outros, davam tal aclamação aos servos de Deus! Os setenta que Jesus enviou, parece terem ficado muito impressionados com isso. Eles retornaram alegres, dizendo: “Senhor, os próprios demónios se nos submetem pelo teu nome!”

 

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O DIABO E OS SEUS ANJOS

 

Demónios

 

É tempo de lidarmos diretamente com o assunto dos demónios. Conhecemos o problema. Há muitas passagens no Novo Testamento que falam da atividade de demónios e espíritos impuros. Uma leitura simples destas passagens podem levar-nos a supor que certos seres invisíveis e malignos existiram – e talvez ainda existam – que atormentavam as mentes e corpos dos humanos. Loucura, surdez, mudez e outras maleitas parecem ser atribuídas a estes espíritos impuros nos Evangelhos e Atos.

 

Já foi dito que embora estes espíritos maus – como quer que sejam entendidos – são chamados de demónios nas nossas Bíblias.

 

Existe uma importante ligação entre o diabo e demónios. Isto já foi apontado na discussão sobre “Belzebu” no capítulo anterior. O Senhor foi acusado de expulsar demónios através de Belzebu, o príncipe dos demónios. Ao repudiar esta acusação, ele mostra que está trabalhando contra Belzebu, e a favor de Deus. É pelo poder de Deus que ele expulsa demónios. Assim Jesus reconhece a ligação entre Belzebu e os demónios; e também equipara Belzebu com Satanás (Mateus 12:26,27), isto significa que existe uma ligação entre Satanás, ou diabo, e os demónios.

 

Outra passagem que mostra que existe uma relação entre Satanás e os demónios é Lucas 10:17,18. Quando os setenta discípulos, que Jesus enviou a pregar, voltaram dizendo com alegria, “Senhor, os próprios demónios se nos submetem pelo teu nome!”, Jesus disse, “Eu via Satanás caindo do céu como um relâmpago”.

 

Não somente podemos ver a relação entre Satanás e os demónios nestas passagens: podemos discernir a natureza desta relação. Os demónios são descritos como ministros de Satanás ou anjos. Satanás tem um reino, e estes espíritos impuros são os seus servos. Isto parece apontar para a conclusão que todo o assunto deve ser visto como uma figura recorrente no Novo Testamento. Realmente, no seu registo da disputa sobre Belzebu, Marcos diz-nos que Jesus estava falando em parábolas:

 

Os escribas, que haviam descido de Jerusalém, diziam: Ele está possesso de Belzebu. E: É pelo maioral dos demónios que expele os demónios. Então, convocando-os Jesus, lhes disse, por meio de parábolas: Como pode Satanás expelir a Satanás?”

 

 

Uma Parábola Contínua



Ao usar a palavra “parábola”, Marcos dá-nos aqui uma dica vital para entendermos o assunto como um todo. O assunto de Satanás e demónios – ou o diabo e os seus anjos – deve ser visto como uma parábola complexa e contínua do Novo Testamento. Pois fomos dirigidos pelas Escrituras a pensar que as passagens sobre “demónios” são um aspecto de um tema maior relativo ao diabo.



Como isto afeta a questão da existência dos demónios? Obviamente existe algum tipo de base factual para os episódios de demónios. Estes relatos podem ser parte de uma parábola contínua: mas é uma parábola em ação, como a alimentação dos cinco mil. Usando a palavra “parábola”, não dispomos necessariamente dos eventos, embora possamos ser capazes de vê-los de um outro ângulo.



Algumas características das histórias de demónios são claramente literais. As pessoas eram reais, o seu sofrimento era real, e os milagres que o Senhor fez para livrá-los do sofrimento eram também reais. E assim prosseguimos para o pensamento de que o elemento não literal nas narrativas é a linguagem usada para descrever as aflições, e os métodos de cura. Assim, homens sofrendo de loucura, surdez e mudez são descritos como pessoas possuídas por demónios, e as suas curas são representadas como expulsando estes demónios.



Afirmemos categoricamente que não é suficiente dizer que os escritores do Novo Testamento estavam usando uma linguagem que refletia as superstições da época. É sem dúvida verdade que a superstição sobre demónios deixou a sua marca sobre a linguagem daquele tempo, mas não é a única verdade relevante. Nem é realmente a verdade mais importante. Não foi as limitações da linguagem que levaram os escritores dos Evangelhos a fazer um uso elaborado da terminologia relativa a demónios: foi o Espírito de Deus. A superstição pagã acerca de um senhor do mal e suas hostes proveu uma base admirável para a parábola concernente o inimigo real. Em vez de negar a existência de um arqui-inimigo e seus demónios, os escritores do Novo Testamento reconhecem a sua existência, mas veem-na de maneira diferente. O arqui-inimigo real está à espreita dentro do coração do próprio homem.



A Superstição sobre Demónios



O que significava a palavra daimonion para os Gregos? Era aplicada em geral aos deuses, e mais tarde a deuses inferiores. Era pensado que estes deuses inferiores, ou demónios, eram os espíritos de humanos que haviam morrido. Os demónios bons vinham de homens bons, e os demónios maus vinham de homens maus. Os demónios maus caçavam os seres humanos, entravam em seus corpos e causavam certas enfermidades. Assim pessoas com tais maleitas como loucura, surdez e mudez eram descritas como estando possuídas por demónios.



É interessante notar que o tipo de enfermidades atribuídas a demónios eram queles que não podiam ser relacionadas com uma óbvia condição física. Ser aleijado não era atribuído a demónios porque a condição anormal dos membros da pessoa aleijada provinham uma explicação para o seu coxear. Mas pessoas loucas, surdas e mudas pareciam igual às outras – não existia uma explicação fisiológica que conhecessem – e então a possessão demoníaca era postulada. Uma comparação de Mateus 9:28 com 9:32 ilustra isso.



Facto ou Figura



Agora suponhamos que alguém insiste que o Novo Testamento ensina que existiam seres chamados demónios: Como respondemos a isso? Primeiro, apontamos, referenciando Marcos 3:23, que o assunto de Satanás e demónios é uma parábola, e que, como outras parábolas, requer cuidado ao lidar com ela. A seguir, sugerimos que em vista da origem pagã da demonologia, e o facto de estar de perto ligada à doutrina da imortalidade das almas que as Escrituras refutam tão decisivamente, é muito improvável que as próprias Escrituras ensinassem essa doutrina. Finalmente, observamos que embora as Escrituras falem de possessão por demónios, a própria maneira como isto é usado sugere que eles não acreditavam em demónios. Algumas passagens apoiam isto:



Chegada a tarde, trouxeram-lhe muitos endemoninhados; e ele meramente com a palavra expeliu os espíritos e curou todos os que estavam doentes; para que se cumprisse o que fora dito por intermédio do profeta Isaías: Ele mesmo tomou as nossas enfermidades e carregou com as nossas doenças” (Mateus 8:16,17).



Mateus aqui nos diz que por expulsar demónios, Jesus tomou nossas enfermidades e carregou nossas doenças: logo a possessão de demónios é um jeito de descrever enfermidades e doenças.



“Naquela mesma hora, curou Jesus muitos de moléstias, e de flagelos, e de espíritos malignos; e deu vista a muitos cegos” (Lucas 7:21).



Jesus aqui é descrito como curando pessoas com espíritos malignos. O facto de que eles precisavam de cura implica uma enfermidade física. O uso da palavra “curou” na próxima passagem confirma isto:



“Então, lhe trouxeram um endemoninhado, cego e mudo; e ele o curou, passando o mudo a falar e a ver” (Mateus 12:22).



O Endemoninhado Gerasenos



Mas pode ser contendido que em algumas vezes a linguagem sugere que os escritores do Evangelho, e o próprio Jesus, acreditavam que os demónios eram seres vivos. No incidente dos “porcos Gerasenos” (Marcos 5:1-20), três detalhes da narrativa parecem apontar para esta conclusão:



  1. Jesus se dirigiu aos demónios.

  2. Os demónios falaram com Jesus.

  3. Os demónios foram transferidos para os porcos.



O facto de Jesus se dirigir aos demónios não implica necessariamente que eles eram seres vivos inteligentes, não mais que o mar e o vento aos quais Jesus se dirigiu (o evento está registado logo antes, em Marcos), dizendo, “Acalma-te, emudece!”, implica que o vento e o mar eram seres inteligentes. Existe um número de instâncias nas Escrituras onde se dirige a palavra a coisas inanimadas: altar, figueira, céu, terra; e Moisés uma vez foi ordenado falar a uma rocha. Consistente com a nossa tese, cada uma destas ocasiões eram também uma parábola em ação. Falar a essas coisas inanimadas era sempre para o benefício dos ouvintes, e era um sinal para o facto que o poder divino estava a ser usado sobre aquilo ao qual se falava.





Os demónios falaram com Jesus: mas falaram mesmo? Marcos diz-nos que o homem louco viu Jesus de longe, e “exclamando com alta voz: Que tenho eu contigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo? Conjuro-te por Deus que não me atormentes! Porque Jesus lhe dissera: Espírito imundo, sai desse homem!”. A ordem das falas é a seguinte:



  1. Jesus, aparentemente dirigindo-se aos demónio, diz, “Espírito imundo, sai desse homem!”.

  2. O homem responde, “Que tenho eu contigo, Jesus, Filho do Deus Altíssimo...?”

 

Note particularmente que o homem fala, embora Jesus aprece dirigir-se ao demónio.



A seguir, Jesus pergunta ao homem, “Qual é o teu nome?” O homem responde, mas parece identificar-se com os demónios e responde: “Legião é o meu nome, porque somos muitos”. O homem então rogou a Jesus que não mandasse os demónios para fora do país; e então, aparentemente, os demónios pedem para ser enviados para os porcos. A partir do facto de que o homem responde quando Jesus se dirigiu aos demónios, e o facto de que o homem diz dos demónios, “somos muitos”, devemos com certeza concluir que o homem é quem fala. Mas ele ao ser compelido a falar o que fala pela sua doença, descrita como possessão demoníaca, o que causa essas falas é tido como responsável, é repreendido e expulso.



Um incidente similar está registado em Marcos 1:23-26, onde mais uma vez uma troca de palavras parece ter lugar entre Jesus e um espírito impuro, mas o homem “possesso” é o que fala. Uma leitura cuidadosa torna isso claro:



“Não tardou que aparecesse na sinagoga um homem possesso de espírito imundo, o qual bradou: Que temos nós contigo, Jesus Nazareno? Vieste para perder-nos? Bem sei quem és: o Santo de Deus! Mas Jesus o repreendeu, dizendo: Cala-te e sai desse homem. Então, o espírito imundo, agitando-o violentamente e bradando em alta voz, saiu dele.”



Observe que Jesus diz ao demónio para se calar, embora seja o homem o que fala.



A Transferência dos Demónios para os Porcos



Se os demónios não são criaturas reais viventes, porque nos seria dito que os demónios foram transferidos para os porcos? A loucura do homem foi certamente transferida para os porcos, mas isto não prova que era literalmente causada por demónios, não mais que a lepra de Naamã se apegou a Geazi implique que a lepra era causada por demónios. Em ambos os casos, aqueles que foram curados foram recipientes da graça de Deus, e aqueles que sofreram foram os recipientes do desagrado de Deus. A impureza sem culpa do homem invocava misericórdia, mas a impureza consciente dos Gerasenos, que vendiam carne de porco, pedia retribuição.



Para evitar que a nossa busca de detalhes nos afastem demasiado do ponto principal, que seja reiterado aqui: a linguagem dos demónios é a linguagem da parábola. Isto faz parte do grande tema do Novo Testamento: o diabo e os seus anjos.

 

 

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O REINO DE SATANÁS

 

A parábola de Satanás é muito complexa. Embora tenhamos amplamente atravessado as Escrituras, especialmente no Novo Testamento, uma vasta área de território inexplorado está à nossa frente.

 

Ao discutirmos “O Diabo e os Seus Anjos” notamos que a passagem chave foi Mateus 12:26-28,e que o tema sugerido por estas Escrituras era: o reino de Satanás contra o reino de Deus. Eis aqui palavras reais:

 

Se Satanás expele a Satanás, dividido está contra si mesmo; como, pois, subsistirá o seu reino?

E, se eu expulso demônios por Belzebu, por quem os expulsam vossos filhos? Por isso, eles mesmos serão os vossos juízes. Se, porém, eu expulso demônios pelo Espírito de Deus, certamente é chegado o reino de Deus sobre vós.”



O Príncipe desde Mundo



João diz-nos que tudo o que existe no mundo é “a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida”. O mundo é controlado pela concupiscência humana. Na linguagem da parábola, o mundo é o reino de Satanás. Satanás é o príncipe do mundo.



Em João 12:31 o Senhor Jesus anuncia que o julgamento do mundo e a expulsão do príncipe do mundo estão eminentes: “Chegou o momento de ser julgado este mundo, e agora o seu príncipe será expulso.” João acrescenta esta explicação: “Isto dizia, significando de que género de morte estava para morrer.” Devemos então perguntar como é que a morte de Cristo é o julgamento do mundo e expulsão do príncipe do mundo. O contexto provê a explicação. O Senhor estava falando sobre a necessidade de auto abnegação, referindo-se ao “grão de trigo” que deve morrer antes de dar fruto. Tendo exortado outros a negarem-se a si mesmos, o Senhor intima que ele dentro em breve iria completar o seu programa de auto-repudiação pela crucificação. Este é o julgamento do mundo dos desejos humanos, que o afetava pessoalmente. É a final extinção do espírito humano que se rebela contra Deus. Basicamente, o pensamento é o mesmo que aquele em Hebreus 2:14, onde o Senhor Jesus é representado como destruindo o diabo ao vir com a nossa natureza débil e morrendo na cruz.



A extensão deste pensamento encontra-se em Apocalipse 12:11. Já vimos que Jesus, o homem, destruiu o diabo, que o afetava pessoalmente, através da sua morte. Agora notamos que aqueles que se identificaram com ele conquistaram o diabo no dia da sua associação com a morte do Senhor Jesus, pela própria morte deles. “Eles, pois, o venceram(o diabo) por causa do sangue do Cordeiro... e, mesmo em face da morte, não amaram a própria vida.”



O Acusador Acusado



Em João 16:7-11 o Senhor Jesus liga o julgamento do príncipe deste mundo com a vinda do Confortador. Isto é especialmente interessante. Já notamos anteriormente que o diabo e o Espírito Santo eram antagonistas. Agora observamos que ambos poderes são personificados neste contexto. O Confortador, ou Defensor, acusa o Príncipe deste mundo, que é o diabo, ou acusador. Assim o acusador é acusado; o conselho da acusação é convicto pelo conselho da defesa!



A Organização de Satanás



O reino de Satanás é poderoso e bem organizado. Ele tem servos e anjos; controla principados e poderes. Como cabe a um monarca, ele tem um trono: “Conheço o lugar em que habitas, onde está o trono de Satanás, e que conservas o meu nome e não negaste a minha fé, ainda nos dias de Antipas, minha testemunha, meu fiel, o qual foi morto entre vós, onde Satanás habita.” (Apocalipse 2:13). Satanás também tem uma religião, duas vezes referida nas cartas às igrejas da Ásia como “sinagoga de Satanás” (Apocalipse 2:9 e 3:9). A religião de Satanás é um falso Cristianismo muitas vezes confundido com o verdadeiro.



Judas e Pedro



Existe uma sequência impressiva de pensamentos tecidos na narrativa de Lucas 22. Primeiro é nos dito que Satanás entrou em Judas. Esta residência no intimo é sempre mutua. Se Satanás entra no coração de um homem, esse homem também entra no reino de Satanás. No que se refere a Judas, qualquer luta contra o pecado tinha terminado. O seu coração nem sequer estava dividido – Satanás tinha a possessão total.



Pedro era diferente. Embora ele não tenha reconhecido o facto, havia um conflito de lealdades no seu coração. Juntamente com os outros ele tinha sido ordenado vigiar e orar para não cair em tentação. A palavra vigiar realmente significa manter-se acordado. Ele tinha sido aconselhado para estar alerta para a possibilidade de se desenvolver uma situação que o faria render-se ao inimigo. Pedro já tinha chegado tão longe, no entanto, que até o aviso mais forte já não lhe servia de nada. Ele não sentia a necessidade da ajuda de Deus: ele sentia-se muito capaz de tomar conta de si mesmo. Satanás tinha se apossado de Judas, e estava tentando ganhar Pedro. “Simão, Simão, eis que Satanás vos reclamou... Eu, porém, roguei por ti...” (versículos 31,32). O Senhor orou por Pedro porque, Pedro ainda não se tinha rendido completamente ao inimigo. Quando existe uma rendição total, nem mesmo a oração do Filho de Deus pode fazer algo.



Assim como Judas, os sacerdotes tinham tomado a sua decisão, final e irrevogável, e Deus tinha-os entregue a Satanás. Daí as palavras: “Esta, porém, é a vossa hora e o poder das trevas.”



Satanás e Trevas



A ligação entre Satanás e as trevas é um estudo interessante. Sem prosseguir com detalhe este estudo agora, pode ser afirmado que um bom ponto de partida é Atos 26. Aqui Paulo explica ao Rei Agripa que o Senhor Jesus, que o confrontou na estrada para Damasco, fez dele ministro para converter os homens “das trevas para a luz e da potestade de Satanás para Deus” (versículo 18). Paulo refere-se a esta missão nas suas cartas aos Colossenses e Efésios. Ligações verbais a Atos 26 encontram-se em Efésios 1 e 2, e então Paulo leva o tema de Satanás/trevas até à famosa passagem da “armadura de Deus” de Efésios 6, que merece ser citada na sua totalidade:



“Quanto ao mais, sede fortalecidos no Senhor e na força do seu poder. Revesti-vos de toda a armadura de Deus, para poderdes ficar firmes contra as ciladas do diabo; porque a nossa luta não é contra o sangue e a carne, e sim contra os principados e potestades, contra os dominadores deste mundo tenebroso, contra as forças espirituais do mal, nas regiões celestes. Portanto, tomai toda a armadura de Deus, para que possais resistir no dia mau e, depois de terdes vencido tudo, permanecer inabaláveis. Estai, pois, firmes, cingindo-vos com a verdade e vestindo-vos da couraça da justiça. Calçai os pés com a preparação do evangelho da paz; embraçando sempre o escudo da fé, com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do Maligno. Tomai também o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a palavra de Deus” (versículos 10-17).



Porque esta passagem é citada com regularidade por aqueles que acreditam num diabo pessoal, alguns comentários talvez sejam necessários. O facto de que esta guerra não é uma guerra contra sangue e carne não é para ser entendido como uma indicação de que envolve uma hoste celestial sob a liderança de uma criatura espiritual monstruosa. O ponto é que, em vez disso, não é um combate físico, mas uma luta para manter os princípios divinos enfrentando forte oposição daqueles com autoridade. A expressão principados e potestades parece ser quase uma expressão técnica sobre aqueles com autoridade. Nem sempre é usada num mau sentido; e em Tito 3:1 Paulo na verdade instrui Tito a assegurar-se de que aquele sob a sua alçada “se sujeitem aos principados e potestades”(RC). Especialmente relevantes são as palavras de Efésios 3:10, onde Paulo ora que “pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus se torne conhecida, agora, dos principados e potestades nos lugares celestiais”. Paulo previu a possibilidade dos principados e potestades serem influenciados na direção da sabedoria através da igreja. Isto seria difícil de entender, como também a ordem em Tito de se sujeitarem, se os principados e potestades fossem seres espirituais sob a liderança de um diabo sobrenatural.



Os principados e potestades – aqueles em posições de autoridade – em Efésios 3 e 6 são descritos como ocupando lugares de alta posição ou celestiais. É sugerido aqui que isto implica não somente elevação, mas uma elevação espiritual ou eclesiástica, como aquela dos líderes dos Juedeus que tentaram travar o avanço do Cristianismo. Antecipando o ataque violento do poder das trevas antes da crucificação, o Senhor exortou os seus discípulos a vigiar e orar. É interessante notar que imediatamente depois da passagem sobre a total “armadura de Deus” em Efésios 6, Paulo diz: “com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito e para isto vigiando com toda perseverança e súplica por todos os santos.”



Entregar a Satanás



Foi feita a sugestão que a oração, “Não nos deixes cair em tentação”, significa, “Não nos coloques em circunstâncias nas quais os nossos desejos nos irão seduzir e desencaminhar”. As palavras que se seguem na oração do Pai Nosso são: “mas livra-nos do mal.” Esta é uma oração que Deus fará até mesmo mais do que isto: que Ele nos colocará na direção oposta, removendo-nos da cena da tentação. Não é suficiente não nos colocar em circunstâncias onde os nossos desejos nos farão tropeçar. Nos queremos que Ele nos leve para longe das circunstâncias onde os nosso desejos errados se afirmarão.



Uma tradução mais literal do Grego seria: “Livra-nos do mau.” A palavra mau aqui é um adjetivo. Gramaticamente, pode ser uma oração para livrar do mau ato, ou do maligno. Podem-se encontrar passagens para apoiar ambas as aplicações, e parece provável que ambos os pensamentos são intencionais. Nós queremos que Deus nos salve do mau ato que o maligno está nos tentando a cometer.



Deus nem sempre livra os homens do mau. Embora Ele nunca tente os homens a cometerem atos ímpios (os próprios desejos dos homens fazem isso), Ele algumas vezes abandona homens em tentação, e algumas vezes até coloca-os em circunstâncias nas quais os desejos errados deles irão tentá-los, e fazer com que tropecem. Isto não é livrar do mau: isto é entrar ao mau, ou entregar a Satanás. Duas passagem, ambas lidando com o tratamento de transgressores na comunidade de crentes, são relevantes aqui:



Eu, na verdade, ainda que ausente em pessoa, mas presente em espírito, já sentenciei, como se estivesse presente, que o autor de tal infâmia seja, em nome do Senhor Jesus, reunidos vós e o meu espírito, com o poder de Jesus, nosso Senhor, entregue a Satanás para a destruição da carne, a fim de que o espírito seja salvo no Dia do Senhor {Jesus}” (1 Coríntios 5:3-5).



“Mantendo fé e boa consciência, porquanto alguns, tendo rejeitado a boa consciência, vieram a naufragar na fé. E dentre esses se contam Himeneu e Alexandre, os quais entreguei a Satanás, para serem castigados, a fim de não mais blasfemarem” (1 Timóteo 1:19-20).



Alguns afirmam que veem na expressão, “entregues a Satanás”, uma ligação à história de Jó. Isto é uma sugestão intrigante que não será lidada aqui. No Novo Testamento, entregar a Satanás significa entregar um homem às consequências dos seus desejos errados. Este tema é exposto em Romanos 1. As seguintes breves citações servirão de lembrete:



“Por isso, Deus entregou tais homens à imundícia, pelas concupiscências de seu próprio coração, para desonrarem o seu corpo entre si” (versículo 24).



“Por causa disso, os entregou Deus a paixões infames” (versículo 26).



“E, por haverem desprezado o conhecimento de Deus, o próprio Deus os entregou a uma disposição mental reprovável, para praticarem coisas inconvenientes” (versículo 28).



Deus remove a Sua proteção benigna e deixa os homens colherem as consequências dos seus próprios desejos ímpios. Porque o pecado parece atrativo, as pessoas são atraídas para ele. Elas recusam ser avisadas contra os seus frutos amargos, por isso têm que aprender pela via mais dolorosa. Algumas vezes “entregar” é irrevogável, e o seu fim terrível é um aviso para outros que são tentados. Às vezes é um tipo de tratamento que chocará o discípulo instável e o fará tomar um novo sentido de responsabilidade.

 

(The Devil: The Great Deceiver por Peter Watkins, tradução para português: S.Mestre)

O DIABO - O GRANDE ENGANADOR (PARTE 4)

S. Mestre, 15.08.10

12

 

O DRAGÃO

 

O reino de Satanás não conhece limites. Onde quer que haja seres humanos afetados pelo pecado, Satanás reina. Existe verdade no máxima das Testemunhas de Jeová de que todos os governos humanos são do diabo. O erro deles é falhar em descobrir quem é o diabo.

 

Para divagar por um momento do nosso tema aqui. Porque a existência de um diabo pessoal deveria importar tanto para esta gente? Foi sugerido sem cinismo e com seriedade que, ele elevam o diabo quase a um nível de salvador. Ele alivia-os do grande fardo da culpa que de outra forma teriam de carregar. Se eles perderem o seu diabo então um grande fardo do pecado virá sobre as suas costas, pelo qual não podem escapar da culpa. Ao passo que o diabo das Escrituras é representado como um opressor, o diabo das Testemunhas é um que alivia os homens de uma responsabilidade opressiva, virtualmente tomando o lugar do Senhor Jesus, que disse, “Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei” (Mateus 11:28); e do qual Pedro disse “andou por toda parte, fazendo o bem e curando a todos os oprimidos do diabo” (Atos 10:38). Isto não é nenhuma caricatura da posição das Testemunhas. Quando discutindo a depravação da natureza humana com eles numa ocasião, foi-me dito que eu estava culpando em demasiado a natureza humana. O diabo é que devia ser culpado.

 

Rebelião Politica

 

Voltando ao nosso tema: embora todos os governos humanos sejam do diabo, alguns são mais diabólicos que outros. A natureza humana é basicamente desobediente, mas a rebelião humana torna-se evidente e relevante quando é realçada pelas coisas de Deus. No livro de Apocalipse, a nossa atenção é dirigida para um governo humano operando no mesmo ambiente que o povo de Deus. Inevitavelmente há hostilidade. O governo humano é chamado de “o dragão, a antiga serpente, que é o diabo, Satanás”.

 

O uso da palavra dragão provê uma dica útil. Os outros nomes, antiga serpente, que é o diabo, Satanás, convêm uma impressão da magnitude e universalidade deste símbolo de desejos contrários a Deus. Eles quase que nos convidam a ver este monstro como um símbolo do pecado em todas as suas manifestações. Existe um sentido no qual esta conclusão é a correta, mas também temos que tomar em consideração o facto de que nas Escrituras os animais/bestas são símbolos de governantes humanos, como aprendemos de Daniel 7, onde 4 animais são explicados como “reis”. O homem foi eleito para ter domínio, no final de contas, sobre os animais do campo, e no mesmo capítulo, “um como o Filho do Homem” – um herdeiro da herança humana – toma possessão do reino que até esse ponto tinha sido controlado pelos animais/bestas-reis.

 

Aqui não nos preocuparemos demasiado com o problema da identidade do poder do pecado militante de Apocalipse 12. É suficiente dizer que as sete cabeças do dragão representam diferentes fases de governo, e são para ser vistas como uma série. O dragão não é um monstro de sete cabeças em nenhum momento de tempo. Só vemos as sete cabeças juntas quando vemos este poder do pecado “panoramicamente”. Em termos gerais, vemos aqui um símbolo do pecado politicamente organizado num contexto espiritual, um poder que se opõe ao povo de Deus. Primeiro, vemo-lo no seu todo, em toda a sua manifestação; depois, quando chegamos à “ação” de Apocalipse 12, temos que determinar com exatidão o tempo da ação.

 

Os movimento do poder-dragão no drama do Apocalipse são descritos nos capítulos 12 e 20. Existem cinco fases na história do dragão:

 

  1. No céu

  2. Jogado para a terra

  3. Acorrentado e preso no abismo

  4. Liberto do abismo

  5. Jogado no lago de fogo.

 

A dragão ao ser apreso por mil anos é uma boa maneira de representar, simbolicamente, a restrição de atividades políticas de todos os povos do mundo. O período de mil anos – quer seja tomado literalmente ou não – corresponde apropriadamente aos mil anos em que os abençoados, que tiveram parte na primeira ressurreição, viverão e reinarão com Cristo. No final dos mil anos, o poder ímpio será permitido afirmar-se por um curto espaço de tempo. Inevitavelmente a natureza humana revela a sua impiedade potencial. Dá-se uma rebelião, guerra e a extinção no lago de fogo. O lago de fogo, também descrito como a segunda morte, simboliza a destruição final e absoluta de todos os desejos humanos rebeldes. Deus será tudo em todos.

 

13

 

TU ÉS O HOMEM”

 

O tema do diabo é uma parábola contínua no Novo Testamento sobre a natureza humana atacada pelo pecado. Mas porquê, seria perguntado, o Espírito achou necessário apresentar-nos este assunto como uma parábola?

 

Como outras parábolas, a parábola do diabo cumpre um duplo propósito. Ela revela e esconde. Aos perspicazes ela provê informação vital acerca do pecado. Permite-lhes verem-se a si mesmos como realmente são. Uma coisa é dizer aos homens que eles são pecadores; é completamente diferente fazer-lhes entender a dura realidade da sua própria condição miserável. Um tratamento de choque é necessário. Nós vemos o monstro horrível exposto à nossa frente, e trememos à vista da sua falsidade, crueldade e malvadez. E então a temida verdade cai sobre nós. Isto é uma imagem de mim mesmo! Encontramo-nos na mesma posição que David, quando a parábola da cordeirinha lhe é interpretada. Lembre-se como, depois de declarar duramente que o cruel, homem rico deveria morrer, ele ouve as terríveis palavras, “tu és o homem” (2 Samuel 12).

 

O que é revelado ao servos de Deus é escondido dos do mundo. Eles já têm uma alta opinião sobre si mesmos. Já são adeptos em culpar pessoas e as circunstâncias pelas suas faltas e erros. As Escrituras são um espelho que reflete a natureza humana em toda a sua fealdade. Estas pessoas olham no espelho, vêm o seu próprio reflexo, e falham em reconhecerem-se a si mesmos. “Ele é que é o culpado, não eu”, dizem eles, ao deixarem contentes para trás a sua imagem. “O diabo é responsável por todos os problemas e maldade.” Olhos eles têm, mas não vêm.

 

Quão trágica é a cegueira espiritual! Deus só salva aqueles que se vêm como realmente são – aqueles que se vêm como Deus os vê – e a maioria das pessoas recusam-se completamente a encarar a sua própria desdita.

 

Nudez Espiritual

 

Esta tendência humana de esconder a fraqueza e a maldade e fingir que não existem começou no Éden, imediatamente depois da transgressão. Pondere sobre o facto de que a árvore proibida era a árvore do conhecimento do bem e do mal. Este mesmo facto demonstra a misericórdia de Deus. Ao passo que o ato faria do homem um pecador, o efeito de comer este fruto especial permitiria ao pecador ver a gravidade da sua situação, sem a qual a salvação não poderia ser efetuada.

 

Quando Adão e Eva pecaram, as consequências da sua transgressão foram-lhes reveladas. Os seus olhos se abriram e ele souberam que estavam nus. Isto era uma condição tanto espiritual como física. Mera roupa não era suficiente. Adão e Eva tinham que aprender isto pelo caminho árduo. O que eles fizeram foi fazer coberturas para a sua nudez física; e em tendo feito isto ficaram contentes por algum tempo.

 

Ficaram contentes até que ouviram a voz do Senhor Deus, andando pelo jardim. Não foi necessário Deus condená-los. Cientes da presença do Juiz, eles julgaram-se a si mesmos como nunca tinham feito antes. Olharam para si mesmos como o Juiz o iria fazer, e eles não mais estavam contentes. As cobertas de folha de figueira não eram adequadas, e procuraram mais cobertura entre as árvores do jardim. Embora agora estivessem duplamente cobertos, eles continuavam nus aos seus próprios olhos e aos olhos de Deus. Quando Adão confessou a sua nudez, Deus proveu uma cobertura adequada.

 

Existe nisto uma grande lição para nós. Como os nossos primeiros pais, nós tendemos a cobrir a nossa culpa em vez de confessá-la abertamente, primeiro a nós mesmos e depois a Deus. Como eles, nós adotamos a atitude “longe da vista, longe do coração” para a nossa condição miserável. Se conseguirmos manter uma certa aparência, ficamos satisfeitos. Ao enganarmos os outros, nos enganamos a nós mesmos, e o que não se vê não existe.

 

Adão caiu em si ao ficar de repente ciente da presença de Deus; e as consciências de outros seres humanos são “alertadas” da mesma maneira. Até homens dignos como Isaías, Ezequiel, Daniel e João sentiam-se dominados pela imperfeição quando confrontados por anjos ou visões de Deus. Na escala humana estes eram homens bons: no entanto sentiam-se pequenos quando viam as coisas na verdadeira perspetiva. Quanto mais imperfeitos devem se sentir os pequenos rebeldes quando se apercebem que o Juiz está perto. Na sua situação limite dizem à montanhas e rochas, “Caí sobre nós e escondei-nos da face daquele que se assenta no trono e da ira do Cordeiro, porque chegou o grande Dia da ira deles; e quem é que pode suster-se?” (Apocalipse 6:16,17).

 

O Juiz está sempre perto. Para nos relembrar, e manter-nos lembrados deste facto, provê-nos com o incentivo para julgarmos a nós mesmos: “Porque, se nos julgássemos a nós mesmos, não seríamos julgados” (1 Coríntios 11:31).

 

Confissão e Perdão

 

Inevitavelmente estes pensamos trazem-nos até o Salmo 32:

 

Bem-aventurado aquele cuja iniquidade é perdoada, cujo pecado é coberto. Bem-aventurado o homem a quem o SENHOR não atribui iniquidade e em cujo espírito não há dolo. Enquanto calei os meus pecados, envelheceram os meus ossos pelos meus constantes gemidos todo o dia. Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em sequidão de estio. Confessei-te o meu pecado e a minha iniquidade não mais ocultei. Disse: confessarei ao SENHOR as minhas transgressões; e tu perdoaste a iniquidade do meu pecado. Sendo assim, todo homem piedoso te fará súplicas em tempo de poder encontrar-te. Com efeito, quando transbordarem muitas águas, não o atingirão. Tu és o meu esconderijo; tu me preservas da tribulação e me cercas de alegres cantos de livramento” (versículos 1-7).

 

 

O homem cujo pecado é coberto fica contente: mas a cobertura deve ser provida por Deus, e não pelo próprio homem. Longe de cobrir o seu próprio pecado, o homem deve reconhecê-lo, pois quando um homem revela o seu pecado, Deus cobre-o, e a mancha da culpa é completamente removida. E assim o Salmista dá a sua lição. Homens crentes devem confessar os seus pecados agora, quando Deus está acessível. Em vez de se esconderem de Deus, como Adão, eles encontram o seu esconderijo em Deus.

 

David sabia tudo isto. Houve um período negro em sua vida em que ele “calou” (versículo 3). A sua própria miséria e a mão pesada de Deus sobre ele fez da sua vida um fardo. Então veio o alívio. David quebrou o seu silêncio, confessou o seu pecado – e Deus perdoou.

 

O Salmo 51 revela a profundidade da sua penitência. Com um coração despedaçado com tristeza e faz a sua confissão a Deus, e roga por misericórdia.

 

Compadece-te de mim, ó Deus, segundo a tua benignidade; e, segundo a multidão das tuas misericórdias, apaga as minhas transgressões. Lava-me completamente da minha iniqüidade e purifica-me do meu pecado. Pois eu conheço as minhas transgressões, e o meu pecado está sempre diante de mim... Purifica-me com hissopo, e ficarei limpo; lava-me, e ficarei mais alvo que a neve.

Faze-me ouvir júbilo e alegria, para que exultem os ossos que esmagaste. Esconde o rosto dos meus pecados e apaga todas as minhas iniquidades. Cria em mim, ó Deus, um coração puro e renova dentro de mim um espírito inabalável. Não me repulses da tua presença, nem me retires o teu Santo Espírito” (versículos 1-3; 7-11).



Tudo isto foi registado em misericórdia, para que possamos também chegar até Deus e confessar os nossos pecados, e receber o perdão. Se repudiarmos as nossas transgressões, estamos em nossos corações, concordando com Deus que disse que estas coisas não são para se fazer. Embora, em fraqueza, pecamos, o nosso coração está correto para com Deus. Nas palavras de Paulo, “Neste caso, quem faz isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim” (Romanos 7:17). Se pecamos a despeito de nós mesmos, e não por causa de nós mesmos, Deus pode sem ser inconsistente cumprir o desejo de nossos corações, e fazer-nos justos.



Faltas Ocultas



É importante então que vejamos realmente como somos. O perdão está dependente da confissão a Deus; e só podemos confessar o que sabemos. Isto levanta um problema. Mesmo se examinarmos a nós mesmos, devem haver alguns pecados, que no momento, não reconhecemos. Não podemos confessar esses pecados. O Salmista falou disto faz muito tempo, e duas passagens são especialmente relevantes:



Além disso, por eles(mandamentos de Deus) se admoesta o teu servo; em os guardar, há grande recompensa. Quem há que possa discernir as próprias faltas? Absolve-me das que me são ocultas. Também da soberba guarda o teu servo, que ela não me domine; então, serei irrepreensível e ficarei livre de grande transgressão” (Salmo 19:11-13).



Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração, prova-me e conhece os meus pensamentos; vê se há em mim algum caminho mau e guia-me pelo caminho eterno” (Salmo 139:23,24).



Ao confessarmos os pecados que reconhecemos; ao reconhecermos que podem existir outros pecados que não descobrimos em nós mesmos; ao termos um comportamento contrito e pedirmos a Deus que nos limpe das nossas faltas ocultas: através disto podemos nos colocar nas mãos de Deus e ser mantidos no caminho da retidão.



Inculpáveis e Irrepreensíveis”



Isto significa que a retidão que recebemos no batismo, quando todos os nossos pecados do passado foram lavados, pode ser mantida, através da vida, até ao julgamento. Tão importante é esta negligenciada verdade que vale a pena citar algumas evidências das Escrituras:



“Bendito o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, que nos tem abençoado com toda sorte de bênção espiritual nas regiões celestiais em Cristo, assim como nos escolheu nele antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor” (Efésios 1:3,4).



A palavra a tomar em conta é: “irrepreensíveis”. A próxima citação tem a sua mensagem bem clara e não é necessário comentário algum:



“E a vós outros também que, outrora, éreis estranhos e inimigos no entendimento pelas vossas obras malignas, agora, porém, vos reconciliou no corpo da sua carne, mediante a sua morte, para apresentar-vos perante ele santos, inculpáveis e irrepreensíveis” (Colossenses 1:21,22)



E finalmente:



“Ora, àquele que é poderoso para vos guardar de tropeços e para vos apresentar com exultação, imaculados diante da sua glória” (Judas 24).



Consciência



Se isto é para ser o nosso quinhão, uma coisa é essencial. A lei de Deus deve estar gravada nos nossos corações. Aprendemos de Romanos 2 que quando a lei está escrita nos corações da pessoas “servem eles de lei para si mesmos” (versículo 14). Isto significa que a lei faz parte delas; elas são a lei de Deus incorporada. Se eles causarem ofensa, eles não somente ofendem o Dador da lei, mas a si mesmos, porque a lei faz parte deles. Assim vem o trabalho da consciência, e os pensamentos daqueles que carregam a lei de Deus nos seus corações são acusados ou defendidos. (versículo 15).



Existem assim dois juízes para as nossas ações. A nossa consciência é o juiz imediato, e Deus é o derradeiro Juiz. Se a lei de Deus está realmente inscrita nos nossos corações, então o juiz imediato pode dizer-nos e o derradeiro Juiz irá ilibar-nos ou condenar-nos.



Na prática, isto significa que temos que nos dedicar ao estudo das Escrituras. A leitura bíblica deve estar bem alto na nossa lista de prioridades. Como o Salmista devemos poder dizer, “Quanto amo a tua lei! É a minha meditação, todo o dia!” (Salmo 119:97).



14

 

O ACUSADOR”



Ho diabolos o diabo – é um título que significa O Acusador. O nosso propósito agora é explicar porque o grande tentador do homem deve ter tal título. De que maneira os desejos humanos que incitam o homem à rebelião contra Deus acusam o homem?



Primeiro, lembremo-nos do facto de que existem várias Escrituras que retratam o diabo como alguém que acusa. A passagem que vem imediatamente à mente é Apocalipse 12:10. O diabo aqui é descrito como “o acusador de nossos irmãos... que os acusa de dia e de noite, diante do nosso Deus.”



Menos direta, mas não menos relevante, são as passagens onde aparece “Satanás” em Jó e Zacarias. Já vimos que no Novo Testamento, Satanás não é um adversário, mas o adversário: por outras palavras, o diabo. Já notamos também que em dois locais no Antigo Testamento o uso da palavra no Novo Testamento é antecipado. Quão interessante então observar que em ambos estes lugares, Satanás age como um acusador, ou diabo. O papel de acusador do Satanás de Jó é bem conhecido e não precisa aqui do apoio de citações. Este e o Satanás de Zacarias já foram discutidos no Capítulo 6.



Um acusador, não é um juiz. A função dum acusador é convencer o juiz de que a pessoas que está a ser julgada é digna de ser punida. O acusador não tem o poder de punir: isso é da alçada do juiz.



Deus é o juiz que determina uma vez por todas o destino dos homens, e que castiga quando necessário. Se Deus “justifica” um homem, então efetivamente ninguém pode condená-lo. “Se Deus é por nós, quem será contra nós?” Se estivermos em paz com Deus, os nossos inimigos não têm qualquer poder para nos atingir. Foi por esta razão que o Senhor Jesus disse, “Digo-vos, pois, amigos meus: não temais os que matam o corpo e, depois disso, nada mais podem fazer. Eu, porém, vos mostrarei a quem deveis temer: temei aquele que, depois de matar, tem poder para lançar no inferno. Sim, digo-vos, a esse deveis temer” (Lucas 12:4,5). Os nossos inimigos podem nos perseguir fisicamente, mas um verdadeiro crente é encorajado a ver isso como uma “leve tribulação” que “produz para nós eterno peso de glória, acima de toda comparação” (2 Coríntios 4:17). A perseguição pode mesmo ser uma bênção. Pode fazer-nos apreciar os valores espirituais, e pode trazer-nos mais perto de Deus. A perseguição só é perigosa se nos fizer cair no dia da adversidade é esquecermos a amizade de Deus.



Inimigos Reais



Isto traz-nos até um pensamento importante. Já que os nossos inimigos não têm qualquer poder para nos atingir se estamos em paz com Deus, a única maneira em que eles podem ter sucesso nos seus maus propósitos é induzir-nos a transgredir as leis de Deus. Se a perseguição faz um discípulo tropeçar, a acusação é um inimigo realmente. Se, no entanto, a perseguição provê um incentivo para um serviço mais fiel, a acusação, apesar das suas intenções hostis, não é um inimigo real. Os nossos inimigos reais são normalmente muito mais sutis. Eles aproximam-se com o disfarce de amigos; eles maquinam maneiras de mostrar o pecado como algo atrativo, ou até virtuoso, e pela sua artimanha persuadem-nos a sermos pecadores e inimigos de Deus. Então Deus nos castiga.



O Derradeiro Inimigo



O inimigo mais perigoso está sempre connosco. As suas oportunidades para nos tentar a ignorar as leis de Deus são ilimitadas. Ele aperfeiçoou a arte de persuadir-nos que alguns modos errados de pensar e agir não são ofensivos para Deus, e que são para vantagem nossa. Este inimigo tem prevalecido sobre nós através da artimanha tantas vezes que nem podemos contá-las: no entanto ainda o tratamos com respeito que só pode ser descrito como único. Embora ele invariavelmente se aproxime de nós como um amigo, é ele que dá a Deus a justa causa de nos condenar. Ele é, de facto, aquele que nos acusa perante Deus. Realmente, o seu nome é ho diabolos, O Acusador. Dito em linguagem literal, é porque permitimos que sejamos arrastados pelas nossas concupiscências que nos tornamos inimigos de Deus, e a Sua ira desce sobre nós. Em linguagem moderna, somos condenados pelos nossos desejos errados.



A Serpente – Um Acusador



Já discutimos o relacionamento entre a serpente e o diabo. Contrário à ideia popular, o diabo não virou serpente, mas a serpente virou diabo. A serpente no Éden é o protótipo do que incita o homem à rebelião contra Deus. Não é de surpreender então descobrir que a serpente do Éden foi o primeiro acusador.



Foi a serpente que deu a Deus a razão para condenar o homem à morte. A serpente induziu o homem a desobedecer à lei de Deus, e então a ira de Deus caiu sobre ele. Se a serpente tivesse desejado causar diretamente mal ao homem, ela não teria sucedido. O homem desfrutava da bênção e proteção de Deus no Jardim do Éden. O homem estava bastante seguro a não ser que ofendesse Deus. Se ele ofendesse Deus então nada poderia protegê-lo. Qualquer que fosse então o motivo da serpente, ela pode ser vista como uma criatura que acusou o homem perante Deus.



A questão dos motivos da serpente não afeta a tese principal, e não é obviamente um assunto para dogmatismo. A serpente, é, em qualquer evento, para ser vista como a que apresentou a Deus a razão para condenar o homem. Era um acusador. Mais uma vez pensamos sobre as palavras de Apocalipse 12 acerca da “antiga serpente, que é o diabo, Satanás”. É “o acusador de nossos irmãos... que os acusa de dia e de noite, diante do nosso Deus”. A frase “antiga serpente” é usada para levar nossas mentes até ao Éden. Sugere, de facto, que este poder hostil tem o mesmo papel que a serpente – quer deliberadamente ou involuntariamente – no Éden.



Quão irónico que, depois da transgressão, o homem tornou-se o seu próprio acusador! Somos lembrados de um ditado antigo, “Uma consciência culpada não precisa de condenação”. Quando Adão e Eva ouviram a voz do Senhor Deus eles se esconderam. Deus ainda não os tinha condenado: eles condenaram-se a si mesmos. Primeiro condenaram-se ao se esconderem, e depois por confessarem a sua nudez, apesar da dupla cobertura de folhas de figueira e das árvores.



As Escrituras dão-nos um número de exemplos de pessoas que agem de uma maneira diabólica, ou acusadora ao trazerem o julgamento de Deus sobre outras. Balaão achou impossível amaldiçoar o povo que Deus tinha abençoado. Mas ele não se sentiu derrotado. He podia, e tentou o povo a pecar contra Deus e sofrer a Sua ira. Jereboão o filho de Nebate era ele próprio um transgressor: mas ele nos é apresentado na Bíblia como o homem “que tinha feito pecar a Israel”. E ainda mais uma vez pensamos sobre Satanás em Jó, a quem Deus disse, “Ele conserva a sua integridade, embora me incitasses contra ele, para o consumir sem causa”.



Finalmente pensamos dum exemplo no Novo Testamento: Elimas o mágico. Quando Barnabás e Saulo estavam tentando persuadir o procônsul de Pafos a fazer as pazes com Deus, Elimas estava tentando-o a ser inimigo de Deus. Se ele tivesse tido sucesso, ele de facto teria convidado Deus a punir este homem. Daí a severidade da condenação: “Ó filho do diabo, cheio de todo o engano e de toda a malícia, inimigo de toda a justiça, não cessarás de perverter os retos caminhos do Senhor?” (Atos 13:10).



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O ENSINO BÍBLICO

SOBRE A NATUREZA HUMANA

 

 

O Poder do Pecado

 

Façamos uma pequena pausa para nos relembrarmos do que a Bíblia diz acerca da natureza humana. Repetidamente, e com grande ênfase, as Escrituras nos dizem que a tendência para pecar é forte no homem. As seguintes passagens são típicas:

 

Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?” (Jeremias 17:9)

 

Porque de dentro, do coração dos homens, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, as malícias, o dolo, a lascívia, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura. Ora, todos estes males vêm de dentro e contaminam o homem” (Marcos 7:21-23).

 

“Como está escrito:

Não há justo, nem um sequer,

não há quem entenda, não há quem busque a Deus;

todos se extraviaram, à uma se fizeram inúteis;

não há quem faça o bem, não há nem um sequer.

A garganta deles é sepulcro aberto;

com a língua, urdem engano,

veneno de víbora está nos seus lábios,

a boca, eles a têm cheia de maldição e de amargura;

são os seus pés velozes para derramar sangue,

nos seus caminhos, há destruição e miséria;

desconheceram o caminho da paz.

Não há temor de Deus diante de seus olhos” (Romanos 3:10-18).



Mesmo se as Escrituras não tivessem estas afirmações claras, o facto da tendência humana para pecar poderia ser deduzido a partir da história bíblica. O homem é apresentado como um rebelde. Vez após vez ele demonstra a iniquidade da sua natureza. Toda a história humana, quer sejam os que viveram antes do dilúvio, os Judeus ou Gentios, é uma história de rebelião contra Deus.



Numa passagem comovente em Romanos 7, Paulo fala da luta que um homem justo tem para cumprir as leis justas de Deus. Tão feroz é a luta que ele foi levado a exclamar, “Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” O facto de que um amante da retidão tem que lutar o que, sem a ajuda de Deus, seria uma batalha perdida contra a suas próprias tendências pecaminosas, dá-nos alguma ideia da imensa força gravitacional do pecado.



Nesta passagem esclarecedora, aparecem as seguintes palavras:



“Porque nem mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que prefiro, e sim o que detesto. Ora, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. Neste caso, quem faz isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim. Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem está em mim; não, porém, o efetuá-lo” (versículos 15-18).



Será que podemos entender a realidade da situação? Suponha que perguntamos duas questões, e damos a resposta, a partir destes versículos:



O que habita no homem?

Resposta: Pecado. (“... o pecado que habita em mim.”)



O que não habita no homem?



Resposta: Bem nenhum. (“ eu sei que em mim... na minha carne, não habita bem nenhum”



O Engano do Pecado



Um dos grandes propósitos da Lei de Moisés era permitir aos homens verem claramente a sua própria condição de pecadores, para que pudessem apreciar a sua necessidade desesperante da salvação. A salvação só é possível quando as pessoas reconhecem a sua desventura; e no entanto a maioria das pessoas têm uma grande relutância em admitir que são pecadores. Isto e assim porque – referindo novamente a Jeremias 17:9 – o coração, para além de ser “desesperadamente corrupto” é “enganoso... mais do que todas as coisa”. Ironicamente, o engano de cada coração humano é contra si próprio. Embora toda a evidência aponte no outro sentido, o homem é enganado a supor que é justo. A deceção é ainda mais surpreendente porque o homem é o seu próprio enganador.



Mesmo aqueles que professam acreditar que a natureza humana é má, tendem a exluir-se desta avaliação. Desde a infância as bocas das pessoas se abrem em auto-justificação. Como o escritor de Provérbios diz, “Todo caminho do homem é reto aos seus próprios olhos” (21:2). É por isso que as pessoas amargamente se ressentem com críticas, não importa o quão justas, não importa a boa intenção , não importa com que gentileza forem apresentadas. Quando Deus, através de Malaquias, condena os sacerdotes e o povo pelos seus pecados, a resposta inevitável foi um arrogante desmentido da acusação. “Em que ofendemos?” perguntaram eles. Onde e quando fizeram isso de que eram acusados? E assim tem sido sempre.

Já foi feita menção ao grande propósito da Lei de Moisés: permitir aos homens ver claramente a sua condição de pecadores. Ao dar a Lei aos Israelitas, Deus tomou o desafio humano. Este filhos de Abraão pensavam que eram bons. Deus sabia que não o eram. Então Deus convidou-os a provar a sua bondade ao guardarem a Sua Lei. Embora eles tenham dito, “Tudo o que o SENHOR falou faremos”, eles falharam. Aquelas bocas que se abriram bem em auto-justificação foram eficazmente fechadas. Paulo expressa isso assim:



“Ora, sabemos que tudo o que a lei diz, aos que vivem na lei o diz para que se cale toda boca, e todo o mundo seja culpável perante Deus” (Romanos 3:19).



Aqueles que dizem que os seres humanos são “assim tão maus”; aqueles que descrevem a nossa natureza como “neutra”; aqueles que, ignorando a história da Queda, afirmam que o homem não pode ser iníquo porque Deus o criou : todos estes, ao falharem e não aprenderem a lição sobre a iniquidade humana, estão demonstrando quão enganoso é o coração humano.



A Carne



A palavra carne é frequentemente usada no Novo Testamento para descrever aquele elemento humano que se rebela contra as leis de Deus. Por isso Paulo diz:



Digo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne. Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer” (Gálatas 5:16, 17).



Alguns têm sido picuinhas sobre a adequação desta palavra carne, e têm questionado a justiça da acusação, aparentemente esquecendo que é o Espírito de Deus que usa a palavra desta forma.



Realmente, bem de pressa se torna aparente que as Escrituras representam a carne como aquilo que é diretamente oposto ao Espírito de Deus. Este pensamento é expresso na passagem de Gálatas 5; e existem outras expressões do mesmo pensamento. Por exemplo:



“O espírito é o que vivifica; a carne para nada aproveita; as palavras que eu vos tenho dito são espírito e são vida” (João 6:63).



“Porque, se viverdes segundo a carne, caminhais para a morte; mas, se, pelo Espírito, mortificardes os feitos do corpo, certamente, vivereis” (Romanos 8:13).



Já vimos que a natureza humana é hostil às leis de Deus. Também vimos que a palavra carne é usada para descrever este elemento rebelde no homem – especialmente quando expressa a sua oposição ao Espírito de Deus. Algumas vezes a tendências ofensivas são chamadas, mais precisamente, de concupiscências (ou desejos) da carne. E, como vimos em Romanos 7, a palavra pecado é algumas vezes usada para descrever, não somente atos de transgressão contra a lei de Deus, mas também aquela tendência no homem que se manifesta a si mesma nestes atos ímpios.



Carne, concupiscências, pecado: estas e outras expressões são aplicadas a esta desregramento que caracteriza a natureza humana: mas podemos ainda indagar onde no homem definitivamente reside esta tendência ofensiva. Ou, colocando a questão de outra forma: Qual é a quinta-essência do pecado?





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TENTAÇÃO

 

Já foi apontado no capítulo anterior que a palavra carne é usada para descrever aquilo que se rebela contra as leis de Deus. Mas o que carne significa realmente neste contexto? É uma palavra para se tomar literalmente? É a carne-tecido humano a coisa básica do pecado? Implica um diferença entre a carne e outras substâncias do corpo? Devemos ver aquelas partes carnudas do corpo como sendo aquelas onde residem as tendências rebeldes? Ou devemos supor porque a maioria da substância do corpo é carne, a palavra é uma figura apropriada para o homem inteiro, ou para a humanidade como um todo?(Isto seria um exemplo da figura de estilo(linguagem) chamada sinédoque).

 

Um número de passagens vêm à mente. “O que é nascido da carne é carne”; “Jesus Cristo veio em carne”; “nos dias da sua carne, tendo oferecido, com forte clamor e lágrimas, orações e súplicas...” Tais Escrituras como estas indicam bastante claramente que a carne é uma expressão bíblica para o homem completo, ou para a natureza humana em geral.

 

Assim quando Paulo fala da carne militando contra o espírito, e o espírito contra a carne, e não está indicando precisamente onde, no homem, as obras da iniquidade são produzidas. Ele está dizendo, sim, que os desejos errados são uma característica da natureza do homem.

 

O Verdadeiro Tentador

 

Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta. Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz. Então, a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte” (Tiago 1:13-15).

 

Estas palavras de Tiago são instrutivas. Primeiro dizem-nos quem não tenta o homem: Deus. Alguns têm problemas com afirmações como, “...depois destas coisas... tentou Deus a Abraão”. Não existe um problema real aqui. Tiago está preocupado com a tentação no sentido de induzir a pecar. Ele está dizendo que Deus, Ele próprio, não pode ser induzido a pecar, também não induz o homem a pecar. O que realmente faz do homem um pecador é a sua própria resposta aos seus próprios desejos.

 

Uma questão aqui. Deus repudia as sugestões de que Ele induz o homem a pecar: mas Ele às vezes leva pessoas injustas a circunstâncias onde os desejos maus as atraem e fazem-nas pecar? Seguindo isto, quando oramos, “Não nos induzas à tentação”(RC), estamos a pedir a Deus para controlar as nossas circunstâncias para que não sejamos desviados pelas nossas próprias concupiscências e sejamos seduzidos por elas?

 

A propósito, Tiago dá-nos aqui uma excelente razão para não crer num diabo pessoal. É argumentado a partir de silêncio: mas o silêncio é eloquente. Tiago está discutindo a questão da tentação. A sugestão que Deus tenta os homens é refutada. Deus não tem o papel de um tentador “exterior”. Se no entanto existisse um outro tentador “externo” chamado diabo, este certamente seria o local para dizê-lo. Mas em vez de falar de uma poderosa personalidade maligna, sempre pronta a causar a queda do homem, Tiago diz que a tentação vem dos próprios desejos errados(concupiscências) do homem.

 

Resistindo ao Diabo

 

Vejamos agora Tiago 4. As palavra cobiçar, invejar, prazeres ocorrem na abertura deste capítulo:

 

De onde procedem guerras e contendas que há entre vós? De onde, senão dos prazeres que militam na vossa carne? Cobiçais e nada tendes; matais, e invejais, e nada podeis obter; viveis a lutar e a fazer guerras. Nada tendes, porque não pedis; pedis e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em vossos prazeres” (versículos 1-3).



Os desejos humanos são uma força poderosa. Tornam o homem hostil para com os outros e ofensivos a Deus. No versículo 4 Tiago usa uma palavra abrangente para descrever todos os maus desejos: chama-lhes “o mundo”. Relembramo-nos imediatamente da afirmação de João que “tudo que há no mundo, a concupiscência da carne, a concupiscência dos olhos e a soberba da vida, não procede do Pai, mas procede do mundo” (1 João 2:16).



Voltando a Tiago 4, existem dois poderes mutuamente hostis procurando ganhar o homem para si. Um poder é Deus; o outro é o mundo – ou desejos errados humanos. “Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus” Este ponto é apresentado nitidamente no versículo 7:



“Sujeitai-vos, portanto, a Deus; mas resisti ao diabo, e ele fugirá de vós.”



O uso da palavra diabo nesta passagem parece surpreendente? Tiago tem estado a falar das concupiscências humanas, ou do “mundo”. Obviamente a palavra diabo representa as concupiscências humanas. O contexto exige isso. A intrusão de um monstro sobrenatural neste ponto seria irrelevante e uma distração, mesmo se tal ser existisse.



Se alguém deseja ser contencioso, o assunto é definitivamente decidido no versículo 8, onde Tiago expressa o mesmo pensamento, mas em termos diferentes. Correspondendo às palavras “ Sujeitai-vos, portanto, a Deus”, está, “Chegai-vos a Deus...”; correspondendo a “resisti ao diabo...” está, “Purificai as mãos, pecadores; e vós que sois de ânimo dobre, limpai o coração”.



Definições



Até este ponto, na nossa busca de uma definição para diabo, prosseguimos tentativamente . Tiago agora trouxe-nos ao ponto em que podemos ser mais dogmáticos. O diabo na Bíblia representa aqueles desejos humanos que entram em conflito com a lei de Deus.



Até isto não esgota o significado da expressão. A própria pessoas que satisfaz estes desejos ímpios fica aprisionada por eles e é chamada também de diabo. Satanás entrou no coração de Judas Iscariotes, e Judas foi chamado de diabo.



Desejos Humanos



Os desejos humanos entram necessariamente em conflito com a lei de Deus? Quase que não precisa ser mencionado que os desejos básicos dos homens não são, em si mesmos, maus. Seres humanos normais têm um número de necessidades físicas e emocionais inatas. Mencionando duas: apetite de comida, e apetite sexual. Estes apetites foram divinamente implantados , e o seu propósito é óbvio. Foram criados para assegurar a sobrevivência do indivíduo e da espécie respetivamente, enquanto que provêm uma medida de felicidade presente. A gratificação dos apetites humanos não constituem em si pecado. O homem torna-se num ofendedor quando são desrespeitadas as leis de Deus, e estes desejos são explorados pelos ego.



Isto precisa de ser qualificado. O facto é que os desejos humanos são quase sempre explorados pelo ego. É a atitude egoísta do homem centrada no seus próprios desejos que causa o problema. Quando o homem foi criado, a intenção era que ele vivesse em íntima comunhão com o seu Criador. Onde o sucesso da vida dos outros animais depende à obediência dos instintos implantados neles, o sucesso da vida humana depende de estar centrada em Deus. Quando, no entanto, Adão e Eva agiram em desobediência à lei de Deus, o equilíbrio perdeu-se. O homem tornou-se centrado em si mesmo em vez de centrado em Deus. O resultado tem sido uma exploração total dos desejos humanos para o benefício imaginado do ego, e as consequências têm sido desastrosas.



Quando os desejos humanos são explorados, hábitos ruinosos de pensamento e de ação são formados. Esses desejos inatos que têm sido explorados pelo ego tornam-se por sua vez exploradores do ego. Tornam-se imperiosos nas suas exigências; tornam-se insaciáveis. Conduzem à corrupção moral e física, e por fim destroem a pessoa que pensava que eles provinham a chave para a felicidade. Este é o padrão normal para os humanos. Pedro diz-nos que a corrupção está no mundo através da paixões que existem no mundo (2 Pedro 1:4); e Paulo diz que Deus entregou os homens à imundícia através das concupiscências dos seus corações (Romanos 1:24). E assim, de acordo com o padrão adâmico, o homem começa por abusar das suas tendências inatas, e rapidamente vira a vítima destas tendências. Referência já foi feita a duas necessidades básicas humanas, embora sem qualquer mal em si, tornam-se tiranas quando exploradas pelo ego. Outro exemplo, mais sutil, pode ajudar a esclarecer este ponto.



Está bem e é natural aos homens reunir um pequeno stock de coisas básicas. Através disto energia é poupada e a vida corre mais suavemente. Loucamente, muitos homens imaginam que quanto mais reunirem mais felizes serão; e assim, com uma dedicação maravilhosa, amontoam stocks enormes de coisas não necessárias. Como resultado desta atividade fútil, a necessidade de conseguir coisas, e continuar a consegui-las, torna-se cada vez mais forte, até que se tornam num grande propósito para a vida. Embora o objetivo desta atividade seja a felicidade, o açambarcador nunca é feliz. “Quem ama o dinheiro jamais dele se farta; e quem ama a abundância nunca se farta da renda” (Eclesiastes 5:10). Podemos imaginar que, rodeado por riqueza material suficiente para confrontar as crises que possam surgir na vida, um homem se sentiria seguro. Mas não é assim. As riquezas não protegem o homem: o homem tem que proteger as riquezas!

Então não existe nada de sinistro sobre a carne humana. Não existe nada basicamente mau com os desejos humanos. A fonte principal da iniquidade humana é a obsessão do homem com o seu ego, para a gratificação de interesses egoístas e ambição são o maior propósito na vida do homem, já que toda a força do homem são dirigidos a dar prazer físico, sentir segurança e um sentido de importância. A pessoa em si é o seu próprio ídolo.

 

(The Devil: The Great Deceiver por Peter Watkins, tradução para português: S.Mestre)

O DIABO - O GRANDE ENGANADOR (PARTE 5)

S. Mestre, 15.08.10

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CRUCIFICADOS COM CRISTO

 

O derradeiro ídolo é a própria pessoa. A não ser que o ego seja crucificado, não pode haver uma nova criatura em Cristo Jesus. As bem conhecidas palavras de Romanos 6 clarificam a situação:

 

Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que seja a graça mais abundante?

De modo nenhum! Como viveremos ainda no pecado, nós os que para ele morremos? Ou, porventura, ignorais que todos nós que fomos batizados em Cristo Jesus fomos batizados na sua morte? Fomos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo; para que, como Cristo foi ressuscitado dentre os mortos pela glória do Pai, assim também andemos nós em novidade de vida. Porque, se fomos unidos com ele na semelhança da sua morte, certamente, o seremos também na semelhança da sua ressurreição, sabendo isto: que foi crucificado com ele o nosso velho homem, para que o corpo do pecado seja destruído, e não sirvamos o pecado como escravos; porquanto quem morreu está justificado do pecado” (Versículos 1-7).



Estas palavras são regularmente citadas para explicar às pessoas que ainda não foram batizadas o que é o batismo. A palavras de Paulo realmente cumprem essa função, mas vale a pena notar que elas são dirigidas, não aos que ainda estão para se batizar, mas para aqueles que já tomaram os seus votos. Ele está relembrandos as pessoas que foram batizadas (nós?) da seriedade do passo tomado. Não sabeis, diz ele, que no vosso batismo vos identificastes com Cristo na sua morte? Existe então uma morte, com Cristo, para Adão e o pecado, e uma ressurreição com Cristo para uma nova vida. A importância do batismo pode ser assustadora de se contemplar.



Novas Criaturas



Em 2 Coríntios 5:17 Paulo presenteia-nos com uma proposição realmente fabulosa: “se alguém está em Cristo, é nova criatura.”



No versículo 14 o nosso envolvimento na morte de Cristo é afirmado: “Pois o amor de Cristo nos constrange, julgando nós isto: um morreu por todos; logo, todos morreram.” A sequência de pensamento é a mesma de Romanos 6, pois o próximo versículo fala do nosso envolvimento na ressurreição de Cristo: “E ele morreu por todos, para que os que vivem não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou.”



A implicação disto é que devemos olhar para tudo com olhos espirituais como novas criaturas em Cristo. Houve um tempo, diz-nos Paulo, quando olhavamos para tudo com olhos carnais. Realmente, ele olhou para Cristo com os olhos de um homem natural. Agora é diferente. Até as coisas naturais são vistas através dos olhos espirituais, e são vistas como parte do ambiente que Deus providenciou para as suas novas criaturas. Ele diz isso assim: “Assim que, nós, daqui por diante, a ninguém conhecemos segundo a carne; e, se antes conhecemos Cristo segundo a carne, já agora não o conhecemos deste modo. E, assim, se alguém está em Cristo, é nova criatura; {criatura; ou criação} as coisas antigas já passaram; eis que se fizeram novas. Ora, tudo provém de Deus.”



Todas tudo provém de Deus: isto é uma lição difícil de aprender. Quando reconhecemos este facto, temos que ver a resmunguice é um atributo abominável do antigo Adão que devia, faz muito tempo, ter sido crucificada. Tem sido dito que resmungar contra a vida é resmungar contra Deus.



A Crucificação do Mundo



Considere agora as palavras do Apóstolo Paulo: “estou crucificado com Cristo; e vivo”(Gálatas 2:20, RC). Como poderia Paulo estar crucificado e ao mesmo tempo estar vivo? A simples resposta é que o “eu” que foi crucificado é um diferente “eu” daquele que vive. As palavras que se seguem tornam isso claro: “e vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim”. O que isto significa é que o “eu” associado com Adão tem que morrer, e o “eu” associado com Cristo tem que viver.



Outra passagem que expressa a mesma verdade é Gálatas 5:14:



“Mas longe esteja de mim gloriar-me, senão na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, pela qual o mundo está crucificado para mim, e eu, para o mundo.”



Há duas crucificações aqui:



  1. “o mundo está crucificado para mim”

  2. “e eu, para o mundo”.



A segunda crucificação não é difícil de entender. Paulo, como discípulo de Cristo, é perseguido pelo mundo. Figuradamente falando, o mundo crucifica-o.



Mas em que sentido é Paulo o crucificador do mundo? É claro que é verdade que ele vê a iniquidade do mundo com aversão; mas a guerra real é só de um lado. Enquanto que o mundo crucifica a Paulo, ele não retalia. Paulo não crucifica o mundo fora de si mesmo. Mas ele crucifica o mundo dentro de si mesmo. A afirmação de Paulo no capítulo anterior dá expressão a este pensamento: “Os que são de Cristo crucificaram a carne com as suas paixões e concupiscências” (5:24). Assim Paulo crucifica o mundo dentro dele, enquanto que ele é crucificado pelo mundo exterior.



Bem-aventurados os limpos de coração



Por agora queremos concentrar os nossos pensamentos na crucificação do mundo dentro de nós. Quando somos batizados em Cristo, nos propusemos a destruir “o corpo do pecado” (Romanos 6:6).

Isto significa que, pelo menos teoricamente, estamos agora livres do pecado. Em teoria! No entanto temos que confessar que os nossos desejos carnais ainda se afirmam e nos fazem transgressores da lei de Deus. Como isto afeta a nossa posição perante Deus? Este ponto já foi mencionado no capítulos 13 que tudo depende se pecamos apesar de nós próprios, ou por causa de nós próprios. Se pecarmos apesar de estarmos fazendo o nosso melor, então como Paulo podemos dizer, “Neste caso, quem faz isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim” (Romanos 7:17). Quando esta é a nossa posição, Deus está disposto a nos perdoar, porque em nossos corações concordamos com as Suas reis justas.



Já foi também mencionado que o pronome “eu” pode ser usado de duas maneiras. Ele pode ser usado sobre Adão em nós, e também pode ser usado sobre Cristo em nós. A questão decisiva é: Qual é o “eu” dominante? Se o “eu-Cristo” prevalece, então nós quereremos, bastante literalmente, negar quaisquer intrusões Adâmicas. No nosso coração saberemos que “esta transgressão não é realmente eu”. E Deus, que é maior que o nosso coração, saberá isso também. O nosso grande propósito então será manter o nosso coração puro, e isso envolve uma constante luta contra o pecado. Aqueles marcados com o símbolo de aceitação naquele fatídico capítulo nono de Ezequiel são aqueles que “suspiram e gemem” por causa do pecado. Assim que não há luta, o “eu-Adão” prevalece. Ou por outras palavras, Satanás entra em nosso coração. Duas passagens nos ajudam aqui:



“Ora, Satanás entrou em Judas...” (Lucas 22:3)



“Ananias, por que encheu Satanás teu coração...” (Atos 5:3)



Satanás tinha entrado nos corações destes dois homens. No que se refere ao “eu-Cristo”, tinha-se rendido; no que se refere ao “eu-Adão”, tinha tomado conta de tudo. Embora Satanás, ou os desejos carnais, tivessem enchido o coração de Ananias ele foi culpado e castigado por permitir isso. Daí a pergunta que se segue: “Como, pois, assentaste no coração este desígnio?” E daí a imensa importância das palavras do Senhor Jesus: “Como, pois, assentaste no coração este desígnio?” (Mateus 5:8).



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A LUTA CONTRA O PECADO

 

“se alguém está em Cristo, é nova criatura.” Será que estas palavras parecem que nos estão escarnecendo? Novas Criaturas de verdade! Esta luta contra o pecado é uma tal luta muito amarga e cansativa contra as probabilidades...

 

Coragem! Todo o filho de Deus tem estes sentimentos às vezes, e são compelidos a exclamar em angústia, “Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?” Longe de nos abater, o facto de que existe uma luta deve ser encarado como um sinal de encorajador. É normal existir uma luta quando estes elementos mutuamente hostis, a carne e o espírito, estão envolvidos num combate mortal. Se não há luta, a situação é mortalmente séria. Significa que, no presente pelo menos, a carne prevalece. Então é altura de começar a se preocupar.

 

A estranho é que esta dolorosa luta é boa para nós. Não somente é um sinal encorajador em si mesma, como também tem um efeito de nos fazer melhores, desde que não desfaleçamos no dia da adversidade. Ajuda-nos a termos aversão ao Adão em nós que continua a querer vir à superfície; ajuda-nos a desejar a redenção do corpo; mantém-nos humildes; e continuamente nos lembra que aqueles que passam fome e sede de justiça serão saciados; e nos permitirá apreciar o verdadeiro valor da dádiva final.

 

Muitas pessoas têm vontade de aceitar a luta se puderem ver sinais de melhora. O que leva o homem ao desespero é o facto de terem de batalhar com a mesma fraqueza carnal vez após vez. Não existe uma formula para fazer progressos?

 

Hábitos de Pensamento

 

Sim, existe uma formula – mas não elimina a luta. Examinemos primeiro o problema.

 

O a nossa maneira de pensar precisa de ser corrigida. Pensamentos maus se afirmam com uma facilidade verdadeiramente assombrosa. Raramente são pensamentos novos. Faz tempo, que hábitos de pensamento se estabeleceram nas nossas mentes, e se apresentam a nós, sem serem chamados. Existe uma inevitabilidade tal acerca do nosso modo de pensar que os nossos pensamentos parecem correr em trilhos. Algumas vezes, aparecem de repente, bastante automaticamente, pelo que vemos, ou ouvimos; algumas vezes tomam conta das nossas mentes em momentos de sossego. E uma vez que tomam posse, ele controlam totalmente o nosso pensamento.

 

Maravilhamo-nos sobre a perversidade dos nossos pensamentos. Aqueles pensamentos orgulhosos, invejosos, de raiva, ou de luxúria: nos nossos momentos de mais sanidade deploramos amargamente a sua intrusão, e no entanto, vez após vez se tornam em nossos mestres. Eles talvez se tenham estabelecido em nossas mentes logo cedo, em dias irresponsáveis. Houve um tempo em que acarinhávamos os pensamentos que agora nos fazem ficar envergonhados. Foi nesse tempo que esse hábitos de pensamento se formaram.

 

tudo o que é verdadeiro”

 

Por isso devemos mudar os nossos pensamentos. Como pode isso ser feito? A epístola aos Filipenses tem como preocupação melhorar a mente, e um ponto importante que Paulo sublinha é que devemos deliberadamente cultivar pensamentos sadios. Se estes se estabelecerem nas nossas mentes, haverá menos espaço para os pensamentos errados. As palavras de Paulo são bem conhecidas de nós:

 

Finalmente, irmãos, tudo o que é verdadeiro, tudo o que é respeitável, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é de boa fama, se alguma virtude há e se algum louvor existe, seja isso o que ocupe o vosso pensamento” (Filipenses 4:8).

 

Este é um conselho excelente, mas não resolve por completo o problema. Estes hábitos de pensamentos indesejáveis não são facilmente descartados. Na verdade, ler uma lista das coisas que Deus requer de nós, como, por exemplo, a lista de Paulo em Colossenses 3, é sentir que alguns, pelo menos, das exigências de Deus são impossíveis de cumprir. Talvez nos ajude a ver o assunto mais claramente se tivermos a passagem diante de nós:

 

Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena: prostituição, impureza, paixão lasciva, desejo maligno e a avareza, que é idolatria... Agora, porém, despojai-vos, igualmente, de tudo isto: ira, indignação, maldade, maledicência, linguagem obscena do vosso falar. Não mintais uns aos outros... Revesti-vos, pois, como eleitos de Deus, santos e amados, de ternos afetos de misericórdia, de bondade, de humildade, de mansidão, de longanimidade. Suportai-vos uns aos outros, perdoai-vos mutuamente, caso alguém tenha motivo de queixa contra outrem. Assim como o Senhor vos perdoou, assim também perdoai vós; acima de tudo isto, porém, esteja o amor, que é o vínculo da perfeição.

Seja a paz de Cristo o árbitro em vosso coração, à qual, também, fostes chamados em um só corpo; e sede agradecidos. Habite, ricamente, em vós a palavra de Cristo...” (versículos 5-16).



Como nos aguentamos no teste? Suponha que colocamos um visto naqueles mandamentos que obedecemos, e um “X” aqueles que desobedecemos: qual é a nossa pontuação? Temos um balanço positivo? Não seria razoável concentrar-nos naqueles mandamentos que conseguimos obedecer? E em relação aos outros – bem, nós temos as nossas fraquezas. Deus entende, e certamente fará uma exceção para esses.



Não, este é o pensamento da carne, e temos que resistir a isso. Tiago diz-nos com dureza no seu segundo capítulo que não somos “cumpridores da palavra” se só fizermos aquelas coisas que achamos fáceis, ou convenientes, ou para a nossa vantagem. O mundo está cheio de gente que age assim. O teste real à nossa sinceridade – o único verdadeiro teste – é o esforço que fazemos para fazer aquelas coisas que consideramos difíceis. É verdade que Deus faz algumas concessões à fraqueza humana, mas não nos é permitido aproveitar desse facto. Porque iremos precisar da misericórdia de Deus quando tivermos feito o nosso melhor, devemos não utilizar isso como uma desculpa para fazer menos do que o nosso melhor.



Exigências Impossíveis



Em linguagem popular, isto leva-nos até à estaca zero. O facto é que alguns destes itens na lista de Paulo são bastante impossíveis. Então qual é a importância em tentar? Sabemos através da experiência amarga que iremos falhar, e nos sentiremos pior se não tivéssemos tentando.



Sim, algumas das exigências de Deus são francamente impossíveis de cumprir, e quanto mais cedo enfrentarmos este facto melhor. Reconhecer este facto é tomar um passo decisivo na direção certa. Irá salvar-nos de imaginar que por uma abordagem muscular ao Cristianismo seremos capazes de vencer por nossa própria força. Aqueles que abordam o discipulado desta maneira ficam amargamente frustados, e algumas vezes desistem de uma vez de lutar. Algumas vezes tornam-se só Cristãos nominais, e outras vezes desertam completamente da causa Cristã.



Tivemos um bom começo: continuemos.



Mas como podemos continuar? Chegámos à conclusão que Deus nos pede para fazer coisas impossíveis: será que Deus não está a ser razoável? Só um milagre nos pode salvar.



Isso é só a posição. Esta transformação de Adão para Cristo que tanto desejamos é um milagre. Mas não é mágica. É um processo, e não um evento. O Deus que nos pediu para fazer coisas que vão muito mais além do nosso poder está disposto a trabalhar connosco para que o impossível possa ser alcançado. “Para Deus tudo é possível.” A nossa conquista do pecado é a obra do Senhor, e devemos nos colocar nas Suas mãos.



As Escrituras estão cheias de exemplos de pessoas a quem foram pedidas coisas impossíveis : Noé, Abraão, Sara, Moisés, Josué, David, Ezequiel, Daniel, Maria, Senhor Jesus e os apóstolos. Deus não estava a ser insensato em pedir a estas pessoas que fizessem coisas impossíveis porque a Sua intenção era trabalhar através deles, permitindo-lhes fazer o que de outra maneira não poderia ser feito. Estas pessoas acreditaram: e a seu tempo o impossível aconteceu. E assim pode ser connosco na nossa conquista do pecado.



Formula



Não esquecendo a injunção de pensar em coisas que são verdadeiras, honestas, puras, amorosas e de bom registo, chegamos agora até à formula do Senhor. Ela é, simplesmente: “Vigiai e orai, para que não entreis em tentação.”



Vigiar, significa manter-se acordado. Estar despertos e alerta para a possibilidade de tentação. “Sede sóbrios e vigilantes. O diabo, vosso adversário, anda em derredor, como leão que ruge procurando alguém para devorar” (1 Pedro 5:8).



Temos que estar então sempre despertos, sempre de guarda. É por não estarmos de guarda que o pecado nos vence. O pecado é atrativo e tudo depende do instante em que a tentação se nos apresenta. Se até mesmo poderarmos sobre a sugestão que o pecado nos apresenta, seremos derrotados. O espírito tem que chegar primeiro que a carne. Tudo depende desse primeiro momento vital.



Pense em David. Se, no instante em que a tentação se apresentou a ele e ele tivesse se desviado dela, ele teria sido poupado da vergonha e desgraça que manchou uma vida que de outro jeito seria nobre. Ninguém que, em circunstâncias similares, pausaria para ver melhor tem o direito de criticar David. Aos olhos de Deus eles pecaram assim como ele. Ele teve o infortunio de ser rei que podia num instante converter pensamentos em ações. Devido à nossa situação inferior na vida somos poupados deste problema.



O espírito tem que chegar primeiro que a carne. Primeiro então, temos que orar a Deus para que nos ajude a manter-nos despertos. E depois assim que a tentação nos confronta, temos que orar novamente. Assim como Jacó, temos que lembrar Deus da Sua promessa: “Não te deixarei ir se me não abençoares.” Então Deus toma conta da situação.



A aplicação desta formula, pode se tornar um hábito que irá derrotar o hábito de pensamentos ofensivos, e pela graça de Deus, o diabo se afastará de nós, e no fim será totalmente destruído.

 

19

 

A EPÍSTOLA AOS ROMANOS

 

Silêncio Significativo

 

SUPONHA que, afinal, existe um diabo pessoal. Suponha que este monstro é o grande inimigo de Deus e o grande tentador do homem; o responsável pela queda dos nossos primeiros pais no Éden, e de inumeráveis milhões de seres humanos desde esse tempo. Suponha que todos os problemas que o mundo sofreu foram resultado do trabalho deste diabo e seus anjos. Em tal caso seria irrelevante dizer que a existência deste diabo é de suma importância. A missão do Senhor Jesus Cristo teria que ser vista como uma resposta a este facto. O obra de redenção do Senhor Jesus seria o jeito de Deus frustrar o trabalho deste diabo pessoal.

 

A epístola aos Romanos, esse livro do Novo Testamento que nos leva do Éden até ao Calvário, pode ser descrito como um tratado sobre o evangelho da salvação. Várias referências são feitas à transgressão de Adão, e às consequências da transgressão são lidadas com detalhe. Um grande peso de ênfase é colocado sobre a universalidade do pecado, do qual até mesmo os Judeus, com o seu orgulhoso pedigree e pano de fundo na “Lei de Moisés” não ficaram isentos. A justificação é representada como algo oferecido de graça por Deus para a humanidade sem esperança, e sem capacidade de resolver a situação. O caminho da vida foi aberto pelo sacrifício de Cristo. O Senhor Jesus colocado diante de nós como a resposta para os problemas do pecado e da morte criados por Adão. Aqueles que irão usufruir dos benefícios da obra de Cristo devem morrer com ele para o pecado, e viver com ele para justiça. O batismo em água é o símbolo da morte com Cristo, e o sair da água representa a ressurreição com Cristo para “novidade de vida”. Apesar desta dedicação para uma nova vida de retidão, os desejos pecaminosos de uma pessoa batizada ainda se afirmam até um grau desesperante, mas “o Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos” provê a resposta para os impulsos da carne. Daí em diante o apóstolo, tendo já sublinhado a importância da contribuição do “homem”, crença, aborda a questão da salvação desde o ponto de vista de Deus. O propósito de Deus com o homem está baseado na “eleição”, e o destino dos Judeus e Gentios deve ser visto a esta luz. No final, todos os que Deus reconhece como verdadeiros Israelitas serão salvos.

 

A poderosa exortação para fazer boas obras que se segue está ligada à exposição dos primeiros onze capítulos pela palavra, “pois”: “Rogo-vos, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, que apresenteis o vosso corpo por sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional” (12:1).

 

É altamente significativo que nem a palavra diabo, nem, como uma exceção(Romanos 16:20: Esta é uma Escritura que já estudámos. O ponto aqui é que a palavra “Satanás” não se encontra nesta parte da epístola onde Paulo desenvolve o seu tema massivo da “redenção”.), a palavra Satanás aparece na exposição elaborada do evangelho providenciada em Romanos. Se um diabo pessoal fosse realmente responsável pela queda do homem, porque não é mencionado? Se os pecados subsequentes da raça humana foram incitados pela influência enganadora deste monstro, porque não existe uma palavra sobre ele num livro que diz tanto acerca das falhas humanas? Se o sacrifício de Cristo foi realmente planeado para frustrar os desígnios malignos deste arqui-inimigo, alusão ao inimigo seria certamente esperada? E se as lutas terríveis de homens dedicados são essencialmente batalhas contra um arcanjo iníquo, porque toda a referência a este génio do mal é tão cuidadosamente evitada? A conclusão à qual aponta o grande silêncio de Romanos é que não existe um diabo sobrenatural e pessoal.

 

Pecado

 

As Escrituras falam do pecado de variadas formas. O significado bíblico normal da palavra é estabelecido por João: “o pecado é a transgressão da lei” (1 João 3:4). Pecado é a ofensa específica da lei de Deus.

 

A definição mais alargada de pecado é dada por Paulo em Romanos 14:23: “tudo o que não provém de fé é pecado.” O contexto é sobre comer coisas que foram oferecidas aos ídolos. Isto só é errado quando é ofensivo para a consciência de um homem (a consciência daquele que come, ou a consciência daquele que o vê comer). A ação de comer dever ser feita “em fé”. Na realidade, tudo deve ser feito “como se feito para Deus”. Tudo o que não é feito com uma consciência sã e desinibida da presença de Deus é pecado.

 

Na mesma epístola aos Romanos, a palavra pecado é algumas vezes usada com outros dois sentidos, relacionados com o uso da palavra já considerado, e relacionados de perto um com o outros. Considere as seguintes passagens:

 

“Já temos demonstrado que todos, tanto judeus como gregos, estão debaixo do pecado” (3:9).

 

“Porque até ao regime da lei havia pecado no mundo, mas o pecado não é levado em conta quando não há lei” (5:13).

 

“Que diremos, pois? Permaneceremos no pecado, para que seja a graça mais abundante?

De modo nenhum! Como viveremos ainda no pecado, nós os que para ele morremos?” (6:1,2).



O pecado é representado aqui como um “estilo de vida” universal, que tem um efeito maligno sobre a humanidade, e se manifesta em atos pecaminosos.



Agora considere as passagens:



“Mas o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, despertou em mim toda sorte de concupiscência; porque, sem lei, está morto o pecado” (7:8).



“Ora, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. Neste caso, quem faz isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim” (7:16,17).



“Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou Deus, na carne, o pecado” (8:3).



Nestas Escrituras a palavra pecado é usada para descrever os impulsos dentro do homem que o induzem a cometer atos de pecado; por outras palavras, desejos humanos iníquos.



Não existe distinção real entre estes dois usos da palavra pecado. A aparente distinção surge do facto que, no primeiro conjunto de passagens, Paulo está lidando com a humanidade como um todo, e no segundo conjunto, lida com o individuo. Em ambos os casos os mesmo desejos errados que caracterizam a natureza humana estão sendo considerados.



Uma Equação



A epístola aos Romanos não faz qualquer referência ao diabo, mas tem muito que dizer sobre o pecado, especialmente pecado no sentido de desejos humanos errados. É impressionante observar o que o que Romanos diz sobre o pecado, outras passagens do Novo Testamento dizem sobre o diabo. É impressionante, mas não deve surpreender-nos. Num capítulo anterior chegamos à conclusão que o diabo é uma personificação dos desejos humanos errados. Agora vimos que Paulo usa a palavra pecado neste sentido em Romanos. Por isso a equação é inevitável. A tabela que se segue é uma simples maneira de mostrar que o que Romanos diz sobre o pecado, outras passagens do Novo Testamento atribuem ao diabo e Satanás.



O pecado e o Diabo são ambos

Romanos (acerca do Pecado)

Outras passagens do Novo Testamento (sobre o diabo e Satanás)

1. Hostis a Deus; devem ser resistidos

“nem ofereçais cada um os membros do seu corpo ao pecado, como instrumentos de iniquidade; mas oferecei-vos a Deus” (6:13).

“Sujeitai-vos, portanto, a Deus; mas resisti ao diabo...” (Tiago 4:7).

2. Engadores

“Porque o pecado, prevalecendo-se do mandamento, pelo mesmo mandamento, me enganou e me matou” (7:11)

“diabo e Satanás, o sedutor de todo o mundo” (Apocalipse 12:9).

3. Destruidores da vida

Como acima (Também 5:12 e 6:23).

“...aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo” (Hebreus 2:14).

4. Destruidos pela morte de Cristo

“sabendo isto: que foi crucificado com ele o nosso velho homem, para que o corpo do pecado seja destruído, e não sirvamos o pecado como escravos” ( 6:6).

“Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse... o diabo” (Hebreus 2:14).

5. Antíteses do Espírito Santo

“Se, porém, Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito é vida, por causa da justiça” (8:10).

“Ananias, por que encheu Satanás teu coração, para que mentisses ao Espírito Santo” (Atos 5:3). (Também Atos 10:38).

6. Governantes e mestres

“o pecado reinou pela morte” (5:21).

“Não sabeis que daquele a quem vos ofereceis como servos para obediência, desse mesmo a quem obedeceis sois servos, seja do pecado para a morte ou da obediência para a justiça?” (6:16)

“Se também Satanás estiver dividido contra si mesmo, como subsistirá o seu reino?” (Lucas 11:18).





Os nossos estudos sobre o assunto do diabo levaram-nos a esperar este paralelo de factos bíblicos acerca do pecado e o diabo. É útil, no entanto, quando apresentamos este ponto de vista sobre o diabo àqueles que aceitam a ideia tradicional, apresentá-lo desde o final do estudo. Primeiro, dirigir a atenção para o facto de que a Bíblia diz as mesmas coisas sobre o pecado e sobre o diabo; e então pode ser sugerido que por uma dedução racional parece que o pecado é o diabo na Bíblia.

 

A Personificação do Pecado em Romanos

 

O último ponto na tabela de comparação é digno de ponderação. Por esta altura já estamos acostumados a pensar sobre o diabo como uma personificação dos desejos humanos errados. Quão significativo é então que o pecado é personificado da mesma forma em Romanos. Em Romanos 5 e 6 o pecado é representado:

 

  1. Como um governante (5:21)

  2. que se opõe a Deus (6:13)

  3. e como um dono de escravos que exige obediência (6:16)

  4. e paga salários (6:23)

 

Antes de deixarmos esta vertente do nosso estudo, que seja mais uma vez afirmado que quando o pecado é equiparado com o diabo, a palavra pecado é usada – como acontece em abundância em Romanos – para descrever os desejos humanos errados.

 

 

20

 

O PROBLEMA DO MAL

 

Deus – o Criador do Mal

 

Eu formo a luz e crio as trevas; faço a paz e crio o mal; eu, o SENHOR, faço todas estas coisas” (Isaías 45:7).

 

Tocar-se-á a trombeta na cidade, sem que o povo se estremeça? Sucederá algum mal à cidade, sem que o SENHOR o tenha feito?” (Amós 3:6).

 

Realmente não é difícil de entender estas passagens que falam de Deus como criador do mal. Mal não é pecado: é a adversidade que pode, ou talvez não, ser um castigo para o pecado. No Salmo 90:15 existe um paralelo interessante entre os “dias quantos nos tens(Deus) afligido” e “anos quantos suportamos a adversidade”, onde é evidente que, neste contexto pelo menos, o mal é adversidade vinda de Deus.

 

Reconhecer que o mal não é pecado pode remover uma dificuldade, mas segundo algumas pessoas, levanta outro. Existem muita gente que expressa a sua aversão à ideia de que Deus faz com que o homem sofra.

 

A natureza da objeção nem sempre é clara. Será que os objetores, enquanto que reconhecem que Deus causa adversidade, ofendem-se com este facto. Ou é a sua objeção ao livro que por engano(assim como eles o vêm) representa Deus como o criador de adversidade. Fica-se com a impressão de que frequentemente aqueles que se queixam nunca analisaram o seu próprio raciocínio , por isso tentemos colocar o nosso raciocínio sobre este assunto de forma direta. Umas quantas questões e respostas podem ajudar:

 

  • As Escrituras representam Deus como O que causa adversidade?

  • Sim.

  • São as Escrituras uma mensagem de Deus completamente confiáveis?

  • Sim.

  • Então devemos acreditar que Deus causa adversidade?

  • Sim.

  • Achamos isso difícil de aceitar?

  • (Sepunhamos que a resposta é Sim.)

  • Então o nosso entendimento dos caminhos de Deus deve estar incompleto a este respeito?

  • É difícil de resistir a esta conclusão.

 

Este último ponto é extremamente importante. Devemos reconhecer livremente que Deus deve estar certo. Se parece existir alguma coisa ofensiva ou inconsistente sobre o caminho de Deus, então devemos humildemente admitir que estamos vendo isso do ponto de vista errado. Jeremias dá-nos um excelente exemplo desde tipo de humildade. Confrontado com uma situação que parecia indicar que deus é inconsistente, ele não acusa ou censura. Quando ele coloca o seu dilema perante Deus, ele começa primeiro por reconhecer que Deus é justo: “Justo és, ó SENHOR, quando entro contigo num pleito; contudo, falarei contigo dos teus juízos” (Jeremias 12:1).

 

Deus causa sofrimento ao homem e um momento de reflexão nos assegurará que, em algumas circunstâncias pelo menos, este conceito sobre Ele é completamente razoável. O Deus que recompensa o justo está a ser consistente quando Ele trás o mal sobre os obreiros da iniquidade. O Deus que ama a justiça provê provas deste amor ao demonstrar o Seu ódio pela injustiça. Como o Salmo 5 diz:

 

Pois tu não és Deus que se agrade com a iniquidade, e contigo não subsiste o mal. Os arrogantes não permanecerão à tua vista; aborreces a todos os que praticam a iniquidade. Tu destróis os que proferem mentira; o SENHOR abomina ao sanguinário e ao fraudulento” (versículos 4-6).

 

 

 

A Decisão do Homem

 

Poderia ser dito que tudo isto está muito bem, mas Deus poderia primeiro ter prevenido o homem de ser um pecador, e então o problema que se seguiu à queda do homem poderia ter sido evitado. Afinal de contas, Deus criou o homem e conhecia o seu potencial. Certamente ele poderia ter feito com que as coisas tomassem outro rumo? É nos permitido dizer que Deus poderia ter evitado a queda e evitado assim todos estes problemas, mas que não nos é permitido dizer deveria tê-lo feito.

 

Pensando um pouco com cuidadoso irá nos ajudar a resolver o problema.

 

O homem tem a capacidade de tomar decisões: isto é uma coisa boa ou ruim? Eu nunca encontrei ninguém que preferisse o contrário. A alternativa colocaria o homem no mesmo nível intelectual que os outros animais da criação – totalmente dependentes de instintos.

 

Deus criou o homem com a capacidade de tomar decisões e esta capacidade pode ser exercitada com sabedoria ou com imprudência. Um consequência inevitável da liberdade de Adão era a possibilidade de tomar uma decisão tola – que foi precisamente o que ele fez. Aqueles que dizem que Deus não devia ter permitido Adão tomar uma tal decisão estão na realidade dizendo que de todo Adão não deveria ter esta liberdade de escolha, que ele e os seus descendentes – ele e nós – não deveríamos ser homens mas autómatos.

 

Enquanto aceitando o nosso argumento até este ponto, alguns protestariam que Deus teria intervindo depois da transgressão para prevenir que o homem sofresse as consequências da sua decisão errada. Será que não conseguem enxergar que isto colocaria o homem num mundo irreal e inconstante. O próprio negocio de tomar decisões envolve tomar em conta as consequências quando se decide algo, e depois aceitar essas consequências. Se uma pessoa é permitida tomar decisões em tomar em conta as consequência, ele está sendo encorajado a agir irresponsavelmente. Em tais circunstâncias, o desenvolvimento do caráter seria bastante impossível. Aqueles que se queixam que Deus deveria ter salvo o homem das consequências do seu erro teriam desejado que Deus interviesse e prevenisse o homem de desfrutar dos benefícios das suas boas decisões?

 

Os caminhos de Deus são iguais: Ele administra as Sua leis com consistência. No entanto ele também é um Deus de amor. Um dos temas fascinantes da Bíblia é a interação entre o amor divino e a justiça – a bondade e severidade de Deus. Embora Deus não revogasse a sentença de morte, Ele deu a Adão e Eva um tempo de vida e oportunidade antes da morte os reclamar. Assim, eles poderam se reproduzir, e a raça sobreviveu embora sujeita à morte. O facto que existem seres humanos vivos hoje é evidência do amor de Deus.

 

Para mais, não só deus deu aos homens a chance de viver: Ele ofereceu-os a oportunidade de viver para sempre. A narrativa bíblica dá-nos exemplo após exemplo da gentileza de Deus para com os mortais que não merecem isso. Embora Deus dê ao homem uma medida de sofrimento, isto é a consequência da decisão do homem, e é assim, de certo sentido, a próprio contribuição do homem para as circunstâncias da sua vida. O amor de Deus é realçado por este pano de fundo negro da loucura e pecados humanos.

 

Deve se reconhecer que as nossas emoções e preconceitos humanos podem levar-nos a conclusões erradas acerca da severidade de Deus. Quando vemos o resultado da ira de Deus escondemo-nos aterrorizados. O que não vemos com tanta clareza é a enormidade do pecado humano que chama o julgamento sobre si. Não damos o valor que devíamos que para Deus, que não tem prazer na morte do ímpios, julgamentos como o Dilúvio são levados a cabo com relutância porque todas as tentativas para ganhar o homem para a razão e justiça foram repudiadas pelo próprio homem. Pedro convida-nos a ver as coisas a esta luz quando ele descreve os dias imediatamente anteriores ao Dilúvio como dias de graça quando Deus retinha os julgamento que há muito já deveriam ter sido executados. Eram dias quando “a longanimidade de Deus aguardava” (1 Pedro 3:20).

 

O Sofrimento dos Servos de Deus

 

O mal nem sempre é castigo. Às vezes parece ser, embora no final a intenção é abençoar. Um bom exemplo disto é dado por David. Claramente, as provações de David tinham a intenção de lembrar-lhe, e continuar lembrando, do seu grande pecado. No entanto não eram castigos no sentido normal, pois Deus tinha-o perdoado. Através destes lembretes David se manteve humilde, e na sua humildade ele aprendeu a confiar em Deus ao máximo. Na análise final, o mal que caiu sobre David não era mal, mas uma bênção disfarçada.

 

Algumas vezes o castigar de um servo de Deus não tem uma ligação direta com os seus pecados pessoais. Os sofrimentos de Jeremias e Ezequiel eram profecias simbólicas do destino que cairia sobre Israel. No entanto, no final eles não perderam com isso. Nas palavras do Salmista, “Foi-me bom ter eu passado pela aflição, para que aprendesse os teus decretos” (Salmo 119:71).

 

Porque a provação ajuda? Voltando a um tema anterior, os servos de Deus vivenciam uma luta em si mesmos entre dois elementos mutuamente hostis, a carne e o espírito. Porque estes elementos estão completamente em oposição um ao outro, cada um prospera às custas do outro, e cada um sofre a vantagem do outro. Existe uma relação “baloiço” entre a carne e o espírito, e o objetivo dos servos de Deus é crucificar a carne para que o espírito possa viver. Paulo fala disso assim: “Porque, se viverdes segundo a carne, caminhais para a morte; mas, se, pelo Espírito, mortificardes os feitos do corpo, certamente, vivereis” (Romanos 8:13).

 

O castigo divino é sempre dirigido contra a carne. Tem como objetivo ajudar o sofredor a apreciar os valores espirituais. Realmente, O que provê o castigo é descrito em Hebreus 12 como “Pai dos espíritos”(RC).

 

O assunto do sofrimento é difícil, e o nosso estudo sobre isso está longe de estar completo. O que vimos foi que Deus trás uma medida de sofrimento sobre o homem porque este escolheu o caminho do pecado; e Ele usa o sofrimento como um meio a para promover o desenvolvimento espiritual dos Seus servos.

 

Um pensamento final. Este período de sofrimento é só momentâneo. O quadro final é de um tempo quando “não haverá mais morte, nem pranto, nem clamor, nem dor; porque {já} as primeiras coisas são passadas” (Apocalipse 21:4). Se, pela graça de Deus estivermos lá, seremos capazes de ver o problema do sofrimento a partir da perspetiva correta, e entenderemos.

 

Por

 

PETER WATKINS

 

(The Devil: The Great Deceiver por Peter Watkins, tradução para português: S.Mestre)

O DIABO E OS SEUS COMPANHEIROS DE ONDE VÊM? O que é o Diabo, onde está o Diabo, e quem é o Diabo? (PARTE 1)

S. Mestre, 03.08.10

Uma música pop oferece um comentário sobre a condição humana – “A vida é dura. Então, você morre. Depois, jogam terra sobre si. Em seguida, os vermes comem-no . Esteja grato que acontece por essa ordem.1”

 

Não muito reconfortante, mas é a verdade. Muito antes de Moisés registar a explicação para isso, e muito tempo antes de Jesus trazer uma via de escape, as pessoas começaram a desenvolver a sua própria filosofia acerca do Problema do Mal. Eles queriam acreditar que a humanidade é fundamentalmente boa – uma filosofia que completamente inundou o ponto de vista moderno da natureza humana. O próximo passo lógico era concluir que o homem não pode ser responsabilizado pelo mal que permeia continuamente e destrói a sua vida. Deve existir, concluíram eles, um ser espiritual poderoso, invisível e malévolo que se diverte ao provocar ao homem todos os seus problemas. Este ponto de vista tem sido abraçado desde tempos antigos pré-cristãos, e ainda é amplamente difundido, não obstante o bom resumo do contrário por Paulo, o apóstolo –

“Porque a criação ficou sujeita à vaidade, não por sua vontade, mas por causa do que a sujeitou, Na esperança de que também a mesma criatura será libertada da servidão da corrupção, para a liberdade da glória dos filhos de Deus. Porque sabemos que toda a criação geme e está juntamente com dores de parto até agora” (Romanos 8:20-22).

Muito antes de Paulo, o Pregador, exclamou, “Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades! Tudo é vaidade. Que proveito tem o homem, de todo o seu trabalho, que faz debaixo do sol? Uma geração vai, e outra geração vem; mas a terra para sempre permanece” (Eclesiastes 1:2-4). O pregador não terminou até que ofereceu alguns conselhos excelentes:

“De tudo o que se tem ouvido, o fim é: Teme a Deus, e guarda os seus mandamentos; porque isto é o dever de todo o homem. Porque Deus há de trazer a juízo toda a obra, e até tudo o que está encoberto, quer seja bom, quer seja mau” (Eclesiastes 12:13-14).

Paulo expande consideravelmente a conclusão do Pregador –

“Porque, se viverdes segundo a carne, morrereis; mas, se pelo Espírito mortificardes as obras do corpo, vivereis. Porque todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus” (Romanos 8:13-14).

Há uma alternativa clara para a aparente futilidade da vida humana. Não só isso, mas – “Porque para mim tenho por certo que as aflições deste tempo presente não são para comparar com a glória que em nós há de ser revelada” (versículo 18). E então ele fala dos detalhes dessa glória "… também gememos em nós mesmos, esperando a adoção, a saber, a redenção do nosso corpo"(v. 23)  que será tornado imortal aquando do retorno de Cristo  (veja 1 Coríntios 15).

“O que o Diabo é, onde o Diabo está e que o Diabo é?”
 

É dito que isto foi o título bastante atrevido de uma palestra pública proferida há muito tempo por alguns Cristadelfianos, na Escócia. Claramente, o orador tinha-se proposto questionar o conceito usual do Diabo, que o vê como o supremo espírito do mal pessoal representado frequentemente na  fé dos Judeus e Cristãos como o tentador da humanidade, o líder de todos os anjos apóstatas, e o governador do inferno.2 O conceito de um super espírito do mal é de facto muito mais amplo do que o âmbito Judaico e Cristão. Permeia praticamente todas as culturas, antigas e modernas. Muitos nos dias de hoje e presente era veem esse super Espírito do Mal estritamente como um mito. Mas, muitos entre os religiosos consideram-no como uma pessoa real. É para estes, especialmente os Cristãos e Judeus, que oferecemos as seguintes observações.

 

O apóstolo Paulo declarou que todos os que não se têm arrependido estão neste momento presos nos “laços do diabo” tendo sido “feitos cativos por ele para cumprirem a sua vontade” (2 Timóteo 2:25-26). Paulo viu “o diabo” como o adversário da humanidade – o inimigo que os retém como escravos em cativeiro. Se o bem instruído Saulo de Tarso tinha ouvido falar de que um estrategista militar Chinês tinha escrito na sexto século a. C., não sabemos –

“... se você conhecer os seus inimigos e conhecer a si mesmo, lutará sem perigo nas batalhas. Se você só se conhece a si mesmo, mas não o seu inimigo, você pode perder ou ganhar. Se você não conhece nem a si mesmo nem o seu inimigo você se colocará sempre em perigo.3”

O provérbio moderno foi resumido a isto, “conheça o seu inimigo.” “O seu inimigo” – o Diabo –  realmente existe, segundo a autoridade das palavras inspiradas de Paulo. Todos os leitores de Paulo, antigos e modernos, precisamos de dar ouvidos à sua advertência. E a melhor maneira para evitarem ser “feitos cativos” por este inimigo, é aprender o máximo possível sobre ele. Propõe-se, com este ensaio, identificar de forma clara esse grande inimigo, assim como ele é apresentado no Antigo e Novo Testamentos das Escrituras. A maioria dos que afirmam a sua crença na Bíblia como a palavra de Deus, dizem que o diabo das Escrituras é idêntico ao do conceito popular. Temos problemas com esse ponto de vista, e propomos investigar o conceito popular, perguntando:

Qual é a Origem do Conceito Judaico-Cristão Acerca do Diabo?
 

Primeiramente, um breve resumo da noção popular:

• Um anjo bom fomentou uma guerra de rebelião contra Deus no céu.

• Isso aconteceu porque este anjo se encheu de orgulho.

• Este anjo convenceu muitos outros anjos a juntarem-se à sua rebelião.

• O resultado da guerra foi que Satanás e seus seguidores, por um relato, foram expulsos do céu. Por outro conta que Satanás caiu do céu.

• O Diabo, chamado Satanás, agora tem um império de anjos caídos, chamados demónios, que trabalham para ele.

• Este ser espíritual imaterial é também chamado de “o grande dragão” e “a antiga serpente”.

• Ele é chamado de "antiga serpente", porque foi ele que tentou Eva e causou a queda de Adão.

• Todos os esforços do Diabo estão direcionados para afastar a humanidade de Deus.

• O objetivo de Satanás é enviar toda a humanidade para o seu próprio reino, que se diz ser o inferno, que se acredita ser um lugar de fogo de enxofre, e de tormento eterno para as almas perdidas.

• Satanás e os seus demónios é dito estarem continuamente trabalhando através de terceiros e outros meios para subverter a humanidade, especialmente os crentes.

 

Foi observado4 em conexão com esculturas que representam o Diabo, comumente encontradas nas igrejas medievais, que estão muitas vezes na forma familiar, com chifres e rabo. A mesma forma pode ser encontrada na arte popular Chinesa e em esculturas Iraniananas. Mas a imagem vai ainda mais ainda no passado, aparece até mesmo nas ruínas  da Assíria e da Babilónia. É a partir destas fontes antigas que as representações  Judaico-Cristãs  do diabo são vistas como tendo sido copiadas.

 

A atenção volta-se para a estatueta de bronze, agora no Louvre, do século 7 a. C, de Pazazu, o Vento Sudoeste, considerado então como portador de febre e delírio. É de salientar a similaridade desta divindade antiga, com o do diabo como ele é representado em iluminuras em manuscritos e nas esculturas das igrejas da Europa.

 

O conceito popular de Satanás tem sido traçado pelos estudiosos,5 notando que Satanás desempenha um papel importante no folclore do Judaísmo, Cristianismo e Islamismo. Por altura das últimas escrituras apócrifas Judaicas, Satanás tinha sido identificado com diversos temas mitológicos do folclore Judaico  – trevas, submundo e o ar,  tentação sexual e abuso, o bode e outras criaturas. Existe uma clara referência ao folclore Judaico no aviso de Jesus aos seus discípulos:

“E Jesus lhes disse: Vede e acautelai-vos do fermento dos fariseus e dos saduceus. Eles, porém, discorriam entre si, dizendo: É porque não trouxemos pão. Percebendo-o Jesus, disse: Por que discorreis entre vós, homens de pequena fé, sobre o não terdes pão? Não compreendeis ainda, nem vos lembrais dos cinco pães para cinco mil homens e de quantos cestos tomastes? Nem dos sete pães para os quatro mil e de quantos cestos tomastes? Como não compreendeis que não vos falei a respeito de pães? E sim: acautelai-vos do fermento dos fariseus e dos saduceus. Então, entenderam que não lhes dissera que se acautelassem do fermento de pães, mas da doutrina dos fariseus e dos saduceus”(Mateus16:6-12).

Fermento, por causa da sua característica, é nas Escritura um símbolo de corrupção. O fermento não era aceite nas ofertas da Lei de Moisés – veja Levítico 2:11. Antes da Páscoa, Israel removeu todo o fermento de suas casas, de modo que o anjo da morte não encontrasse nenhum quando ele passasse por cima da casa onde o sangue estava aspergido na entrada (Êxodo 12:15-20). Paulo, o apóstolo retoma esse símbolo em 1 Coríntios 5:6 - 8 –

“Não é boa a vossa jactância. Não sabeis que um pouco de fermento leveda a massa toda? Lançai fora o velho fermento, para que sejais nova massa, como sois, de fato, sem fermento. Pois também Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi imolado. Por isso, celebremos a festa não com o velho fermento, nem com o fermento da maldade e da malícia, e sim com os asmos da sinceridade e da verdade.”

O fermento dos fariseus e outros, referia-se à corrupção, em particular dos seus ensinamentos e comportamentos. Também o apóstolo Paulo se refere ao folclore Judaico na sua carta a Tito – (Tito 1 :13-14) “...repreende-os severamente, para que sejam sadios na fé e não se ocupem com fábulas judaicas, nem com mandamentos de homens desviados da verdade.” Aqui ele está diretamente preocupado, assim como Jesus o estava, com a influência corruptiva do folclore Judaico, o que de facto teve o seu efeito na comunidade Cristã. Algum desse folclore aparece em Mateus 12:22-24. Depois que Jesus ter curado um homem que estava tanto cego como mudo, as pessoas comuns puderam ver que apenas o poder de Deus poderia fazer isso. Mas os Fariseus, a quem Jesus recentemente humilhara, declararam a sua crença: “Este não expele demónios senão pelo poder de Belzebu, maioral dos demónios”.

 

De Onde Veio Belzebu?
 

Nós aprendemos do Antigo Testamento que o deus Bel era adorado na Mesopotâmia, berço da civilização. Foi também o berço da religião pagã. Em Canaã vários Baals foram adorados, como Baal-Berite (Juízes 8:33), Baal-Peor (Números 25:3) e Baal-Zebube, o deus do cidade filisteia de Ecrom (2 Reis 1:2-16). É mais do que um facto curioso que o rei Acazias do reino do norte de Israel, enviou a consultar Baalzebube a respeito da sua doença. O Deus de Israel não tinha nenhuma imagem que Acazias pudesse ver, mas até as imagens bezerro de Dã e Betel, não boas o suficiente para o rei. Muito depois  dos bezerros de ouro desaparecem  quando os assírios derrubaram  Samaria, o deus feito pelos homens,Baalzebube ainda tinha influência sobre Israel, entre os Fariseus. Deus falou a Israel através de Jeremias (5:22) “Não temereis a mim? -diz o SENHOR; não tremereis diante de mim?” A palavra Hebraica é yare (Strong 3372), que significa “reverenciar” também  “assustar”. Os fariseus que desafiaram Jesus devem ter conhecido o mandamento do Senhor, referido em Juízes 6:10,

"Eu sou o SENHOR, vosso Deus; não temais os deuses dos amorreus".

Embora os fariseus não adorassem Baalzebule, eles temiam-no. Mas Jesus não. Ele chamou a falsa atribuição deles de blasfêmia, atribuindo o poder de cura Deus a um ídolo pagão! Jesus conhecia muito bem o Salmo 72:18: “Bendito seja o SENHOR Deus, o Deus de Israel, que só ele opera prodígios” Jesus também elogiou o escriba que declarou: “ele[Deus] é o único, e não há outro senão ele” (Marcos 12:32). Embora nenhum Judeu, nem Muçulmano nem Cristão adorem Satanás, muitos acreditam nele e temem-no e o seu poder.

 

Esse medo do Diabo varia com o tempo e local, mas a própria ocorrência da palavra diabolatria6  indica que o medo pode e tem rivalizado o do Deus Todo-Poderoso. Uma crença num poder quase ilimitado do Diabo floresceu entre os primeiros luteranos.

 

A Imagem de Satanás e a Mitologia Grega
 

Outro estudiodo7 refere-se à impressionante similaridade entre a imagem habitual do Diabo e Pã, o mítico filho de Hermes.

“A influência iconográfica Pã sobre o Diabo é enorme.”

A tradição medieval frequentemente fala da pilosidade do Diabo, por vezes, de seus chifres, e ocasionalmente, dos seus cascos fendidos. Mais comumente, ele tem uma forma de similar a de um bode. Este animal, desde a antiguidade, esteva associado à paixão sexual, que era estranha ao racionalismo dos gregos, e ao ascetismo do Cristianismo corrompido. Os "demónios" (Levítico 17:7) eram  sair(sátiros), demónios com semelhança a bodes, aos quais Israel estava oferecendo sacrifícios. A forquilha do Diabo também vem da mitologia  Grega –  o tridente Posídon, o seu símbolo de senhorio.

 

Charun era uma personificação Etrusca da morte. Seu nariz enorme em forma de gancho, barba desgrenhada e cabelos longos e orelhas bestiais pontiagudas, rangendo os dentes e lábios fazendo caretas são todas as características dos empréstimos contraídos pelas figuras  medievais e modernas do Diabo. Passamos agora da concepção visual, às origens do diabo pessoal da teologia popular.

 

O Diabo Pessoal de Teologia Popular
 

Não só para os estudiosos, mas para qualquer observador imparcial dos factos, é indiscutível que o Cristianismo mudou acentuadamente daquilo que Jesus e os apóstolos ensinaram. Não foi sem boa razão de que ambos advertiram contra a forma de Judaísmo que existia no primeiro século. Muito claramente Jesus não falou contra a religião Judaica do Antigo Testamento, que se baseava na Lei de Moisés. Mas ele foi mais severo contra "a tradição dos anciãos", ver Mateus 15:2-6 e Marcos 7:3-13. Essa "tradição" ainda é realizada nos dias de hoje, como declarado na canção Tevya em “Um violino no telhado”. Mas esta propensão para a tradição humana não é uma característica particular aos Judeus. É uma característica do ser humano adaptar as doutrinas recebidas. O Cristianismo tem os seus “Pais da Igreja”, cuja influência foi grande em mudar tanto a doutrina como a prática. O que os Judeus fizeram com religião do Antigo Testamento antes do nascimento de Cristo, os Gentios repetiram depois com as Escrituras apostólicas.

 

Essa é uma prática universal entre os homens adaptar costumes e religião a seu próprio gosto, pode ser visto em outras religiões Gentias. Um dos ensinamentos de Buda fundamento era que não deviam ser feitas de imagens. No entanto, agora a sua religião está associada principalmente com a sua imagem! No Islão, o facto de que uma facção não tem compunção contra o assassinato de membros de outra, é suficiente para mostrar que a religião que Maomé é suficiente para mostrar que a religião de Maomé foi mudada ao longo dos tempos. Nós, portanto, não devíamos ficar surpreendidos ao ver o Cristianismo muito alterado em relação ao modelo apostólico. Jesus foi altamente crítico da "tradição dos anciãos" do Judaísmo, por exemplo, o lei de Corbã – veja Marcos 7:9-13. Os homens adicionaram as suas próprias ideias e as regras à Lei de Deus, que tinha sido entregue por intermédio de Moisés. Isto fazia parte da “doutrina dos fariseus e dos saduceus " (Mateus 16:12). J. B. Russell comenta,

“Os conceitos Hebraicos Geena e sheol eram combinados para produzir um lugar subterrâneo de tormento, que na literatura apocalíptica tornou-se na morada do Diabo e os demónios seus assistentes. Todos os elementos combinados para criar a tradição Cristã do inferno, que no Novo Testamento, estava ainda muito longe de estar claramente definida” (p.255).

Observamos anteriormente a influência na mudança do  Cristianismo apostólico referido por Paulo, o apóstolo, dizendo a todos os crentes para não dar ouvidos a “fábulas judaicas, nem... [a] mandamentos de homens desviados da verdade.” – Tito 1:14. O que eram estas “fábulas”, e de onde vinham?

 

Escrituras Não-Canónicas
 

Referência é agora feita8 a essa classe de textos não-canónicos chamados literatura apocalíptica. É chamada de apocalíptica, porque professa um conhecimento secreto de eventos do futuro. Observa-se que a literatura apocalíptica dos Judeus é de considerável importância tanto para o Judaísmo como para o Cristianismo. Além disto, essa literatura ilumina uma série de desenvolvimentos importantes das crenças religiosas que tiveram lugar durante o tempo entre o Antigo e o Novo Testamentos. Não há nenhuma lista acordada de Livros apocalípticos Judaicos, mas a seguinte lista mostra aqueles que são geralmente aceites como pertencentes a esta classe de literatura, com suas datas aproximadas. Alguns têm colocado o livro de Daniel nesta lista. Mas Jesus Cristo o incluiu no cânon das Escrituras (Mateus 24:15) e Daniel não menciona qualquer um dos elementos criados pelo homem que aparecem na apocalíptica Judaica.

 

• O Apocalipse de Abraão, 70-100 d.C.

• A Assunção de Moisés, 4 a.C. - 30 d.C.

• 2 Baruque-100-130 d.C. • 1 Enoch, 164-80 a.C.

• 2 Enoch 1.º século d.C. • 2 Esdras 90 d.C. • Livro dos Jubileus-150 a.C.

• A vida de Adão e Eva (O ApocalipseMoisés) -69 d.C. • O Martírio de Isaías, 1-50 d.C.

• Os Salmos de Salomão, 50 a.C • Oráculos Sibilinos Livro 3, 150 a.C. • Oráculos Sibilinos Livro 4, 80 d.C.

• Oráculos Sibilinos Livro 5, após 100 d.C.

• O Testamento de Abraão, 1.º Século d.C.

• O Testamento dos Doze Patriarcas, 150- 100 a.C.

 

As ideias contidas nesta literatura estaria mais generalizada do que os próprios livros, e teria um forte apelo para o povo Judeu como um todo. Os livros apocalípticos caíram fora do favor entre os judeus, especialmente após de Tito e Vespasiano destruirem o Estado Judaico, em 70 d.C. Mas por essa altura já tinham sido traduzidos para Grego pelos Judeus da diáspora. Este facto encaixa-se bem com a advertência de Paulo a Tito (1:14) referida anteriormente. Apesar do aviso de Paulo, os cristãos, por sua vez tomaram esta literatura e a popularizaram ainda mais através da sua adoção para seu próprio uso.

 

A apocalíptica Judaica fazia parte da tradição judaica aceite durante o tempo entre o Antigo e Novo Testamentos. A prevalência de ideias a partir dessa fonte pode ser vista nos escritos de Qumran, com palavras e frases  em comum, incluindo a crença em espíritos bons e maus. Isso também era verdade sobre o Judaísmo Farisaico ortodoxo. A influência do pensamento apocalíptico e mesmo da fraseologia pode ser encontrada nos escritos de rabinos e mais tarde na liturgia da sinagoga.Depois de 70 d.C., tornou-se impopular no Judaísmo rabínico oficial , não só por causa da destruição do Templo, mas devido ao seu crescente uso entre os Cristãos.

 

Parece provável que os Cristãos que tinham sido Judeus ou prosélitos da diáspora, teriam familiaridade com a literatura apocalíptica. Mas por alguma razão, essa literatura se tornou ainda mais difundida entre os Cristãos. O corpo inteiro dessa literatura poderia ter desaparecido, se não fosse pelo seua entusiástica aceitação na igreja pós-apostólica Cristã. Uma observação por JB Russell indica que existia  uma outra influência, que reforçou a da apócrifa Judaica.

“Foi Platão... que, com seu grande impacto sobre o pensamento Cristão, foi o mais influente no desenvolvimento do conceito do Diabo” (página 145).

Ainda não mergulhamos nas particularidades referente à sua Majestada Fumacenta, mas há outra questão – de onde os autores da apocalíptica Judaica receberam as suas ideias não-Bíblicas?

 

(Continua)

 

NOTAS FINAIS

 

1. David Gerrold, um autor da Califórnia.

2. Mirriam-Webster Collegiate Dictionary

3. O último versículo do capítulo 13 de “A arte da Guerra” de Sun Tzu.

4. Lancelot C. Sheppard (artigo sobre o diabo na Encyclopaedia Britannica), foi editor da série “Fé e Factos” na Enciclopédia do século XX do Catolicismo.

5. Mircea Eliade foi editor-chefe da Enciclopédia da Religião de 16 volumes (1987). Ele era um historiador das religiões e homem de letras, que se distinguiu por suas pesquisas na linguagem simbólica utilizada por diversas tradições religiosas e pela sua tentativa de reduzir o seu significado a mitos primordiais subjacentes que fornecem a base para fenómenos místicos.

6. Encyclopaedia Britannica edição 1967, "Faust", p. 120c.

7. Jeffrey Burton Russell, autor de “O Diabo - Percepções do Mal desde a Antiguidade até ao Cristianismo Primitivo” (publicado 1977), professor de história na Universidade da Califórnia. Sua especialidade é a história da teologia. Ele é mais conhecido pela sua história em cinco volumes sobre o conceito de Diabo. 8. David Syme Russell, um estudioso da literatura apocalíptica Judaica, N. Baptist College, Manchester

 

Por Arthur Bull

Tradução: S. Mestre

O DIABO E OS SEUS COMPANHEIROS DE ONDE VÊM? O que é o Diabo, onde está o Diabo, e quem é o Diabo? (PARTE 2)

S. Mestre, 03.08.10

Ainda não mergulhamos nas particularidades referente à sua Majestada Fumacenta, mas há outra questão – de onde os autores da apocalíptica Judaica receberam as suas ideias não-Bíblicas? Um estudante da cultura Indo-iraniana1 afirma que o Zoroastrismo, particularmente a sua
demonologia, influenciou o Judaísmo partir do Exílio.


“Isto é particularmente evidente na alterada
concepção de Satanás. Antes do exílio... Satanás
não era mais que um servo de Deus... após o
exílio, ele é retratado como o adversário de Deus.”

 

Zaratustra(o antigo nome Iraniano de Zoroastro) revoltou-se contra o politeísmo da sociedade que o envolvia, rejeitando o culto a muitos deuses. Ele proclamou Ahura (Deus) Mazda “Senhor Sábio", que mais tarde foi o grande Deus de Dario I (522-486 a.C.). A origem do mal é explicada no
sistema de Zoroastro, postulando que, no início da criação, os espíritos gémeos, filhos de Ahura
Mazda, escolheram entre o bem e o mal. Um escolheu o bem e se tornou associado com a verdade, a justiça e da vida. O outro escolheu o mal e as suas forças assistentes de destruição, injustiça e morte.


De acordo com Zoroastro o mundo iria dentro em breve ser consumido numa poderosa conflagração da qual apenas os seguidores do bem se levantariam para fazer parte de uma nova criação. As almas dos bons deviam esperar no céu para que isso acontecesse, enquanto que os ímpios tinham que esperar no "Inferno". No Zoroastrismo tardio também se acreditava que as almas dos condenados seriam purgadas(purificadas) no fogo para que pudessem compartilhar da renovação final do mundo. Aliás, essa doutrina do Purgatório também encontrou o seu caminho para a velha igreja mãe
através do mesmo caminho que a do espírito maligno pessoal, o Diabo – uma indicação clara de que um diabo anjo caído não tem mais validade do que a doutrina do Purgatório.


Após a morte de Zoroastro a sua religião se espalhou pelo território dos medos e dos persas, e, adivinhem! Veio a ficar contaminada com a antiga religião. Ahura Mazda, o poder do Senhor Sábio tornou-se limitado, e a sua boa criação sofria a oposição de uma criação do mal em pé de igualdade, instigado por seu filho gémeo mau.

A perseguição às mãos dos Muçulmanos durante os séculos 8 - 10 d.C., mandou alguns Zoroastristas para Bombaim, Índia. Por volta do século 19 eram chamados Parsis. Eles e os Gabars (significando "Infiéis") do Irão são os dois únicos grupos remanescentes Zoroastristas. Mas a influência do Zoroastrianismo continua até hoje em outras religiões, incluindo o Cristianismo, a nível global. Estudiosos costumam se referir ao conceito Zoroastra de espíritos do bem e do mal como dualismo. Alguns entre os teólogos da Igreja, evidentemente picados por esta clara conexão, têm resistido fortemente à aplicação do rótulo à sua forma de Cristianismo. Parecem ficar mais confortáveis com Semi-dualismo. Mas realmente, isso é mero sofisma, e não remove a clara descendência do conceito do Diabo pessoal a partir do Zoroastrismo. O estudante da cultura Indo-Iraniana anteriormente referenciado descobriu que é possível traçar o progresso da nova influência. Os apocalipses Judaicos falvama a principio (Jubileus, 2 a.C.) de um julgamento de anjos rebeldes. Dizia-se que eram filhos e espíritos dos anjos maus Beliar e Mastema, assim como os anjos que
tinha abusado do seu poder de punição. Mais tarde, em n'A Assunção de Moisés (provavelmente 1º Século d.C.) a decisão final é concebida como uma luta entre Deus e o Demónio.

 

O professor observa ainda que o sistema Iraniano é particularmente visível na Doutrina dos Dois Espíritos. Na literatura apócrifa tanto rabínica como Cristã pós-apostólica, os espíritos bons e maus se opõem uns aos outros. O Livro de Judá, no Testemunho dos Doze Patriarcas fala de dois espíritos que servem o homem, um da verdade, e um do erro.


O estudioso da literatura apocalíptica Judaica anteriormente referenciado observa que o interesse prevalecente dos livros apocalípticos Judaicos é o futuro e o mundo por vir. Em alguns escritos o ensinamento do Antigo Testamento, do Reino de Deus estabelecido na terra persiste. Mas
em geral esses escritores se desesperaram do presente e deste mundo, e ansiavam pelo o futuro e para o mundo vindouro para cumprimento da suas esperanças. A velha ideia de um Reino sobre a terra dá lugar a um reino sobrenatural num novo céu e nova terra (I Enoque 37-71) ou um reino espiritual no céu (II Enoch) ou um reino terreno temporário seguido pela eternidade no céu (II Esdras e II Baruque). Ele observa que a influência persa pode ser traçada neste crescimento notável durante este período da crença em demónios. Os males perpetrados contra Israel por parte das nações são atribuídos aos anjos maus, que no final partilham da punição dos maus governantes terrenos.


Um apocalíptico dos mais antigos traça esta associação dos anjos com o mal à história registada em Génesis 6:1-4

“Como se foram multiplicando os homens na terra, e lhes nasceram filhas, vendo os filhos de Deus que as filhas dos homens eram formosas, tomaram para si mulheres, as que, entre todas, mais lhes agradaram. Então, disse o SENHOR: O meu Espírito não agirá para sempre no homem, pois este é carnal; e os seus dias serão cento e vinte anos. Ora, naquele tempo havia gigantes na terra; e também depois, quando os filhos de Deus possuíram as filhas dos homens, as quais lhes deram filhos; estes foram valentes, varões de renome, na antiguidade.”

 

 

Os autores, destes livros apócrifos, quem quer que fossem, tomaram esse relato d' “os filhos de Deus”, para querer dizer que alguns anjos anteriormente bons cobiçaram as filhas dos homens (Jubileus, Testamentos, II Enoque). Foi dito que desta união ilícita apareceram os espíritos maus (I Enoque 15:08 ...) que continuam o seu trabalho de incitação ao pecado, até o julgamento final. “Esta doutrina desenvolvida de anjos e demónios, e a noção de que o mundo atual está no poder do príncipe dos Demónios, é familiar aos leitores do Novo Testamento” Não, nos apressamos a salientar, que Jesus ou os apóstolos não ensinaram tal ideia, mas que é lá expressa pelos Fariseus –


“Mas os fariseus, ouvindo isto, murmuravam: Este não expele demónios senão pelo poder de Belzebu, maioral dos demónios.”(Mateus12:24).


É um facto revelador que em Gênesis 6:3 a primeira versão da tradução do Grego do Antigo Testamento (Septuaginta ou LXX), o texto Alexandrino tem para o Hebraico “ha bene elohim”, “angeloi”, que em Português é “anjos”. A versão posteriores têm “uioi” ou “filhos”, que é a tradução correta. A ideia de anjos caídos é muito antiga certamente. A versão Etíope do Livro de Enoque 9:6; 10:08 diz acerca dos "anjos atalaia” que tomaram mulheres humanas, “Vês tu o que Azazel fez, que ensinou toda a injustiça na terra ... e toda a terra se corrompeu pelas obras que foram ensinadas por Azazel: a ele atribui-lhe todos os pecados.”

 

Mas o que diz o relato inspirado?


"E Deus viu que a maldade do homem era grande na terra, e que cada a imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente. Então arrependeu-se o Senhor que ele tinha feito o homem na terra, e lhe pesou no coração "(Génesis 6:5-6).


É geralmente aceite que o homem é intrinsecamente bom, e que, portanto, deve olhar para fora de si para encontrar a causa da sua maldade. Mas esta opinião é contrária à palavra inspirada, que é consistente em colocar a culpa do pecado no próprio homem. Se a culpa foi realmente de um “anjo rebelde", então certamente Génesis 6 seria o local para afirmar o facto, ao invés de falar da “maldade do homem.” Em oposição à tradição humana, as Escrituras divinamente inspiradas são consistentes no sentido de tornar o homem a fonte de sua própria iniquidade –


Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?” (Jeremias 17:9).

“E dizia: O que sai do homem, isso é o que o contamina. Porque de dentro, do coração dos homens, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios,a avareza, as malícias, o dolo, a lascívia, a inveja, a blasfémia, a soberba, a loucura. Ora, todos estes males vêm de dentro e contaminam o homem” (Marcos 7:20-23).

“... como, pois, assentaste no coração este desígnio? Não mentiste aos homens, mas a Deus” (Atos 5:4).


“...cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz. Então, a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte” (Tiago 1:14-15).


O Livro dos Jubileus fala sobre os “gigantes” de Génesis 6:4, dizendo que eles foram mortos – e portanto, acrescenta ao registro inspirado. O livro diz que o espírito desses “gigantes” permaneceu na terra para tentar a humanidade a pecar, mas que Deus, então prendeu-os todos. A fábula passa a
dizer que Satanás negociou(!) com Deus, para libertar alguns demónios, e dez por cento deles foram liberados para continuar o seu trabalho de tentar a humanidade. Dois outros livros apócrifos adicionam significativamente ao mito. Por alguma mágica, eles dizem, as mulheres que cobiçaram anjos, conceberam formas alienígenas através de seus maridos.


O Livro Eslavo de Enoque, ou Enoch II, também conhecido como O Livro dos Segredos de Enoque 29:4-5, fala do orgulho de um anjo que se tornou Satanás, e da sua revolta. O Livro da Sabedoria de Salomão, que é Helenístico afirma: "Deus criou o homem para a imortalidade, e o fez à imagem do seu próprio ser eterno; foi o despeito do Diabo que trouxe a morte ao mundo”(Sabedoria 02:24 LXX). Isso está diretamente contradiz o que Paulo afirma, que, “por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte... pela ofensa de um só, morreram muitos... pela ofensa de um e por meio de um só, reinou a morte... por uma só ofensa, veio o juízo sobre todos os homens para condenação...”(Romanos 5:12;18). Paul não culpa “Satanás” ou “o Diabo” ou demónios, ou um “anjo caído”. Esta ideia, como nós vimos, tem origens extra-Bíblicas.


O Livro dos Jubileus retrata o mau Mal'ak como totalmente independente do Senhor. O príncipe dos espíritos maus, Mastema, e os seus seguidores desencaminharam os filhos dos filhos de Noé. O mesmo livro dá a sua própria versão dos acontecimentos que estão registados nas Escrituras canónicas. Ele diz que foi Mastema, em vez de Javé, que encontrou Moisés no deserto para matá-lo (Êxodo 4:24).


A primeira sugestão, diz o livro, para Deus pedir a Abraão para oferecer Isaque, veio do "príncipe" Mastema. O livro declara o destino final deste grande espírito do mal: No fim do mundo o Messias virá e julgará Mastema; ele e os seus anjos, então, ser amarrado e preso para sempre (Jubileus 10:8; 23:29; 48:15-16). Isto está amplamente em desacordo com o testemunho de Jesus, que declarou na sua parábola da rede,


“Assim será na consumação do século: sairão os anjos, e separarão os maus dentre os justos”(Mateus 13:49).


Não se trata de espíritos malignos, mas é a humanidade mortal que irá ser julgada:


“Não vos maravilheis disto, porque vem a hora em que todos os que se acham nos túmulos ouvirão a sua voz e sairão: os que tiverem feito o bem, para a ressurreição da vida; e os que tiverem praticado o mal, para a ressurreição do juízo” (João 5:28-29).


Que a “condenação” não é eterna prisão, mas “destruição” –


“… quando do céu se manifestar o Senhor Jesus com os anjos do seu poder, em chama de fogo, tomando vingança contra os que não conhecem a Deus e contra os que não obedecem ao evangelho de nosso Senhor Jesus. Estes sofrerão penalidade de eterna destruição, banidos da face do Senhor e da glória do seu poder”(2 Tessalonicenses 1:7-9).


De acordo com o Enoque Etíope (II Enoque) os anjos do mal funcionam como tentadores – (65:6; 69:6) e como seus acusadores (40:7) e castigadores (53:3). Declara, “toda a terra tem sido corrompida através das obras que foram ensinadas por Azazel – a ele atribui-lhe todos os pecados” (9:6; 10:8). Este livro também diz que os anjos ímpios serão lançados debaixo da terra para ficarem presos nas trevas para a eternidade. Na verdade, não existem anjos maus. Isso pode ser o que se depreende das traduções antigas do Salmo 78:48-49, onde é contada as dez pragas no Egito,

“Também entregou o seu gado à saraiva, e os seus rebanhos aos coriscos. Lançou sobre eles o ardor da sua ira, furor, indignação, e angústia, mandando maus anjos contra eles.”


Isto foi reconhecido como um erro tradução e as versões modernas, por exemplo, Almeida Revista e Atualizada, “anjos portadores de males.” Os anjos não eram maus, antes, Deus estava trazendo o mal (catástrofe) sobre Faraó e os Egípcios através dos Seus anjos. Isto está em perfeita harmonia com a declaração do próprio Deus em Amós 3:6


"...Sucederá algum mal à cidade, sem que o SENHOR o tenha feito? "


Deus é a fonte tanto do bem (bênção) e do mal (calamidade) – enfaticamente, o mal não é o trabalho de um espírito mau. Mais uma vez,

“ Respondeu-lhe[a Moisés] o SENHOR: Quem fez a boca do homem? Ou quem faz o mudo, ou o surdo, ou o que vê, ou o cego? Não sou eu, o SENHOR?"(Êxodo 04:11).


Eram anjos bons que Deus enviou, primeiro lugar para falarem com Abraão, e depois para destruir Sodoma (Génesis 18-19). Foi um bom anjo, que pela vontade de Deus, destruiu 185 mil soldados do exército Assírio que tinham sitiado Jerusalém (2 Reis 19:35).


Mas a ideia de que existem anjos maus é totalmente desmentida pela doutrina de Jesus Cristo. Ao refutar a negação dos Saduceus sobre a ressurreição, Jesus ensinou:

“Os filhos deste mundo casam-se e dão-se em casamento; mas os que são havidos por dignos de alcançar a era vindoura e a ressurreição dentre os mortos não casam, nem se dão em casamento.Pois não podem mais morrer, porque são iguais aos anjos e são filhos de Deus, sendo filhos da ressurreição”(Lucas 20:34-36).


Aliás, isto desmascara a mentira da fábula sobre Génesis 6:1-4 ser sobre anjos casando mulheres mortais. Mas o ponto aqui é que os fiéis serão feitos “iguais aos anjos.” Igualdade de que forma? “não podem mais morrer” em outras palavras, tornam-se imortais. Veja mais sobre isto em 1 Coríntios 15. Ao acontecer isto será a realização da promessa de Cristo em João 3:16,


“Porque Deus amou ao mundo de tal maneira que deu o seu Filho unigênito, para que todo o que nele crê não pereça(apollumi = destruir por completo), mas tenha a vida eterna(aionios = perpétua)”.

O contraste é inconfundível: ou destruição total ou vida sem fim. Os anjos, ensinou Jesus, têm vida interminável . "O salário do pecado é a morte", que é a cessação da vida (Romanos 6:23). Anjos, portanto, não podem pecar, nem rebelar-se contra Deus. A ideia de anjos tornando-se maus é uma “fábula”.


Considere a questão de outro ponto de vista. Quando Abraão estava em Canaã,


“Disse o SENHOR a Abrão, depois que Ló se separou dele: Ergue os olhos e olha desde onde estás para o norte, para o sul, para o oriente e para o ocidente; porque toda essa terra que vês, eu ta darei, a ti e à tua descendência, para sempre” (Génesis 13:14-15).


Deus prometeu que Abraão e seus descendentes iriam possuir a terra “para sempre” (`owlam = eternidade). Jesus ressalta a promessa mais de uma vez, e declara:

“Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra.” (Mateus 5:5)

 

Estes "mansos", explica o apóstolo Paulo, são, por fé incluídos na semente de Abraão,


“Essa é a razão por que provém da fé, para que seja segundo a graça, a fim de que seja firme a promessa para toda a descendência, não somente ao que está no regime da lei, mas também ao que é da fé que teve Abraão (porque Abraão é pai de todos nós)” (Romanos 4:16).


Agora, se fosse possível aos anjos pecar, então é possível (uma vez que “o salário do pecado é a morte”) que os anjos morram. E se fosse possível aos anjos pecar, então (já que serão “iguais os anjos”), seria possível para qualquer um dos "Herdeiros da salvação" (Hebreus 1:4) também pecarem, e seria possível também morrem, a promessa já não seria “firme”. Em quem devemos acreditar? Jesus contou uma mentira, quando ele prometeu a vida eterna? Será que Deus mentira quando ele prometeu a Abraão e à sua posteridade, a “eterna” possessão da terra? Devemos acreditar na fábula de “anjos caídos”, ou devemos acreditar na promessa de Deus aos fiéis, que, na ressurreição, eles não podem mais morrer?


O apócrifo “Livro de Adão e Eva”, foi escrito por um autor Judeu antes de 70 d.C. As versões Latinas e Eslavas existentes também contêm algumas interpolações Cristãs tardias. Este livro atribui a queda de Adão e Eva às tentações de Satanás ou Diabo. O Apocalipse de Moisés afirma que a serpente era apenas uma ferramenta de Satanás. Além disso, torna o “desejo carnal” de Adão e Eva como a “raiz e início de todo o pecado.” Este modo de pensar tem feito cair que nem patinhos, a antiga Jezebel da Cristandade apóstata, e pode ser visto ainda nesse sistema que ainda “proíbe[m] o casamento e exigem abstinência de alimentos que Deus criou para serem recebidos, com ações de graças, pelos fiéis e por quantos conhecem plenamente a verdade;”(1 Timóteo 4:3). Enquanto que o ensinamento divino é, “Digno de honra entre todos seja o matrimónio, bem como o leito sem mácula.” (Hebreus 13:4).


Mas pior do que fazer toda a sexualidade humana pecado, isto é uma “fábula” sobre a queda de Adão. Vamos ao registo Divino e leiamo-lo por nós mesmos. "Bem, isso é estranho", poderíamos dizer, “uma cobra que fala! – Como pode ser isso?” Mas então os nossos olhos recaem sobre as palavras: “Mas a serpente, mais sagaz(em hebraico, 'aruwm) que todos os animais selváticos que o SENHOR Deus tinha feito, disse à mulher...” (Génesis 3:1). Qual é o ponto desta afirmação? Está certamente lá para explicar o fenómeno de uma serpente que fala – a serpente poderia falar por causa de sua “sagacidade”. O que significa isso? Para uma palavra que encontramos na literatura comum, uma definição pode ser encontrada num dicionário dicionário, como o Aurélio. Mas de onde o Sr. Aurélio encontrar as suas definições? Foi pela leitura de uma série de literatura, e ver como a palavra é usada em cada contexto. Agora, quando nós aceitamos que as Escrituras canónicas são de facto a palavra de Deus, com certeza não vamos ir a um dicionário de literatura estritamente humano para encontrar a definição de uma palavra ou expressão. Precisaremos de fazer o que fez o Sr. Aurélio, mas veja como a palavra é usado no contexto das Escrituras. 'Aruwm ocorre onze vezes no Antigo Testamento. Olhando para as outras dez ocorrências, Jó 5:12 e 15:5 usa a palavra no sentido negativo de “astuto”. As demais ocorrências em Provérbios 12:16, 23; 13:16; 14:8, 15, 18; 22:3; 27:12 usam a palavra no sentido positivo de “prudente”.


Podemos, então, concluir com segurança que Génesis 3:1 significa que a serpente era, em comparação com os outros animais, inteligente, com a possibilidade de também ser astuta. O apóstolo Paulo concorda com isto, quando ele se refere a este incidente, dizendo aos crentes de Corinto: "Mas receio que, assim como a serpente enganou a Eva com a sua astúcia(= Panourgia, destreza, num mau sentido, truques ou sofisma), assim também seja corrompida a vossa mente e se aparte da simplicidade e pureza devidas a Cristo” (2 Coríntios 11:3).


Muitos outros animais, particularmente os de natureza predatória, têm algum nível de astúcia. Paulo refere-se aos anciãos na igreja em Éfeso quando diz que se levantariam homens " falando coisas pervertidas para arrastar os discípulos atrás deles.” Pois, ele disse ele, “depois da minha partida, entre vós penetrarão lobos vorazes, que não pouparão o rebanho” (Atos 20:29-30). Mas nós precisamos de tomar especial atenção ao que Paulo está dizendo aos Coríntios. Ele diz que que “a serpente enganou Eva” – por outras palavras, aquele animal “astuto” enganou Eva – que é exatamente o que que diz o relato de Génesis.


Agora, certamente, se os livros apócrifos estão corretos, então Paulo deveria tê-lo confirmado aqui. Paul quereria que os seus amigos na fé “conhecessem o inimigo.” Era o infeliz réptil apenas “um instrumento” de um espírito do mal? Ele era apenas uma marioneta, como Charlie McCarthy, feito para parecer que falava, enquanto Satanás, o ventríloquo, como Edgar Bergen falando as suas palavras tentadoras a Eva? Mas Paulo não diz que a serpente parecia ser quem enganou Eva – ele diz que era a serpente – ele culpa a serpente. Agora se o tentador real era um espírito maligno, então Paulo pelo seu silêncio sobre este assunto, estaria a perpetuar o engano! Não só isso, mas Deus culpou a Deus a serpente –


“Então, o SENHOR Deus disse à serpente: Visto que isso fizeste, maldita és entre todos os animais domésticos e o és entre todos os animais selváticos; rastejarás sobre o teu ventre e comerás pó todos os dias da tua vida.”(Génesis 3:14).


Estava Deus punindo a marioneta ao invés do ventríloquo? “Perverteria Deus o direito ou perverteria o Todo-Poderoso a justiça?”(Jó 8:3) Certamente que não.


É O Testemunho dos Doze Patriarcas que dá a Belial ou Satanás o nome dec hefe dos anjos rebeldes (Test. Judá 25:3, etc). O desenvolvimento da ideia de um arqui-inimigo, de um ser que é o espírito do mal no pensamento Hebraico, particularmente no apocalíptico período, é impressionante. Os estudiosos descobriram traços do Satanás Hebraico em culturas mais antigas. Na Grécia, T.F. Glasson em A Influência Grega na Escatologia Judaica, Londres, 1961; em Canaã, Cyrus Gordon, “Mitologia Cananeia” em Mitologias do Mundo Antigo, Ed. Samuel Noah Kramer, Nova Iorque 1961, p. 183-215 e na Babilônia, Rikvah Schärf Kluger em Satanás no Antigo Testamento, Evanston, Illinois, 1967. Mas o mais notável e mais comumente visto pelos historiadores é a influência Iraniana. J. B. Russell comenta (página 218), “Existe um consenso entre os historiadores que a influência Iraniana pode ser vista na apocalíptica (Judaica) e na literatura de Qumran, se não até mesmo no Antigo Testamento e algunas semelhanças são de facto notáveis. No período pré-exílico todas as coisas no céu e na terra foram atribuídas a Javé, incluindo destruição e violência. Mas as semelhanças entre Ahriman e Satanás têm uma explicação no facto de que eles se desenvolveram após o Exílio. Os judeus facilmente entrariam em contato com as ideias de Zoroastro na Babilônia. Os paralelos entre os documentos apocalípticos e o Zoroastrismo são claros:


• O Diabo é o chefe de uma série de espíritos malignos,

dispostos em ordens e hierarquia.

 

• O Diabo está associado com a serpente.


• A função principal do Diabo é seduzir, acusar
e destruir.


• No cosmos trava-se um combate mortal. Os
filhos da luz lutam contra os filhos das trevas.


Quanto aos espíritos maliciosos menores que são referidos nos relatos evangélicos, estes se assemelham àqueles outros de outras culturas e foram em grande parte derivados daqueles de Canaã – isto certamente é verdade sobre o seu líder “Belzebu”.


“Então, lhe trouxeram um endemoninhado, cego e mudo; e ele o curou, passando o mudo a falar e a ver. E toda a multidão se admirava e dizia: É este, porventura, o Filho de David? Mas os fariseus, ouvindo isto, murmuravam: Este não expele demónios senão pelo poder de Belzebu, maioral dos demónios.” (Mateus 12:22-24).


Podemos notar aqui que a expressão “endemoninhado” expressa a causa da aflição na opinião dos espectadores, não a causa real. Compare isso com Lucas 24:4 – onde as mulheres que vieram para encontrar Jesus e ele não estava túmulo, ficaram “perplexas a esse respeito, apareceram-lhes dois varões com vestes resplandecentes.” Eles pareciam-se com homens, mas eles eram realmente anjos (versículo 23).


Os Fariseus certamente expressavam a crença em Belzebu como “príncipe dos demónios.” Mas Jesus não. Ele sabia que os descendentes de Canaã e outras nações adoravam um ídolo masculino chamado Baal, e um ídolo feminino chamado Astarote (Juízes10:6). O rei pagão de Moabe adorava Baal (Números 22:41), cujo nome completo era Baal-Peor (Números 25:3). Israel afastou-se de Deus para adorar Baal (Juízes 3:07; 8:33). O Filisteus que viveram na cidade Ecrom, adoravam seus ídolos, Baal-zebul, o que significa “Príncipe Baal.” Deus renomeou o ídolo Baalzebube (O príncipe das moscas). Acazias, rei de Israel em Samaria, estava doente e voltou-se para Baalzebube para ajuda (2 Reis 1:1-6, 16), mas o Senhor enviou Elias para repreendê-lo por acreditar num ídolo. E no entanto a Cristandade “ortodoxa" insiste em que Jesus acreditavaem Belzebu!


A tradição da Igreja diz, “os demónios são anjos que caíram com Satanás, que é chamado de príncipe dos demónios...” (Ryrie, Um exame da Doutrina Bíblica) – mas é esta realmente uma doutrina da Bíblia? – Quem disse isso?


A Bíblia diz que Belzebu foi deus dos Filisteus que viviam em Ekron (2 Reis 1:1 - 6). Jesus ensinou que não há um só Deus, o Pai (Marcos 12:28-33). Ele não acreditava em Belzebu, e ele não acreditou em qualquer outra espécie de “espírito mau” ou deus pagão. Jesus acreditava nas palavras do Salmo sobre Belzebu:


“Prata e ouro são os ídolos deles, obra das mãos de homens. Têm boca e não falam; têm olhos e não vêem;têm ouvidos e não ouvem; têm nariz e não cheiram. Suas mãos não apalpam; seus pés não andam; som nenhum lhes sai da garganta”(Salmo 115:4 -7 ).


Jesus mostrou que os Fariseus estavam errados no que eles disseram sobre seus milagres de cura:


“Se Satanás expele a Satanás, dividido está contra si mesmo; como, pois, subsistirá o seu reino?”
(Mateus 12:26). O Satanás que Jesus conhecia era diferente do aquele em que os Fariseus acreditavam.


As referências aos peludos sa'yr(sátiros) encontram-se em Levítico 16,1-23; 17:7, 2 Crónicas 11:15; Isaías 13:21, 34:14. Por outro lado nas nossas versões em Português de Isaías 34:14 paparece “animais noturnos” ou “fantasma” na realidade a palavra original é Lilith, um demónio feminino (Isaías 34:14) relacionado com Lamia e Empousa da mitologia Grega. Estas foram derivadas diretamente da Lilutu babilónica.

Outro estudioso2 refere-se ao Livro de Adão e Eva, que diz que no início, Deus, tendo criado Adão, chamou os anjos e juntou-os para admirarem a sua obra e ordenou que eles se curvassem perante o seu irmão humano. Miguel obedeceu, mas Satanás recusou dizendo, “Por que me pressionas? Eu não adorarei alguém mais jovem do que eu e inferior. Eu sou mais velho do que ele, ele é que deve me adorar!” (14:03).


Uma versão alternativa fala-nos como o arcanjo Azazel pecou por revelar aos seres humanos os segredos da metalurgia, uma revelação perniciosa que inspirou os homens para fazerem armas, e as mulheres adornarem-se com ouro, prata e cosméticos. Assim, os anjos caídos e sua prole demoníaca unidiu em ambos os sexos, violência, cobiça e luxúria.


O Livro dos Jubileus afirma que Deus designou para cada uma das nações um anjo dominante ou espírito “de modo que os possa desencaminhar”(!) (15:31), portanto, as nações adoram demónios, os quais Jubileus identifica com deuses estrangeiros. Pagels sublinha que a LXX de Crónicas 16:26 – “todos os deuses(Δαεμονες, demónios) são ídolos”. Jubileus adverte que aqueles que negligenciam a aliança de Deus estão sendo seduzidos pelo poder do mal, anjos caídos (1:20).


Os Essénios colocavam no centro da sua crença, uma batalha cósmica entre seres espirituais – anjos e demónios, Deus e Satanás. Esta seita Judaica explicou a ocupação estrangeira do seu país nesta crença. Para eles, as forças do mal tinham se infiltrado e invadiram o próprio povo de Deus, pela obra de Satanás, Mastema ou Príncipe das Trevas, um conceito que soa muito a Zoroastrismo. Uma dos livros sagrados dos Essénios é chamado de Rolo da Guerra dos Filhos da Luz Contra os Filhos das Trevas. Uma passagem diz:


“O Príncipe da Luz, tu escolheste paravir em nosso socorro, mas Satanás, o anjo Mastema, tu o criaste para o abismo; ele reina em escuridão, e o seu objetivo é trazer mal e o pecado.”


Referência já foi feita à “tradição dos anciãos”, que Jesus completamente denunciava, e advertiu seus discípulos para estarem alerta sobre com isso. Como vimos, essa modificação, e substituição posterior da palavra escrita de Deus não é uma característica exclusivamente Judaica. Os Gentios da igreja Cristã mais do que repetiram a história.


(continua)

 

Arthur Bull

Tradução: S. Mestre


NOTAS FINAIS
1. Jacques Duchesne-Guillemin (artigo sobre
Zoroastrismo, Enciclopédia Britânica, 1967)
Foi professor de estudos Indo-iraniano, Liege
University, na Bélgica.
2. Elaine Pagels, autora de A Origem de Satanás (Publicado em 1995), como professora de religião na Universidade de Princeton University. Esta “distinta historiadora de religião” traça a evolução de Satanás desde as suas origens. Lendo e re-lendo relatos bíblicos e extra-bíblicos de anjos, ela aprendeu que “enquanto os anjos muitas vezes aparecem na Bíblia Hebraica, Satanás, juntamente com outros anjos caídos ou demónios, está virtualmente ausente. Mas em certos grupos Judaicos do primeiro século, com destaque para os Essénios... a figura variadamente chamada de Satanás, Belzebu ou Belial também começara a assumir uma importância central.”

O DIABO E OS SEUS COMPANHEIROS DE ONDE VÊM? O que é o Diabo, onde está o Diabo, e quem é o Diabo? (PARTE 3)

S. Mestre, 03.08.10

Referência já foi feita à “tradição dos anciãos”, que Jesus completamente denunciava, e advertiu seus discípulos para estarem alerta sobre com isso. Como vimos, essa modificação, e substituição posterior da palavra escrita de Deus não é uma característica exclusivamente Judaica. Os Gentios da igreja Cristã mais do que repetiram a história. Em vez dos “anciãos” Judeus, há agora os “Pais da Igreja” do que nós chamamos de apostasia Cristã. Isto pode parecer uma maneira de falar dura, cruel e inclemente de indivíduos altamente venerados. Os seus escritos parecem receber a deferência logo a seguir da Sagrada Escritura, se não for mesmo recebidos com igual ou ainda maior autoridade. Isto está intimamente associado com a doutrina da sucessão apostólica, que aceita a alegação de que o Espírito Santo continua a guiar e inspirar as palavras dos líderes da igreja. Mas o que podemos aprender desses primeiros Pais da igreja Cristã, assim chamados em oposição ao mandamento de Jesus “a ninguém na terra chameis vosso pai, porque um só é o vosso Pai, o qual está nos céus” - Mateus 23:09?


Justino Mártir era originalmente um adorador dos deuses pagãos, mas ele estava disposto a ouvir o que os Cristãos tinham a dizer. Foi-lhe dito que a mente humana está infestada por forças demoníacas que distorcem e confundem o seu pensamento. Ele tinha que receber o Espírito Divino para iluminar a sua mente. Mas primeiro ele teria que se submeter a exorcismo. Tendo solicitado o batismo, foi-lhe perguntado se ele estava disposto a “renunciar ao diabo e seus anjos”, que incluía os deuses, aos quais agora via como espíritos maus. Ele foi então informado de que tinha que receber o Espírito Divino, um poder para iluminar a sua mente. O celebrante, em seguida, invocou que o Espírito descesse sobre ele. Como um novo Cristão, Justino agora via todo o universo como um campo de batalha onde se confrontam forças cósmicas. Enquanto ele era um pagão, ele vira-se sujeito a diversas forças humanas e divinas. Agora, ele via todos os problemas como sendo demoníacos. Ele atribui aos Cristãos o poder de exorcizar os demónios. “But(1) ele não produz nenhuma instância particular de um exercício de poder milagroso, e, portanto, mão nos oferece nenhuma oportunidade de aplicar os testes pelos quais a credibilidade dos milagres devem ser julgados”.


Taciano disse aos pagãos que todos os poderes sobrenaturais que eles adoravam eram seres malignos que os mantinham cativos. Ele disse que todos os poderes que eles adoravam não eram nada mais do que a precipitação continua de uma rebelião cósmica primordial. Ele disse que inicialmente todos os seres sobrenaturais eram livres, mas ele explica, com base em relatos Judaicos da queda dos anjos - “o primogénito destes se rebelou contra Deus e se tornou em demónio ... e aqueles que o imitam ... e as suas ilusões , tornaram-se um exército de demónios”. Este enxame de demónios enfurecidos quando punidos pela sua apostasia, são, no entanto, demasiado fracos para retaliar contra Deus. Impedidos de destruir totalmente o universo, dirigiram todas as suas energias para escravizar a humanidade. “Foram os demónios”, explicou Taciano, “os filhos dos anjos caídos que inventaram o destino”. Taciano desafiou abertamente a autoridade dos governantes pagãos. Ele disse que a fidelidade a Deus libertava "o crente de inumeráveis tiranos demoníacos e, simultaneamente, de todos os milhares de governantes humanos que eles secretamente controlam”.


Orígenes foi além de Taciano. Depois de ver o pai morto pelas autoridades pagãs, ele resolveu ser um guerreiro do lado de Deus contra as forças de Satanás. Ele se tornou o primeiro Cristão a defender publicamente que as pessoas têm um direito moral inato para assassinar tiranos. Ele escreveu, "... os Cristãos quando tiranizados ... pelo Diabo, devido a associações contrárias às leis do diabo ... a revoltarem-se contra um governo que é bárbaro e despótico”. Ele caracterizou todas as leis e as pessoas hostis aos Cristãos como inspiradas pelo demónio . Esta atitude em relação a governos vai contra o que o apóstolo Paulo disse –

 

“Toda a alma esteja sujeita às potestades superiores; porque não há potestade que não venha de Deus; e as potestades que há foram ordenadas por Deus. Por isso quem resiste à potestade resiste à ordenação de Deus; e os que resistem trarão sobre si mesmos a condenação. Portanto é necessário que lhe estejais sujeitos, não somente pelo castigo, mas também pela consciência” (Romanos 13:1-7).

 

Orígenes disse que Jesus morreu “para destruir um grande demónio ... na realidade, o governante dos demónios, que mantinham em sujeição as almas da humanidade”. Aliás, como mais uma indicação de sua falta de conhecimento da Bíblia, afirmou “com confiança” que Jerusalém, que foi destruída no ano 70 d.C. “nunca será restaurada ao seu estado anterior”. Mas ele continua, a respeito da sua compreensão da origem do mal, que muitos casos de maldade humana, e até mesmo catástrofes naturais, como enchentes, são instigados “por demónios do mal e anjos maus”. Esta opinião foi a raiz do sofrimento humano às mãos da Igreja na Europa medieval, como veremos.


Durante o segundo século os líderes da igreja que promoveram a “sucessão apostólica” amplamente copiaram e distribuíram vários escritos de homens que eles chamavam de "pais da igreja apostólica”. Todos estes tendem a enfatizar a autoridade crescente do clero. Entre os escritos desses “pais apostólicos” está a carta de Barnabé, na qual a vida cristã é retratada como o espírito de Deus contendendo contra Satanás. Ele exorta os crentes à vigilância moral, de modo que “o diabo não possa ter oportunidade de entrar” na igreja. Ele especificamente os adverte contra as coisas Judaicas, que ele diz, “transgrediram, porque um anjo do mal levou-os ao erro”. Escritura está em silêncio sobre isso.


Irineu, bispo de Lyon, afirmou a autoridade da sucessão apostólica. No seu ataque em cinco volumes contra aqueles que se opuseram à doutrina oficial da Igreja, Contra as Heresias, ele chamou os hereges de “agentes secretos de Satanás”. Ele disse que as doutrinas dos hereges eram inspiradas por Satanás.


Tertuliano aconselhou os membros da igreja contra todos os argumentos sobre a interpretação das Escrituras – discussão tal “que afeta o estómago ou o cérebro”. Como hereges aparecem com argumentos tão engenhosos e convincentes tirados das Escrituras? A sua inspiração vem, diz Tertuliano “do diabo, é claro, a quem pertencem as artimanhas que distorcem a verdade”.


Os Cristãos Gnósticos compartilhavam a crença comum em espíritos malignos. Valentim diz que, além da graça de Deus, o coração humano é uma “morada de muitos demónios”. Num livro gnóstico, o Evangelho da Verdade tem a instrução para os Cristãos Cnósticos, “... não se torne um lugar de morada para o diabo, por você já o destruiu.” Por volta do final do terceiro século, Warfield observa que nem um único escritor alegou expulsar qualquer demónio, ou que tenha atribuído esse feito a qualquer nome conhecido na igreja, e sem uma única instância de tal procedimento ter sido registado em detalhe.


Tendo investigado as origens extra-bíblicas do conceito do Diabo pessoal, ainda há mais a ser visto sobre ele. Este mítico super-inimigo carrega um carrinho de mão cheio de bagagem. Ou seja, ele não está sozinho na mitologia. No seu auge, o Diabo pessoal foi cercado por um número de associados e companheiros de viagem que estavam muito na cabeça das pessoas. Os tempos mudaram desde então. Alguns desses companheiros são mencionados nas igrejas Cristãs ocasionalmente, alguns raramente, outros quase nunca.


O Diabo ainda é considerado por alguns como sendo ajudado por miríades de demónios. Estes são considerados como espíritos malignos menores que têm prazer em trazer problemas e desgraças à humanidade. Referência a demónios entre as igrejas protestantes é um pouco variado nos tempos modernos. Um famoso pregador pentecostal e curandeiro pela fé, na sua autobiografia(2) refere-se aos demónios uma vez no seu livro como apenas uma das diversas causas da infelicidade humana e doenças.


Num resumo publicado da doutrina protestante(3) são mencionados demónios. Satanás é considerado ser “o príncipe dos demónios”, citando Mateus 12:24. Isto é, evidentemente, a aceitação da teologia Farisaica, pois eles são os que afirmaram isto, não Jesus. E nós sabemos como Jesus rejeitou suas doutrinas. Mas neste Resumo Protestante existe uma tal inconsistência no conceito de demónios, que é uma espanto como o autor ou qualquer um dos seus companheiros podem aderir a ele. Primeiro ele diz que os demónios trabalham para Satanás para se oporem a Deus. Depois, mais abaixo na mesma página ele diz que às vezes Deus usa os demónios na realização de seus planos, concluindo que mesmo essas criaturas estão sob o controle completo e constante do Todo-Poderoso. Na verdade, essa crença em demónios está em perfeita consonância com a “doutrina dos Fariseus” contra a qual Jesus advertiu seus discípulos (Mateus 16:12). Em vez de concordar com a história Farisaica sobre Belzebu, Jesus manifestou-se contra ela –

 

“Jesus, porém, conhecendo os seus pensamentos, disse-lhes: Todo o reino dividido contra si mesmo é devastado; e toda a cidade, ou casa, dividida contra si mesma não subsistirá. E, se Satanás expulsa a Satanás, está dividido contra si mesmo; como subsistirá, pois, o seu reino?”- (Mateus 12:25-26.)

 

Em primeiro lugar, Jesus mostra, que era ridícula a alegação de que ele estava em conluio com o “príncipe” daqueles que ele “expulsava”! Mas o argumento de Jesus sobre um reino dividido contra si mesmo se aplica também a esta divisão da função dos demónios, expressa no Resumo Protestante. Na realidade, isto é a ponta do icebergue, por assim dizer, e demonstra como a Cristandade tem sido corrompida, não só por esta “fábula” (1 Timóteo 1:04, 4:7, 2 Timóteo 4:4 e Tito 1:14), mas por muitos outros também.


Este autor, como o curandeiro de fé acima mencionado, faz uma distinção entre doença comum e possessão demoníaca. Soando um pouco inseguro dos fundamentos bíblicos para a sua afirmação, ele diz, que a possessão demoníaca “parece significar que um demónio ou demónios residem numa pessoa, exercendo controle direto sobre a mente e do corpo dessa pessoas.”


Ele afirma que cada Cristão é possuído pelo Espírito Santo e, portanto, ele não pode ao mesmo tempo ser possuídos por demónios. Possivelmente, ao antecipar uma pergunta sobre os Cristãos Evangélicos que têm doenças mentais, emocional ou similares, ele diz que “um Cristão pode ser afetado gravemente pela atividade demoníaca”. Um bom ponto na verdade que pede uma explicação, mas nenhuma é oferecida. Nem é qualquer explicação oferecida, para explicar como a medicina moderna é capaz de tratar a doença, que as pessoas, ignorantes da ciência médica, anteriormente atribuíam a espíritos maus.


Foi observado(14) mais de uma vez que, com a ascensão do Cristianismo na Europa, o mundo de todos os deuses e espíritos dos pagãos foram condenados ao mal, e em liga com o Diabo. Warfield cita Harnack, A Expansão do Cristianismo Primitivo,

 

"O mundo inteiro e a atmosfera circundante foram preenchidos com demónios, e não apenas a idolatria, mas cada fase e forma de vida era governada por eles, eles se sentavam em tronos, pairavam sobre berços; a Terra era literalmente um inferno”.

 

Esta crença está em contradição directa com o Apóstolo Paulo –

 

“Sabemos que o ídolo, de si mesmo, nada é no mundo e que não há senão um só Deus. Porque, ainda que há também alguns que se chamem deuses, quer no céu ou sobre a terra, como há muitos deuses e muitos senhores, todavia, para nós há um só Deus, o Pai.” – 1 Coríntios 8:4-6.

 

Não obstante , Orígenes, Agostinho e os Pais da igreja, em geral, estavam convencidos de que os magos estavam em conluio com o diabo e os seus demónios numa grande luta contra o bem. Acreditando estarem a ser contestados por um movimento organizado de hereges que praticavam necromancia (comunicação com os mortos ), a igreja desejava o seu próprio oficio do exorcismo. Feitiços, por vezes, contendo os nomes mágicos de espíritos emparticular, foram utilizados para repelir os ataques dos demónios.


E assim o exorcismo tornou-se numa cerimónia na igreja Cristã, usado para expulsar demónios de pessoas que estão sob o seu poder. Mas houve mais de uma ocasião para realizar exorcismo na Igreja. Cerca de 250 d.C. O exorcismo se tornou uma das cerimónias realizadas antes dos novos membros serem batizados. Manteve-se parte integrante do serviço batismal Católico - não para expulsar demónios, mas para remover os supostos obstáculos à “graça”, resultantes dos efeitos do “pecado original” e do poder de Satanás sobre a natureza humana decaída. Além disso, as coisas inanimadas, como água, sal e óleo, que serão utilizados no serviço religioso, recebem exorcismo antes de serem abençoados ou consagrados.


É notável que, num tempo em que há muito pouca indicação da crença em "espíritos malignos" entre as pessoas comuns no mundo ocidental, o Vaticano está mostrando um renovado interesse no assunto. Em 1999, atualizaram o Rito do Exorcismo(5) pela primeira vez desde 1614. Em 2005, o Vaticano lançou um novo curso(16) no prestígiado colégio Athenaeum Pontificium Apostolorum. Reservado aos padres e estudantes de teologia, o curso destina-se a “prepará-los para distinguir os verdadeiros casos de possessão diabólica de problemas mentais, e assim possam ser encaminhados para exorcistas”. Muitos dos que estão a tirar o curso ou querem ser exorcistas ou eram exorcistas, dos quais existem 400 na Itália. Na mesma notícia, outra serviço de notícias(17) acrescentou o seguinte comentário por Francesco Bamonte, um exorcista conhecido de Roma. Ele disse que “várias centenas” de pessoas veem à sua equipa todos anos, achando que estão possuídas. Depois de aconselhamento, ele disse, “Eu faço talvez cerca de vinte exorcismos cada ano”. Enquanto no que se refere aos specialistas, “85% - 90% dessas pessoas não estão nem nunca estiveram possuidas ou foram atacadas pelo diabo”. Está sendo considerada a re-introdução de uma oração durante a missa de São Miguel Arcanjo, que se acredita ser o principal protetor contra o mal. Esta prática contradiz diretamente a liminar do apóstolo Paulo:

 

“Ninguém se faça árbitro contra vós outros, pretextando humildade e culto dos anjos, baseando-se em visões, enfatuado, sem motivo algum, na sua mente carnal” – Colossenses 2:18 .


O diário Polaco Gazeta Wyborcza relatou em Dezembro de 2007 que a Igreja Católica no país havia aprovado planos para um Centro de Exorcismo na cidade de Poczernin. No que parece ser controlo de danos na sequência de alguma imprensa má sobre isso na Alemanha, o coordenador regional de exorcistas Polacos afirmou que a Polónia definitivamente precisa de mais exorcistas. Ele recusou um pedido para uma entrevista com a imprensa alemã, talvez fartos da sua fascinação com algo que é basicamente um fenómeno bastante comum na Polónia. Tão comum, na verdade, que em Julho de 2007, a Polónia foi o anfitrião do Quarto Congresso Internacional de Exorcistas, acolhendo cerca de 330 exorcistas praticantes de 29 países. O porta-voz declarou que é a visão da sua igreja, que as curas de Jesus e dos apóstolos era o exorcismo. Além disso, porque o exorcismo foi usado nos tempos do Novo Testamento, é uma prática adequada para os dias de hoje. Isso ocorre porque a derrota do Diabo é uma parte fundamental da teologia Cristã. "O diabo e os espíritos maus são entidades mitológicas mas são no entanto “reais” – assim como “Adão" é uma realidade na teologia Cristã" – uma indicação clara do lugar que as Escrituras têm na sua teologia.

 


Outra história pela SMH News International, começava assim, “Compartilha a sua casa com fantasmas e não sabe quem chamar? Tente a Igreja Anglicana. O Reverendíssimo Graeme Lawrence, decano de Newcastle (Austrália), disse que recentemente abençoou a casa de um jovem casal que acreditava que peças de mobiliário foram movidas em sua casa. Ele disse que a igreja tinha um longo histórico de prestação de ritos e cerimónias de bênçãos e exorcismos, e a Igreja na Grã-Bretanha, muitas vezes elegia um padre sénior como exorcista residente. O Bispo de South Sydney, Robert Forsythe disse que exorcismos eram raros, mas que eram realizados.


Agora, se olharmos para a história dos demónios, possessão demoníaca e exorcismo, fica claro que uma grande mudança ocorreu no últimos séculos. O diabo e os seus demónios se tornaram muito menos bem sucedidos nos seus esforços para possuir as pessoas do que nos tempos antigos. Estão eles perdendo o interesse no seu passatempo diabólico e buscando outras atividades? As pessoas estão agora mais devotas e religiosas e mais capazes de resistir a possessão de espíritos malignos? Ou será que em vez de todas as doenças mentais de causa desconhecida, apenas 10% -15% estão agora nessa categoria?


Mas, na verdade, a origem totalmente pagã da crença em demónios e espíritos do mal está fora de questão. É verdade que na literatura rabínica da época do Novo Testamento, os demónios são representados como seres espirituais que têm sido dada permissão pelo Senhor para seduzir os homens, ou fazer-lhes danos físicos para o castigo dos seus pecados. Mas a observação não pode ser negada de que não havia medo de tais coisas entre os antigos Hebreus. Mas, quando os Hebreus se familiarizaram, com as concepções do Zoroastrimo do espírito do mundo, especialmente durante o exílio Babilónico, eles passaram a acreditar que Deus tinha um “adversário”, um arqui-demónio, Satanás, que tinha sob sua direção, muitos demónios menores. Zoroastro não inventou a ideia de demónios, que têm origens muito mais antigas na demonologia da Mesopotâmia. Os terríveis Anunnaki eram os carcereiros do inferno. A crença em espíritos do mal menores pode ser visto nas diversas mitologias nacionais irradiando para fora do berço da civilização.


Finalmente, foi demonstrado que o exorcismo foi praticado desde tempos imemoriais. Deve-se reconhecer que muitos dos casos de possessão eram, na realidade de origem psicopatológica. Uma “revisão imparcial da feitiçaria, bruxaria, possessão e fenómenos cognatos, e avaliação das evidências existentes parecem demonstrar que quase todos os casos foram sem dúvida devido à mórbida e histérica condição mental provocada entre os supersticiosos e e pessoas com pouca formação por uma atmosfera que onde permeia o terror, mistério e a desconfiança”.


E assim, magia, bruxaria e feitiçaria estão muito interligados na história do diabo. Orígenes, Agostinho e os Pais da igreja, em geral, estavam convencidos de que os magos estavam em conluio com o diabo e os seus demónios numa grande luta contra o bem. “Mágicos, portanto, devem ser destruídos e não apenas julgados como hipócritas ou charlatões”. A ligação do Diabo com a magia adquiriu para essa prática um significado sinistro. A mágica passou a ser associada com bruxaria e feitiçaria – a utilização de feitiços ou a obtenção ilícita de predições, e a necromancia (conversar com os mortos) – são termos que adquiriram um significado semelhante. Esta magia não deve ser confundida com a forma de entretenimento teatral, que é apropriadamente chamada de invocação. Magia negra e o medo dela não morreu na Idade Média. Na Inglaterra, um acto do parlamento em 1542 tornou a bruxaria, magia e encantamento punível com a morte. Uma nova lei aprovada em 1563 permaneceu em vigor até 1763.


Mas a tentativa de desviar as forças do mal por constrangimento quase mágico e compulsão prontamente deu lugar a métodos de persuasão, que por sua vez levou a estabelecer um acordo ou pacto com o diabo.

 

(continua)

 

Arthur Bull

Tradução: S. Mestre

 

NOTAS

 

  1. Benjamin Breckinridge Warfield eram um American o aderente do Calvinismo. um teólogo conservador, defendeu bravamente as Escrituras como a Palavra de Deus totalmente inspirada contra racionalistas e ideias modernistas que eram disseminadas em torno dele. Na sua série de palestras, posteriormente publicado no livro “Milagres Contrafeitos (publicado em 1918)”, ele argumentou com força que a idade dos milagres cessara. Ele falou muitos dos “milagres” fraudulentos que as várias organizações religiosas têm reivindicado ao longo dos anos.

    2. Oral Roberts, “Espere um milagre”, p. 108. Thomas Nelson,1995.

    3. Charles C. Ryrie, “Um exame da doutrina bíblica”, a Moody Press, 1972.

    4. Professor J. B. Noss, “Religiões do Homem”

     

    5.www.dw-world 2008/01/23

    6. Channel News Asia, 18 de fevereiro de 2005.

    7. CNS, Serviço de Notícias Católico

 

O DIABO E OS SEUS COMPANHEIROS DE ONDE VÊM? O que é o Diabo, onde está o Diabo, e quem é o Diabo? (PARTE 4)

S. Mestre, 03.08.10

Mas a tentativa de desviar as forças do mal por constrangimento quase mágico e compulsão prontamente deu lugar a métodos de persuasão, que por sua vez levou a estabelecer um acordo ou pacto com o diabo.

 


Instâncias do pacto ocorrem a partir do século 4 em diante, mas o caso mais célebre de popular
mitologia popular é o de Fausto. Uma espécie de diabolatria (crença no poder quase ilimitado
do Diabo), que floresceu entre os primeiros Luteranos, deliberou a condenação eterna para Fausto,
e tanto mais porque ele tinha o recurso à mágica, a fim de satisfazer o seu desejo do conhecimento. Fausto, também chamado Faustus, ou doutor Fausto, foi o herói de um das mais duradouras
lendas do folclore e da literatura ocidental, a história de um necromante ou astrólogo alemão
que vende a sua alma ao diabo em troca de conhecimento e poder. Houve, de fato, um Fausto histórico, que mais uma vez aludiu ao diabo como o seu Schwager, ou compincha. Ele morreu
em 1540, deixando uma lenda emaranhada de feitiçaria e alquimia, astrologia e adivinhação, estudos teológicos e diabólicos, e necromancia. Referências contemporâneas indicam que ele era
viajado e muito bem conhecido, mas todos os observadores testemunham a sua má reputação. Estudiosos humanistas contemporâneos zombavam das suas proezas mágicas como mesquinhas e fraudulentas, mas foram levadaa a sério pelo clero Luterano, entre eles Martin Luther e Philippe Melanchthon.


Os magos do faraó, cujo sonho José interpretou, eram, pela palavra usada para descrevê-los, horoscopistas ou astrólogos. Assim também eram aqueles que o Faraó mais tarde chamou em
vão para ultrapassarem o poder de Javé demonstrado por Moisés. Esses magos admitiram apenas a quando da terceira praga que seus poderes foram meras trapaças, declarando, “este é o dedo de Deus!”


Os magos a serviço de tanto de Nabucodonosor como de Belsazar, descritos no livro de Daniel, eram da mesma natureza. Simão, um residente de Samaria, usava “mágica”. Somos informados de que ele conseguiu convencer as pessoas por sua astúcia que ele era “Ora, havia certo homem, chamado Simão, que ali praticava a mágica, iludindo o povo de Samaria, insinuando ser ele grande vulto; ao qual todos davam ouvidos, do menor ao maior, dizendo: Este homem é o poder de Deus”, Atos 8:9-11. Simão, que sem dúvida, se sentiu ameaçado pelo inegável poder do Espírito Santo, em Pedro e João, em primeiro lugar ofereceu uma grande quantia em dinheiro para obter parte desse poder. Quando Pedro se recusou, e expôs os motivos egoístas do mágico, ele assim como os astrólogos do Faraó, reconheceu que este, em contraste com sua própria astúcia, era o poder de Deus.


Logo no início do século 17(1) o Francês Henri Bouguet produziu Discursos sobre a Feitiçaria. Este era para ser usado como um manual para a deteção, apreensão e punição de bruxas. Mesmo
crianças eram torturadass e mortas, se eram consideradas bruxas. É realmente irónico que a
feitiçaria é uma prática notável da Babilónia, a Grande, o próprio sistema que supervisionou a
destruição dos hereges, acusando-os de feitiçaria.


“... Todas as nações foram seduzidas pela tua feitiçaria(pharmakeia = mágica). E nela se achou sangue de profetas, de santos e de todos os que foram mortos sobre a terra.”(Apocalipse 18:23 - 24).


Esta palavra, literalmente, refere-se à mistura de poções e venenos, que é frequentemente envolvidos na prática de feiticeiro. Pode ser visto noutra outra descrição do mesmo sistema em Apocalipse 07:04 de uma “mulher... tendo na mão um cálice de ouro transbordante de abominações e com as imundícias da sua prostituição”(suas doutrinas venenosas). Todos os que têem absorvido os seus falsos ensinamentos foram enganados por eles. Parte do vinho é a crença em um espírito do mal pessoal, o diabo e seus demônios. O prato “nobre” entregue a Sísera levou-o à sua morte prematuro (Juízes 5:25), e a taça agora oferecida pela“Babilónia, a Grande" brilha de ouro, e o simplório que bebe “sem saber que isto lhe custará a vida”(Provérbios 7:23). Tudo porque ele se recusa a ler as Escrituras por si mesmo, e em vez disso coloca o seu bem-estar eterno nas mãos
de um “mercenário””(João 10:12-13).


Magia e bruxaria têm as suas origens na paganismo antigo. Estas práticas foram encontrados em
Canaã, quando Israel chegou. A lei de Moisés legislava contra isso “A feiticeira não deixarás viver.”(Êxodo 22:18). A bruxa que Saul consultou também era uma necromante, que foi convidada pelo rei a fazer “subir” o que estava morto (1 Samuel 28). “Não se achará entre ti quem faça passar pelo fogo o seu filho ou a sua filha, nem adivinhador, nem prognosticador, nem agoureiro, nem feiticeiro; nem encantador, nem necromante, nem mágico, nem quem consulte os mortos;

pois todo aquele que faz tal coisa é abominação ao SENHOR”(Deuteronómio18:10-12). A má rainha Jezabel era notória pela seu uso assíduo da bruxaria (2 Reis 9:22). O rei Manassés foi, evidentemente, treinado desde a infância, para que ele “adivinhava pelas nuvens, era agoureiro, praticava feitiçarias, tratava com necromantes e feiticeiros e prosseguiu em fazer o que era mau perante o SENHOR, para o provocar à ira”(2 Crónicas 33:6). Ambos Nínive e Babilónia
foram campeões e divulgadores de feitiçaria, e por isso foram levados à destruição por Deus
(Isaías 47:9-12; Naum 3:4). Porque eram estas práticas tão odiosas para Deus? Porque elas ensinaram que o homem tem uma natureza divina (a alma imortal), que é uma mentira (ver Ezequiel 18:04, 20).



A Magia e a bruxaria também se encontravam no mundo Gentio em que os apóstolos de Cristo
foram pregar o evangelho. Como vimos, tempos mais tarde, quando a igreja tornou-se
corrompida, magia, bruxaria e sua assistente filosofia foram aceites como verdadeiros poderes.


“Os clérigos, quer de ofício ou a partir da ignorância, favoreceram o progresso(2) de uma crença
que certamente contribuiu de forma poderosa, para alargar a sua autoridade sobre a mente humana”


O mesmo autor refere-se às enormes ficções sendo divulgadas, sobre as façanhascde espíritos malignos. Por exemplo, o sucesso das incursões dos sarracenos, e mais tarde os turcos, no Médio Oriente Cristão, foi atribuído a intervenção de hordas de demónios. Estes relatos fictícios não eram menos liberais em atribuir aos Cristãos meios extraordinários de defesa por meio da proteção direta dos “santos” mortos, que possuem o poder de fazer milagres, tal como é referido em 2 Tessalonicenses 2:8-9.


Restos das superstições pagãs são percebidas pelo autor acima referido no seu próprio país, na Escócia. “As tribos celtas ... possuía, ... uma tendência natural para a adoração do o princípio do mal. Eles achavam que vale a pena propiciar-lhes vários ritos e orações.” Restos dessas superstições foram registados em 1769, quando um notável viajante(3) testemumhou a cerimónia do Baalltein, Beltane, ou Primeiro de Maio, nas terras altas. Bolos especiais eram ritualmente preparados, depois, eram oferecidos às feras que eles, ou melhor, os seres, dos quais eram agentes, poderiam poupar os rebanhos e manadas. O viajante menciona que um outro festival do mesmo tipo que foi, no seu tempo, observado em Gloucester. Outro costume permaneceu na Escócia até mais tarde. Em muitas paróquias existia por muito tempo mesmo contra uma ordenança da igreja para parar com isso, uma certaporção de terra, chamado Croft de Gudeman. Nunca era arada ou cultivada, mas era preservada no seu estado selvagem nativo, como o Temenos de um templo pagão. O Croft de Gudeman era considerado como a porção do próprio arqui-demónio. Se um arado entrasse no seu solo, o espíritos elementares testemunhariam o seu descontentamento com tempestades e trovões. Na memória de Scott, muitos lugares como esse, santificados à esterilidade por alguma superstição popular, existiam, tanto no País de Gales e na Irlanda, bem como na Escócia. Pela mesma razão,
montes chamados Sith Bhruaith(4) eram respeitados, e era considerada ilegal e perigoso cortar
madeira, cavar a terra, remover pedras, ou perturbar-los de alguma forma.

 

Não estaria fora de lugar para deixar claro a atitude de Scott em relação às Escrituras(5) ao
relatar um incidente cerca de uma semana antes da sua morte. Sir Walter Scott disse ao seu genro, “Lê-me o livro”, e quando a recebeu uma questão como resposta era: “Que livro?", o autor moribundo respondeu “Será que é preciso perguntar isso?” – Só existe um. Scott explicou a longa continuação das superstições pagãs antigas primeirmente referindo-se ao modo de conversão das pessoas ao Cristianismo. Seria difícil de imaginar aqueles que foram convertidos em massa ter adquirido um conhecimento do Cristianismo, no sentido verdadeiro e perfeito da palavra. Era frequentemente o caso que uma tribo inteira assumia a religião que um dos chefes favorecido tinha
escolhido, cujo exemplo seguiam simplesmente por amor e lealdade ao mesmo. Estes conversos precipitados, professando-se cristãos, não foram demovidos da sua antiga crença, nem
instruídos na sua nova crença. Habituados a uma pluralidade de divindades, eles podiam muito bem ter sido da opinião que, ao adoptar o Deus dos Cristãos, eles não haviam renunciado do serviço a
qualquer poder inferior.

 

Depois da vitória de Constantino a favor dos Cristão, tornou-se um crime um Cristão converter-se a Pã ou Ceres. Isto seria voltar a trás aos ritos do paganismo, e seria excomungado. Mas ele ainda podia andar na sua superstição, sendo deixado em liberdade para temer estas divindades antigas nas suas novas capacidades, como demónios. Assim, embora os tronos de Júpiter, e das divindades superiores do Panteão pagão, fossem totalmente derrubados e quebrados em pedaços,
fragmentos ds sua adoração, e muitos dos seus ritos, sobreviveram à conversão ao Cristianismo.


Isto pode ser visto em superstições que chegaram aos nossos tempos. Nas costas do Mar Báltico era adorado Deus rio ou oceano, Nixas ou Nicksa. Em meio à penumbra dos invernos e tempestades avassaladoras dessas regiões sombrias, esse demônio foi escolhido como o pois mais adverso ao homem. Intimamente relacionado num aspecto mais suave com algumas Naiads da Alemanha,
chamadas Nixa. O Velho Nick, conhecido na Inglaterra, é igualmente um descendente genuíno do deus do mar do norte. O marinheiros Britânicos, que não temiam mais nada, confessavam o seu terror deste terrível ser. O Bhar-guest, ou Bhar-Geist, era conhecido em várias partes da Inglaterra, e particularmente em Yorkshire, também chamado de Dobie, um nome de origem teutônica.


Devemos notar que a crença em fadas e outros espíritos menores, apenas de passagem, embora Scott tenha escrito um capítulo inteiro sobre o assunto como uma outra indicação da propensão da natureza humana para tal crença. O poeta Chaucer em “A esposa de Bath's Tale” , retrata de forma artística quão cheia de fadas estava a antiga Grã-Bretanha, e as mentes dos Celtas. Ele fala em seguida, em levantar dúvidas sobre essa crença ainda remanescente no tempo Eduardo III:

 


“Nos velhos tempos do Rei Artur,
Do qual os Bretões falam com grande honra,
Toda esta terra se encheu de fadas;
A rainha Elfica, com sua companhia alegre,
Dançava muitas vezes em muitas pradarias verdes... "


O bardo de Woodstock segue e mostra que o efeito da pregação dos frades itinerantes
causou uma grande queda para tal crença. Quando nós vemos a opinião que manifestou Chaucer
sobre o clero regular do seu tempo, em algumas de seus outros contos, somos tentados, observa Scott, a suspeitar de alguma mistura de ironia no elogio. Dr. Corbett, Bispo de Oxford e de
Norwich no início do século 17, “um poeta com uma veia de humor não indigno do próprio Geoffrey,” escreveu O Adeus às Fadas e atrasou o seu desaparecimento final da fé popular em fadas até ao reino da Rainha Elizabete.


“... Lamentem, lamentem, velhos abades,
O comando das fadas perdido;
Elas mudavam os bebés dos padres,
Mas algumas mudaram a vossa terra;
E todos os vossos filhos se originam daí
Agora são Puritanos crescidos ...
Ao que podemos constatar, as fadas
Eram da antiga profissão,
Suas canções eram Ave Marias,
Suas danças eram procissões,
Mas agora, infelizmente! todos elas estão mortas ...”


Damos um olhar furtivo final à época das fadas, quando Scott, cita Descoberta da Bruxaria de Reginald Scot, 1584. A mistura de crenças com a do Diabo é bastante reveladora.
"Um patife num lençol branco enganou e abusou de muitos milhares, especialmente quando Robin Bom-Rapaz (uma fada) mantinha esse tipo de coisas no país. Na nossa infância, as nossas amas nos aterrorizavam com um diabo medonho com cornos na cabeça, fogo na boca, e com rabo; olhos profundos como um poço, presas como as de um cão, garras como de um urso... e uma voz bramando como um leão, e por isso nos assustávamos e ficávamos com medo quando alguém gritava “Buuuuuuuuu!” e eles nos amedrontaram de tal maneira com bichos papões, espíritos, bruxas, diabretes, elfos, feiticeiras, sátiros, Pã, faunos, silvanos, tritões, centauros, anões, gigantes, mafarricos, conjuradores, ninfas, mutantes, íncubos, a fada Robin Bom-rapaz, […] e outros tais papões, que até tínhamos medo das nossas próprias sombras, de tal maneira, que muitos nunca têm medo do diabo a não ser numa noite escura; e então até uma ovelha sem chifres é uma fera perigosa, e muitas vezes é tomada como a alma do nosso pai, especialmente num cemitério onde um homem correto e rijo nunca deveria passar de noite já que o seu cabelo até se poria de pé. Bem, graças a Deus, que esta malvada e cobarde infidelidade, desde da pregação do Evangelho, é em parte esquecida, e sem dúvida (ele esperava em vão!) o resto destas ilusões irão, dentro de pouco tempo, pela graça de Deus, serão detectadas, e desaparecerão.”

 

Infelizmente, muitos ainda se apegam à velha ilusão – o medo do diabo e dos seus demónios ainda está firmemente enraizado na Cristandade deste dia.


Por outro lado, pode ser visto a crença no poder das bruxas. Tácito escreve sobre as mulheres entre as tribos Alemãs, dizendo palavras na direção dos seus exércitos. A mais bem sucedida tornou-se Haxa, ou a sacerdotisa principal, a partir da qual vem da palavra
Hexe, agora usado em Inglês para descrever uma bruxa ou feitiço(hex). Assim que a tribo foi convertida ao Cristianismo, as bruxas perderam o seu alto respeito e tornaram-se odiosas. Se elas pretendiam manter a sua influência eram desprezadas como impostores ou temidas pelo seu poder, sob a convicção de que estavam em conluio com o diabo.


"Assim a acusação de bruxaria levou à tirania, ou política, os meios para atacar pessoas às quais não podiam ser convictas de qualquer outro crime, a aspersão em si foi gradualmente tendo mais força com o aumento de terror, como se espalhando cada vez mais e se tornando mais contagiante. "


Em 1398 a Universidade de Paris, estabeleceu as regras para a perseguição judicial das bruxas,
alegando que o crime era mais frequente que nunca. Isto tornou-se auto-realizável, quando a publicidade aumentou de cada vez mais bruxas eram encontradas, excitando a atenção do público e
gerando a descoberta acelerada do número de bruxas.


Por volta desse tempo, cismas, decorrentes de diferentes causas, muito alarmavam a Igreja de
Roma. O espírito universal da investigação vinha agora à tona, embora tendo um sentido diferente em diferentes países. Mas em quase todas eles foi despertada a insatisfação cética dos dogmas da igreja. Não só o ensino, mas a corrupção dos costumes entre o clero, muitos dos quais haviam chegado à riqueza e à vida fácil à custa dos paroquianos pobres. Em quase todas as nações da Europa, não se escondia, na cidades lotadas, ou na solidão selvagem do país, principalmente as seitas que concordaram na sua animosidade para com a supremacia de Roma, e o seu desejo de se libertarem da sua dominação. Os Romanistas tornaram-se extremamente desejosos de combinar a
doutrina dos hereges com a da bruxaria, o que, de acordo com o seu entendimento, abundavam onde
os grupos que protestavam contra Roma eram mais numerosos. E assim lançaram a acusação de feitiçaria sobre aqueles que discordavam do padrão da fé Católica.

 

O Papa Gregório IX funda a Inquisição em 1231 e ordena a investigação do grupo
que eles chamaram de Luciferianos. Devido à oposição deles a Roma, foi decidido que eles deviam ter feito um pacto com o principal inimigo da Igreja, Lúcifer, o Príncipe das Trevas.


O Jesuíta Delrio, no seu livro de Magia, acusou os que protestavam de estarem em conluio com o diabo na sua luta contra a igreja. Inocêncio VIII (1484 to1492) emitiu uma bula, dizendo: “Chegou
aos nossos ouvidos que os números de ambos os sexos não evitam ter relações sexuais com os demónios infernais, e que, pelas suas feitiçarias afligem tanto o homem como animais; que queimam o leito do matrimónio, destroem os partos das mulheres, e o aumento de gado, eles queimam o milho ainda na haste, as uvas na vinha, os frutos nas árvores, o capim e ervas do campo.” Os inquisidores eram em seguida, chamados a “condenar, prender e punir.” etc. Para projetarem o massacre que se seguiria, Inocêncio nomeou dois Dominicanos como Inquisidores. Eles escreveram em conjunto Malleus Maleficarum, O Martelo das Bruxas em 1486. É realmente um manual para encontrar e punir as bruxas. Ele contém uma teologia cheia de feitiçaria que é
insuperável em disparates que são apresentados como análise científica. Durante três séculos, esteve no banco de cada juiz e sobre a mesa de cada magistrado. Logo no início do manual é indicado que
Satanás influencia diretamente os seres humanos, mesmo a ponto de mudar-lhes a sua forma e causar-lhes dano permanente.


De Rosa observa, ninguém podia explicar por que as bruxas, consideradas como os porta-vozes do Diabo, aparentemente tão formidáveis, permitissem ser capturadas, torturadas e queimadas. Não há uma instância sequer de registo de uma bruxa que com sucesso amaldiçoasse um inquisidor ou sobrevivesse ao fogo.

 

Um cronista da época, Enguerrand de Monstrelet, mostrou como as reuniões secretas dos grupos que protestavam contra Roma, se realizavam sobre a sombra da noite nalgum local solitário, foram declaradas Sábados das bruxas e demónios. Naquele ano, ele regista, vários homens e as mulheres de baixa patente, pertencentes aos Waldenses na cidade de Arras, na França, foram presos e encarcerados. Eles eram tão terrivelmente torturados, que concordavam com a sugestão de que
suas reuniões, eram com o Diabo, de quem recebiam instruções e algum dinheiro. Uma refeição com ele era seguida por uma cena de desregramento geral, após a qual todos iam para casa. Mais tortura persuadiu-os a aceitar a sugestão de que os seus superiores também estavam envolvidos com o Diabo, de seguida os seus mestres eram também detidos, presos e torturados até confessar crimes similares. Então os pobres eram mortos e queimados, enquanto que os mais ricos eram permitidos banimento à custa de todos os seus bens.


Em 1488 o campo em torno da cidade Alemã de Constança, foi assolada por um raio e tempestade. Duas mulheres foram feitas para confessar culpadas como a causa da devastação, e foram mortas pelo seu crime. Cerca de 1515 quinhentas “bruxas protestantes” foram executadas em Genebra. Em Lorena o inquisidor Remigius vangloriou-se de matar novecentas pessoas em quinze anos. Em 1524, mil pessoas foram condenadas à morte num ano em Como, Itália, seguido por uma centena cada ano durante vários anos. Esta é a penas um mero vislumbre do que estava acontecendo em toda a Europa. Na França no século seguinte, não viu centenas, mas milhares queimados na guerra da Igreja contra o Diabo. Então, de repente, em 1657, sem aviso ou explicação, foi indicado pela
Inquisição romana que os inquisidores tinham cometido erros durante um longo tempo. Não houve explicação porque os papas tinham afirmado a realidade das bruxas. Durante vários séculos foi aceite pela igreja que o Diabo dominava mais da metade da Cristandade. De repente, todo esse ensino foi abandonado. Depois veio o édito de Louis XIV em 1672, pondo fim a todas os
processos por bruxaria, após o qual nunca mais se ouviu falar desse crime. Seis anos antes, a Academia Francesa de Ciências tinha sido fundada. A ignorância e a superstição começaram a recuar. Fenómenos que tinham sido atribuídos à operação de seres espirituais, eram agora considerados pelos princípios da natureza. A massa de opiniões antigas sobre miríades de criaturas espirituais, praticando a sua maldade sobre a humanidade infeliz, começaram a ser ridicularizadas e rejeitadas pelos homens de bom senso e educação.

 

(continua)

 

Arthur Bull

Tradução: S. Mestre


Notas de Rodapé


1. Peter de Rosa, autor de Vigários de Cristo – o Lado Negro do Papado (publicado em 1988) é um graduado da Universidade Gregoriana, em Roma, e professor, em Londres. Ele deixou o sacerdócio em 1970, depois casou, tem filhos, proclama ainda ser um “católico patriótico”.


2. Sir Walter Scott, foi um escritor escocês, poeta, historiador, e biógrafo, que é frequentemente considerado o inventor tanto e o maior praticante do romance histórico. As suas Cartas em Demonologia e Bruxaria foram publicadas em 1831, perto do fim da sua vida.


3. Citado por Scott do jornal escocês Pennant Scottish Tour, por Thomas Pennant.


4. Citado por Scott de Ensaio sobre a Comunidade Subterrânea , de Sr. Robert Kirke, o ministro de
Aberfoyle.


5. Narrado por Claud Lamb em Glad Tidings(Boas Novas) , número 1180, pág. 14.

 

O DIABO E OS SEUS COMPANHEIROS DE ONDE VÊM? O que é o Diabo, onde está o Diabo, e quem é o Diabo? (PARTE 5)

S. Mestre, 03.08.10

Muitos, infelizmente, enojados com a corrupção e opressão da Igreja, assumiram que a Bíblia foi de algum modo a causa da fundação disso. Isto pode ser visto na reação violenta contra a Igreja na Revolução Francesa. As ondas desta erupção social ainda são sentidas hoje. Grande parte da sociedade moderna são filhos da revolução em suas atitudes, rejeitando a autoridade da Bíblia, e fazendo da humanidade a mais elevada forma de inteligência no Universo. Mas a nova liberdade de pensamento e de culto tem permitido que outras pessoas possam ler e estudar as Escrituras por si mesmas, ao invés de deixar “os especialistas” (o clero) dizerem-lhes em que acreditar. No seu artigo sobre o Diabo Pastor refere-se ao “moderno protestantismo liberal” que “tende a negar a necessidade da crença num diabo pessoal, preferindo entender a Bíblia... as referências a ele como uma personificação do princípio do mal, ou a reconhecer que as ações mútuas de pecadores individuais sobre um outro, constitui um reino de pecado contra o reino de Deus”. “O Protestantismo liberal” agora inclui aqueles que rejeitam o nascimento virginal de Jesus, e milagres em geral, questões que anulam a declaração de Paulo: “Toda a Escritura é inspirada por Deus” - 2 Timóteo 3:16. Mas seria bastante impreciso atribuir a rejeição do Diabo pessoal apenas ao protestantismo liberal moderno. Outros, embora em menor número, têm usado a liberdade atual para ler e estudar diligentemente o que recebem como a palavra inspirada de Deus, e concluem que o Diabo é, na verdade a personificação do pecado humano. Personificação é uma forma de expressão figurativa comum em literatura, como em Thomas Gray “Uma elegiasobre um cemitério de aldeia” onde um objeto impessoal e quatro abstrações são descritas como pessoas, com as seguintes palavras, gravadas numa lápide:


“Aqui repousa a cabeça sobre o colo da terra
Um jovem desconhecido da Fortuna e Fama:
A bela Ciência não franziu a testa ao seu nascimento humilde,
E a Melancolia marcou-o para si mesma.”

Há muito uso de linguagem figurada das Escrituras “Embriagarei as minhas setas de sangue (a minha espada comerá carne)”- Deuteronómio 32:42. Setas não ficam bêbadas, nem bebem sangue. Nem espadas comem as pessoas que são mortas por elas. Literalmente, os soldados de seu exército irão derramar muito sangue do inimigo. Esse tipo de figura é bem conhecida no mais elegante da fala humana e da escrita. É chamado metonímia.


Deus poderia ter dito através de Isaías: “Vocês Israelitas estão colocando a sua confiança no rei do Egito, para vos salvar dos vossos inimigos (Israel deveria em vez disso confiar em Deus). Mas vocês não podem depender do Faraó, ele levará os seus soldados para casa, e deixará que vocês sozinhos enfrentem os vossos inimigos!”.


Isso seria linguagem estritamente literal. Mas, por Suas próprias razões, Deus escolheu dizê-lo assim:

 

“Confias no Egito, esse bordão de cana esmagada, o qual, se alguém nele apoiar-se, lhe entrará pela mão e a traspassará; assim é Faraó, rei do Egito, para com todos os que nele confiam.” (Isaías 36:6)


Este é um outro uso de linguagem figurativa, neste caso, chamado de metáfora, comumente usada nas Escrituras. Deve-se admitir que esta é uma maneira muito mais colorida de dizer a mesma coisa. Acontece que canas eram uma visão comum no Egito. Poderíamos comparar essas duas formas de dizer a mesma coisa, com dois ovos cozidos. O primeiro que nós comemos sem sal, o segundo, colocamos sal (e talvez pimenta preta também) sobre ele antes de comê-lo. Ambos são ovos, e eles têm o mesmo valor alimentar, mas a maioria de nós vai comer o segundo ovo com mais entusiasmo.
Sinédoque é um outro tipo de discurso figurativo:

 

“E todas as terras vinham ao Egito, para comprar de José, porque a fome prevaleceu em todo o mundo.” - Génesis 41:57. Ninguém ao ler isto pensa que todas as pessoas que moravam nos outros países vieram ao Egito. Eles entendem que algumas pessoas vieram de todos os países que faziam fronteira com o Egito, para comprar cereais.


Personificação é outra figura de estilo que não é pouco empregada nas Escrituras. Há um belo exemplo de personificação da sabedoria no livro de provérbios: “A Sabedoria edificou a sua casa, lavrou as suas sete colunas. Carneou os seus animais, misturou o seu vinho e arrumou a sua mesa.

Já deu ordens às suas criadas e, assim, convida desde as alturas da cidade... Deixai os insensatos e vivei; andai pelo caminho do entendimento” (Provérbios 9:1-6).


No mesmo capítulo a loucura é personificada como uma outra mulher: “A loucura é mulher apaixonada, é ignorante e não sabe coisa alguma... Quem é simples, volte-se para aqui. E aos faltos de senso diz:As águas roubadas são doces, e o pão comido às ocultas é agradável.Eles, porém, não sabem que ali estão os mortos, que os seus convidados estão nas profundezas do inferno”(versículos 13-18).

Claramente, a sabedoria e a mulher tola (loucura) são abstrações. Eles não são pessoas, mas cada uma é vista em pessoas, por isso não é difícil compreender a figura de personificação.


Jesus usa figuras em seu discurso que o Pai faz:

“Também lhes disse uma parábola: Ninguém tira um pedaço de veste nova e o põe em veste velha; pois rasgará a nova, e o remendo da nova não se ajustará à velha.E ninguém põe vinho novo em odres velhos, pois o vinho novo romperá os odres; entornar-se-á o vinho, e os odres se estragarão.Pelo contrário, vinho novo deve ser posto em odres novos {e ambos se conservam}.E ninguém, tendo bebido o vinho velho, prefere o novo; porque diz: O velho é excelente.” (Lucas 5:36-39).


Este é um exemplo de alegoria usada nas muitas parábolas dadas por Jesus. Agora está bem claro que Jesus não estava preocupado aqui em remendar roupas ou no engarrafamento e degustação de vinho. Mateus e outros discípulos eram os novos odres, que não tinham sido ainda esticados por uma educação na tradição Judaica, e por isso não tinham um gosto preferencial para a doutrina dos Fariseus. Dito de outra forma, os Fariseus, escutavam Jesus com a mente fechada, enquanto Mateus e os outros ouviam a Jesus com uma mente aberta – imparcial e não afetada por noções preconcebidas – e este é o verdadeiro espírito liberal! Certamente isso se aplica a pessoas de agora tanto como àquelas daquele tempo. Todas as orientações que nós precisamos agora estão registadas nos 66 livros da Bíblia para podermos lê-las. Grande parte da Bíblia está escrito linguagem direta, e pode ser tomada literalmente. Mas há também o uso da linguagem figurativa. Nós precisamos de ser cuidadosos na nossa leitura das Escrituras, e não cometer o erro de tomar figuras de estilo, como "o diabo", literalmente.


Encontramos nas Escrituras o uso da hipérbole, que é uma figura de linguagem que consiste na afirmação exagerada ou extravagante, que serve para expressar um sentimento forte ou produzir uma impressão forte e não deve ser tomada literalmente. Jesus disse, por exemplo, no Sermão do Monte:

“Se o teu olho direito te faz tropeçar, arranca-o e lança-o de ti; pois te convém que se perca um dos teus membros, e não seja todo o teu corpo lançado no inferno. E, se a tua mão direita te faz tropeçar, corta-a e lança-a de ti; pois te convém que se perca um dos teus membros, e não vá todo o teu corpo para o inferno.” (Mateus 5:29 – 30).

Alguns séculos atrás, a igreja não permitia as pessoas comuns terem a Bíblia – para saberem realmente o que Deus quer que nós acreditemos. Eles argumentavam que a terra estaria cheia de pessoas que tinham arrancado um olho, e cortou a mão! Mas o tempo provou que os homens e mulheres comuns são mais perceptivos do que isso. Eles entendem que podemos querer algo que vemos com os nossos olhos, e depois roubá-lo com qw nossas mãos. Este é o pecado, e Paulo diz que “o salário do pecado é a morte”.


Jesus personificou o modo de agir geral das pessoas que não têm interesse genuíno em Deus e no Seu propósito:



“Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; como, todavia, não sois do mundo, pelo contrário, dele vos escolhi, por isso, o mundo vos odeia.” (João 15:19).



Jesus aqui mostra que qualquer pessoa que deseja ser seu discípulo, serão separados do “mundo” (pessoas comuns), porque ele é diferente deles. Ele acredita em coisas diferentes e vive uma vida santa (separada), por outras palavras ele não participar nas suas actividades ímpias.


Os discípulos, por vezes, não entendiam o que Jesus dizia: “Fixai nos vossos ouvidos as seguintes palavras: o Filho do Homem está para ser entregue nas mãos dos homens. Eles, porém, não entendiam isto, e foi-lhes encoberto para que o não compreendessem; e temiam interrogá-lo a este respeito” (Lucas 9:44-45). Os discípulos ainda não tinham aprendido que Jesus deveria morrer na cruz pelos nossos pecados. Eles evidentemente pensavam que Jesus estava usando uma figura de estilo, quando ele estava na realidade falando literalmente.


“Acautelai-vos”, disse-lhes Jesus “Cuidado com o fermento dos Fariseus e dos Saduceus” (Mateus 16:6-7). Eles discutiam entre si e diziam: “É porque não trouxemos pão”. Desta vez, Jesus estava usando uma figura, e eles tomaram-na literalmente. Jesus teve que explicar o que queria dizer(versículo 12): “Então, entenderam que não lhes dissera que se acautelassem do fermento de pães, mas da doutrina dos fariseus e dos saduceus” (imortalidade da alma, ir para o céu, o sofrimento eterno no fogo do inferno, os espíritos maus, e outras coisas que não são ensinadas na palavra de Deus).



Jesus fez as orelhas dos discípulos ficarem vermelhas com a sua resposta. Porque eles deveriam ter sabido que Jesus não estava preocupado com pão literal – tinham-no visto alimentar milhares de pessoas! A sua mensagem foi: “Deus te deu um cérebro, usa-o! - Lembra-te do que já aprendeste! – Pensa!” Nós, como os primeiros discípulos, precisamos de pensar com cuidado (meditar) sobre o que Jesus disse, e o que está escrito nas Escrituras da Verdade. A pior coisa que podemos fazer é fechar a nossa Bíblia, cruzar as nossas mãos, e deixar que algum “perito” nos diga em que acreditar.
Noutra ocasião, Jesus estava a criticar os líderes religiosos pelas suas tradições que fizeram tão importantes como os mandamentos de Deus. Eles disseram que as mãos não lavadas tornam uma pessoa “impura”. "E, tendo convocado a multidão, lhes disse: Ouvi e entendei: não é o que entra pela boca o que contamina o homem, mas o que sai da boca, isto, sim, contamina o homem” (Mateus 15:10-11). Pedro falou em primeiro lugar, como sempre fazia, e disse o que os outros discípulos estavam pensando também. “Então, lhe disse Pedro: Explica-nos a parábola” (Mateus 15:15). Pedro e os outros provavelmente sentiam-se quentes e com picadelas na pele depois de serem vigorosamente limpos por Jesus, com as suas palavras da advertência e instrução. Eles não iriam esquecer tão cedo essa lição!

“Jesus, porém, disse: Também vós não entendeis ainda?

Não compreendeis que tudo o que entra pela boca desce para o ventre e, depois, é lançado em lugar escuso? Mas o que sai da boca vem do coração, e é isso que contamina o homem. Porque do coração procedem maus desígnios, homicídios, adultérios, prostituição, furtos, falsos testemunhos, blasfêmias. São estas as coisas que contaminam o homem; mas o comer sem lavar as mãos não o contamina.”- Mateus (15 :16-20).


Esta afirmação nos diz muito sobre o significado da obra de Jesus. Jesus estava muito preocupado com as coisas que “vêm do coração” dos homens e mulheres. Isto é porque o seu verdadeiro valor é visto pelas suas obras, sejam elas boas ou más. Eles não podem culpar as suas obras más nalgum “espírito maligno” – Jesus mostra que não há tal coisa. Todas as obras do homem têm a sua origem – tudo começa – no coração do homem. É por isso que Jesus ensinou: “Bem-aventurados os puros de coração porque eles verão a Deus” (Mateus 5:08). As suas declarações posteriores aguçam ainda mais esse foco no coração do homem: “Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; e: Quem matar estará sujeito a julgamento.... Eu, porém, vos digo que todo aquele que {sem motivo} se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento” (Mateus 5:21-22).



“Ouvistes que foi dito: Não adulterarás. Eu, porém, vos digo: qualquer que olhar para uma mulher com intenção impura, no coração, já adulterou com ela.” (Mateus 5:27-28).


Precisamos prestar atenção à maneira pela qual Jesus e os apóstolos usaram as figuras de estilo(linguagem,):

“Chegou o momento de ser julgado este mundo, e agora o seu príncipe será expulso. E eu, quando for levantado da terra, atrairei todos a mim mesmo. Isto dizia, significando de que género de morte estava para morrer.” (João 12:31-33).

O "levantando" claramente se refere à sua crucificação. Mas quem é “o príncipe deste mundo” para ser expulso? Será esta uma pessoa literal? Em algumas de suas últimas palavras de conforto aos seus discípulos antes de sua morte, Jesus disse:

“Já não falarei muito convosco, porque aí vem o príncipe do mundo; e ele nada tem em mim; contudo, assim procedo para que o mundo saiba que eu amo o Pai e que faço como o Pai me ordenou.” (João 14:30-31).


Jesus foi o único homem que poderia afirmar verdadeiramente que ele sempre obedeceu a Deus. Literalmente, sabemos que, os líderes religiosos estavam vindo para prender Jesus. Os governantes, juntamente com o rei Herodes, o governador romano, Pilatos, em breve estaria concordando em matá-lo. Enquanto Jesus fez tudo por causa de seu amor a Deus e os crentes, os chefes religiosos foram motivados por seus instintos carnais (Gálatas 5:19-21): Pilatos “sabia que por inveja o tinham entregado” (Mateus 27:18).


Mais tarde, nas suas últimas palavras para os discípulos antes da sua prisão, Jesus prometeu enviar-lhes o “ajudador” ou “consolador” depois de ele ter ido para estar com o Pai: “Quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo... porque o príncipe deste mundo já está julgado” (João 16:8-11).



“Estas coisas vos tenho dito por meio de figuras; vem a hora em que não vos falarei por meio de comparações, mas vos falarei claramente a respeito do Pai” (João 16:25).

Isto mostra claramente que “o príncipe (ou, governante) deste mundo” é uma figura – não é uma pessoa literal. Mas é uma figura do quê?
Paulo usa a mesma figura:


“...Andastes outrora, segundo o curso deste mundo, segundo o príncipe da potestade do ar, do espírito que agora atua nos filhos da desobediência” (Efésios 2:2).


“Entre os quais também todos nós andamos outrora, segundo as inclinações da nossa carne, fazendo a vontade da carne e dos pensamentos; e éramos, por natureza, filhos da ira, como também os demais” (versículo 3).

No versículo 2, ele está dizendo que os Efésios, antes de aceitaram o evangelho, caminharam de acordo com o curso deste mundo. Já vimos anteriormente que Jesus se refere a essas pessoas como “o mundo” que compõem a maioria da população, com pouco ou nenhum interesse nas coisas de Deus. O seu “curso” ou caminhos são o amor de si mesmo, e o esforço para sempre satisfazer os seus próprios desejos, ao invés de amar a Deus e de amar ao próximo.


O pensamento natural e os desejos da carne passam por toda a sociedade, desde o mais humilde servo aos homens que se sentam em lugares altos de governo. Se alguém perguntasse, “qual é o princípio que rege esta era” A resposta das Escrituras é, “o pensamento da carne” (Romanos capítulo 8). Esse é o “espírito” ou “disposição mental” do mundo em que vivemos. “Os filhos da desobediência” é outro nome para “o mundo”. Alguns deles podem ser pessoas agradáveis de se encontrar, mas se eles não têm amor a Deus e à Sua Verdade, então eles estão levando a sua vida em desobediência a Deus.


No versículo 3 de Efésios 2, Paulo diz de si mesmo e dos outros apóstolos, que “nós também” vivemos da mesma forma que os Efésios. Isso mostra que a caminhada “segundo o príncipe das potestades do ar” é uma forma figurativa de dizer o que é dito literalmente no versículo 3.


Eles também tinham vivido anteriormente, nas concupiscências da carne.


Eles também tinham satisfeito os desejos da carne e da mente.


Eles também tinham vivido da mesma forma que era mais natural para eles, uma forma que desagrada a Deus.


“O príncipe deste mundo” e “o príncipe das potestades do ar” são ambos figuras da natureza humana pecaminosa. Eles são chamados de “governante” e "príncipe" porque a rebelião humana a Deus é o modo aceitável de vida em toda a parte. Apenas umas poucas pessoas, espalhadas por todo o mundo, fazem a vontade de Deus a regra que rege as suas vidas.


Qualquer pessoa que tenha tido o tempo e esforço para ler a Bíblia logo descobriu algo que não podia entender. O que deve fazer? Há provavelmente algumas coisas que ele pode fazer para encontrar uma resposta. Mas Paulo nos dá alguns conselhos diretos. Falando sobre o ensinamento dos apóstolos, ele diz –

"Disto também falamos, não em palavras ensinadas pela sabedoria humana, mas ensinadas pelo Espírito, conferindo coisas espirituais com espirituais” (1 Coríntios 2:13).

Por outras palavras, o que eles disseram foi inspirado por Deus. “Conferir” aqui significa comparar, “unir ideias espirituais com palavras espirituais.” Para a linguagem de cada dia, o significado das palavras é explicado num dicionário. Mas de onde é que a definição da palavra vem? As pessoas que escreveram o dicionário procuraram a palavra em livros e em outros escritos para ver como ela foi utilizada. Precisamos de fazer a mesma coisa com a Bíblia – leia a Bíblia toda, leia uma porção cada dia, observando como as palavras “espirituais” são usadas. Comparando uma parte das Escrituras com o outra pode-nos ajudar a encontrar a definição correta, ou "coisas espirituais".


Como vimos, grande parte da linguagem na Bíblia é literal, e é escrita num estilo acessível. Mas alguma dela é figurativa. Muitas vezes, é fácil ver que tipo de linguagem é, mas às vezes é difícil saber a não ser ao compará-la com outras partes da Bíblia. O apóstolo João disse:

“Aquele que pratica o pecado procede do diabo, porque o diabo vive pecando desde o princípio. Para isto se manifestou o Filho de Deus: para destruir as obras do diabo. ” (1 João 3:8).

Quem é “o diabo?” Isso soa como uma pessoa, mas vamos comparar com o que Paulo diz sobre a natureza de Jesus:

Somos informados que Jesus teve ser igual às pessoas que veio para salvar:

“Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo” (Hebreus 2:14).

Isto significa claramente que Jesus teve que ter a nossa natureza para que ele pudesse destruir o que tinha o poder da morte, isto é, o diabo. Esse facto deve nos alertar que há alguma ligação entre a natureza humana e o diabo na Bíblia. Qual é esta ligação? Podemos encontrar a resposta através de outra pergunta: o que tem o poder da morte? a resposta dada pela Bíblia é que o pecado tem o poder da morte, porque era o mandamento de Deus que o pecado deve ser punido com a morte:

“Ora, neste caso, seria necessário que ele tivesse sofrido muitas vezes desde a fundação do mundo; agora, porém, ao se cumprirem os tempos, se manifestou uma vez por todas, para aniquilar, pelo sacrifício de si mesmo, o pecado.” (Hebreus 9:26).


Comparando essas passagens, temos em Hebreus 2:14, “através da morte ... destruir ... diabo”, enquanto em Hebreus 09:26 que temos “aniquilar pelo sacrifício de si mesmo, o pecado”. Paulo ensina, em Romanos 5:12, “Portanto, assim como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram...” – E assim, olhando para o que o Escrituras dizem, pode ser visto que o “pecado” e “o diabo” são termos equivalentes: – O pecado causa a morte e o diabo causa a morte. Hebreus 2:14 diz que o diabo foi destruído pela morte de Jesus, e Hebreus 9:26 diz que o pecado foi aniquilado pela morte de Jesus. A conclusão inevitável é que “o diabo” é a personificação do princípio do pecado que reside em toda a humanidade. A carta aos Romanos é uma explicação detalhada da salvação através de Jesus – a conquista do que tem o poder da morte. Se um espírito pessoal do mal fosse o principal culpado, então ele deveria aparecer abundantemente nesta carta – mas não. Em vez disso, o adversário é a “carne.”

“Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou Deus, na carne, o pecado, a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito. Porque os que se inclinam para a carne cogitam das coisas da carne; mas os que se inclinam para o Espírito, das coisas do Espírito. Porque o pendor da carne dá para a morte, mas o do Espírito, para a vida e paz. Por isso, o pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão na carne não podem agradar a Deus” (Romanos 8:3-8).


O comentário das Escrituras sobre a humanidade, é que a natureza humana é fundamentalmente criminal:

“Ninguém, ao ser tentado, diga: Sou tentado por Deus; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e ele mesmo a ninguém tenta. Ao contrário, cada um é tentado pela sua própria cobiça, quando esta o atrai e seduz. Então, a cobiça, depois de haver concebido, dá à luz o pecado; e o pecado, uma vez consumado, gera a morte.” (Tiago 1:13-15).

Se o homem fosse basicamente bom, então não haveria necessidade de um tentador inteligente externo para levá-lo ao pecado. Mas Deus diz que o homem não tem nenhuma necessidade disso! Ele consegue viver em completa rebelião contra Deus sem nenhuma ajuda externa! Nos dias de Noé, a sociedade humana tornou-se tão corrupta que,

“Viu o SENHOR que a maldade do homem se havia multiplicado na terra e que era continuamente mau todo desígnio do seu coração;” (Génesis 6:5).

O dilúvio nada fez para mudar a natureza básica do homem. Pois nós encontramos a seguinte forte condenação da humanidade no Salmo:

“Do céu olha o SENHOR para os filhos dos homens, para ver se há quem entenda, se há quem busque a Deus. Todos se extraviaram e juntamente se corromperam; não há quem faça o bem, não há nem um sequer” (Salmos 14:2-3).

A Natureza Humana é Fundamentalmente Pecadora.


A humanidade, sem a palavra de Deus para guiá-la, não é moralmente muito melhor do que os animais.


A avaliação de Jeremias sobre como é realmente o intimo da humanidade, é triste mas é verdade:

“Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?” (Jeremias 17:9). O profeta está falando apenas de criminosos? Não – isso é o que está dentro de todos os seres humanos. Aqueles que não têm a palavra poderosa de Deus em suas mentes para neutralizar isso, morrerão em seus pecados.


Tudo isto constitui a base para o que Jesus diz sobre a natureza humana. Esta foi a ocasião perfeita para Jesus alertar os fiéis se existia um espírito maligno que os tentava para que pecassem. Mas ele colocou toda a culpa no próprio coração do homem:

“Porque de dentro, do coração dos homens, é que procedem os maus desígnios, a prostituição, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, as malícias, o dolo, a lascívia, a inveja, a blasfêmia, a soberba, a loucura. Ora, todos estes males vêm de dentro e contaminam o homem.” (Marcos 7:21-23).


Em resumo, então, somos uma raça que tem em si uma tendência para se rebelar contra toda a autoridade, incluindo Deus. Nenhum de nós, honestamente, olhando para o seu próprio coração, pode negar o que Paulo diz: “Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem está em mim; não, porém, o efetuá-lo.” (Romanos 7:18). Este é um dos dois factos básicos pelos quais o plano de salvação de Deus existe.

A nossa necessidade é sermos libertos do pecado que está dentro de nós. Não de um espírito maligno imaginário. O diabo que Jesus morreu para destruir é o pecado.



(continua)

 

Arthur Bull

Tradução: S. Mestre

 

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